ICMBio admite erro em ação que destruiu terreiro na Chapada Diamantina

Caso é investigado pela Polícia Civil

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Publicado em 25 de julho de 2024 às 10:33

Terreiro de Jarê Peji da Pedra Branca ficou destruído no final de semana
Terreiro de Jarê Peji da Pedra Branca ficou destruído no final de semana Crédito: Reprodução

Após lideranças religiosas denunciarem a destruição de um terreiro localizado no Parque Nacional da Chapada Diamantina, o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) admitiu que houve erro na ação realizada no último domingo (21). O instituto, que é vinculado ao Governo Federal, iniciou uma apuração interna para investigar a ação de funcionários no município de Lençóis.

O imbróglio teve início com a operação de fiscalização de agentes do ICMBio, que apuravam denúncias de desmatamento e ocupação irregular na região de Curupati. Ao menos seis imóveis foram destruídos na ação. Um deles foi o Terreiro de Jarê Peji da Pedra Branca. O ICMBio afirma que os fiscais iniciaram a demolição porque não identificaram, do lado externo, sinais de que era um “imóvel com fins religiosos”.

“Assim que os objetos de caráter religioso foram identificados no imóvel, a operação foi imediatamente interrompida. Para análise dos fatos, foi iniciada uma apuração interna. O Instituto Chico Mendes reconhece o erro e lamenta os danos causados pela violação do lugar religioso”, disse em nota.

Lideranças da comunidade de Curupati, onde o terreiro é localizado, discordam do posicionamento do órgão e denunciam intolerância religiosa na ação dos agentes. “Eles não avisaram nada. Chegaram todos de surpresa e começaram a derrubar tudo”, conta Mestre Damaré, responsável pelo terreiro. O líder religioso não estava no local e só soube da destruição horas depois. 

Damaré explica que o terreiro foi construído em uma roça que pertencia ao pai dele. A terra está, segundo ele, sob posse da família há mais de 45 anos, ou seja, antes da criação do Parque Nacional da Chapada Diamantina, em 1985. 

Uilami Dejan, diretor de Promoção da Igualdade Racial de Lençóis, acredita que os agentes do ICMBio sabiam que a casa destruída era um terreiro. “Eles dizem que o terreiro não difere, externamente, das outras casas. Mas é impossível chegar naquele espaço e não saber. Existiam vários assentamentos e outros elementos de religião de matriz africana que indicavam que se tratava de um terreiro”, ressalta.

Além da destruição dos imóveis, o ICMBio afirma que foram apreendidos três caminhões e armas de caça durante a operação. O órgão também pontua que determinou o fechamento de duas serrarias envolvidas com a extração ilegal de madeira e quatro sítios rurais.

O caso é investigado pela Delegacia Territorial de Lençóis, que apura a destruição de casas de, ao menos, seis famílias. “Segundo relato dos denunciantes, nenhum aviso prévio foi enviado pelo órgão federal para a comunidade”, diz a Polícia Civil.

Veja a nota completa do ICMBio sobre a ação em Lençóis 

"Equipe do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) realizou recentemente operação de fiscalização dentro do Parque Nacional da Chapada Diamantina, estado da Bahia. A ação teve o objetivo de apurar denúncias de desmatamentos, ocupações irregulares e construções recentes de casa principalmente na região dos rios Lapão, Mandassaia e São José, próximos à cidade de Lençóis-BA.

Como resultado da operação, foram apreendidos três caminhões e várias armas de caça, assim como o fechamento de duas serrarias envolvidas com a extração ilegal de madeira e quatro sítios rurais.

Durante a fiscalização na região do Curupati, foram identificadas, próximo a casas antigas de moradores, 16 casas em construção ou construídas a partir de 2020. Os imóveis dos moradores antigos foram mantidos, assim como os imóveis recém-construídos que contavam com a presença de ocupantes, sendo que esses receberam apenas a autuação. As construções não ocupadas e sem autorização foram demolidas, conforme prevê a legislação ambiental.

Uma das 16 edificações fiscalizadas foi um terreiro de Jarê. Nesse caso, os fiscais iniciaram a demolição porque não identificaram, do lado externo, sinais de que era um imóvel com fins religiosos, e os materiais usados na sua construção (madeira, telhas etc.) sugeriram se tratar de construção recente. Assim que os objetos de caráter religioso foram identificados no imóvel, a operação foi imediatamente interrompida. Para análise dos fatos, foi iniciada uma apuração interna.

O Instituto Chico Mendes reconhece o erro e lamenta os danos causados pela violação do lugar religioso. Reafirmamos nosso compromisso com a proteção ambiental e respeito por todas as formas de manifestação cultural e religiosa."

*Com a colaboração de Larissa Almeida.