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Larissa Almeida
Luiza Gonçalves
Publicado em 29 de março de 2024 às 08:13
Atribuída ao ‘Nosso Senhor’ e a ‘todos os santos’, vista como a ‘raiz de todo bem, de tanta fé, do canto Candomblé’, Salvador tem todas as suas marcas de maior expressão – diversidade de credos e culturas – eternizadas em versos de canções. Talvez por sina ou pela magia dos encantados, é esta a terra onde nasceu grandes cantores como Gilberto Gil, Gal Costa, Dorival Caymmi e Raul Seixas, e que, por excesso de expoentes musicais, não poderia fugir do destino de ser considerada a cidade da música. Foi levando isso em conta que, para celebrar os 475 anos da capital baiana, o CORREIO, através do Concurso Cultural SOM SALVADOR, selecionou dez participantes para um passeio imersivo à Cidade da Música da Bahia, no Comércio, no último sábado (23).
Por volta das 15h, quem ia chegando no prédio com fachada de azulejos predominante azuis, adentrava o espaço e se sentava diante da grande mesa que costuma acomodar os clientes do Mãe Comida Afetiva, restaurante que é a opção de alimentação no local. Enquanto alguns convidados interagiam com seus acompanhantes, outros aproveitavam para a explorar a livraria que ocupa parte do térreo, conhecer uns aos outros e tirar fotos. Mas, no caso de um dos vencedores do concurso, o professor Fábio Moreira, 40 anos, o foco era unicamente no que estava por vir. “É a primeira vez da gente [na Cidade da Música da Bahia]. Estou ansiosíssimo. É uma oportunidade [nota] dez”, classificou.
Quando o grupo ficou completo, houve um breve momento de orientações com os guias do equipamento cultural e, enfim, o passeio teve início. O primeiro destino foi o primeiro andar, onde todos foram direcionados para a exposição “A Cidade de Salvador e Sua Música” em uma sala imersiva com três telões – um de cada lado do espaço e outro no chão. Lá, eles puderam assistir depoimentos sobre o surgimento do samba na cidade, entender o contexto da época e, claro, ouvir músicas referentes a cada história contada.
Depois, a grande atração foi a sala “A Nova Música da Cidade”, no segundo andar. Também com a proposta de oferecer uma experiência imersiva, o espaço dispõe de uma tela de 80 polegadas que exibe vídeos de grupos musicais periféricos e cantores em ascensão, bem como dispõe de um sistema de iluminação que acompanha o ritmo da música, dando a impressão de que os visitantes estão dentro de um videoclipe.
Tendo a psicologia como profissão e as artes como expressão da sua existência, a psicóloga Leomaria Novaes, outra vencedora do concurso, conta que gostou da possibilidade de conhecer novos artistas de uma maneira tão criativa. “Foi muito bacana porque temos contato com cantores e cantoras novas. Eu não conhecia alguns dos artistas que vi lá, então é massa porque eles são apresentados como se estivessem pertinho, num contato inesperado”, avaliou.
No caminho para o terceiro e último andar, houve uma parada para fotos nas ilustrações gigantes com tema da Tropicália, espalhadas pelas paredes das cabines de música. Embora o entusiasmo para os cliques fosse grande, a promessa de uma aula de instrumentos fez com que rapidamente todos estivessem acomodados nos grandes bancos do Estúdio Rumpilé. A curiosidade saltava dos olhos de quem lá estava e via, ainda sem saber ao certo o nome de cada um, atabaques, agogôs, xequerê e pandeiro.
Após a explicação da função de cada instrumento, os selecionados foram convidados a vendarem os olhos para uma experiência sensorial. Enquanto ouviam os sons da natureza sendo tocados por instrumentos feitos de conchas, sementes e outros elementos naturais, uma surpresa: uma voz conhecida preencheu o espaço cantando os versos de ‘Som’, música de Rachel Reis. E não demorou mais do que três segundos para que se dessem conta de que a autora da canção era quem interpretava a música exclusivamente para eles. Ao identificar a dona da voz, a economista Milena França, 50 anos, se entregou às lagrimas e agarrou a mão do amigo para se sustentar diante da emoção.
“A voz dela me remete a sentimentos muito bons, à família que eu escolhi, a amigos, ao carinho das minhas filhas. Foi muito emocionante poder ouvi-la. Quando eu senti ela chegando, reconheci a voz na primeira nota. Foi uma surpresa, me senti tocada, chorei e é assim sempre. Sempre que estou no show dela, estou chorando”, contou.
Dona da voz que provoca emoções, a cantora Rachel Reis confessou que não esperava que fosse ser reconhecida tão rapidamente e exaltou a experiência vivenciada na Cidade da Música. “Foi lindo. Cheguei lá, cantei, muita gente sabia quem [eu] era, muita gente se emocionou. E é muito especial poder estar perto. [...] Música hoje em dia é meu sustento literal. Tudo que é feito na iniciativa de incentivar a arte e cultura, e vangloriar isso que a gente faz, é muito importante e especial, ainda mais quando é feito com tanto cuidado e cautela, muito bonito e muito bem feito. Fico orgulhosa [desse espaço] e muito feliz”, ressaltou.
Após o momento de êxtase, os convidados pousaram para fotos ao lado da artista, mas ainda havia mais um presente. Um a um, todos receberam um kit do Correio que incluía fones de ouvido, dois copos personalizados e uma agenda. Além disso, eles também foram premiados para assistir, no domingo (24), a edição de ‘Vamos ver o pôr do sol’, da Banda Jammil, na Ponta de Humaitá.
Ao fim da experiência, a assessora jurídica Elizabeth de Araújo, 27 anos, não escondeu a felicidade. “A história de Salvador é algo que me interessa muito e a música da cidade faz parte da história dela em tudo. Quando a gente vem para a Cidade da Música, vê isso de uma forma muito mais clara, porque não tem como separar religiosidade, baianidade e a história de Salvador da sua música”, afirmou.
Ela ainda conta que, dentre todos os espaços que viu, o Estúdio Rumpilé foi o que mais gostou. “Quando eu vi a chamada do Correio para o concurso, eu escrevi dizendo que a Orquestra Sinfônica me marcava muito porque trazia instrumentos clássicos sem perder a baianidade. Gostei muito do estúdio porque aprendi a origem dos instrumentos, essa noção sagrada da música que precisamos respeitar independentemente de religião e, principalmente, a conexão que os instrumentos trazem. Não vou negar que a chave de ouro foi Rachel Reis cantando ‘Maresia’ com a gente. A voz dela é muito calma, leva a gente para outro lugar”, disse.
Na saída do equipamento cultural, a reportagem ainda encontrou o professor Fábio Moreira, do início da matéria, cantando no karaokê com seu acompanhante, Diego Moreira, no terceiro andar. Ele, que antes estava na expectativa para o passeio, agora só pensava em repeti-lo. “Conhecer cada espaço, perceber a cidade de Salvador com base na sua musicalidade foi muito interessante. Escolhemos um bairro para conhecer, na cabine de música, que tinha tudo a ver conosco: o Curuzu. Vimos o Ilê Aiyê, a formação dos blocos afro, e fechei com chave de ouro no karaokê. Foi uma experiência completa. Voltarei e trarei mais pessoas, porque foi uma experiência maravilhosa”, finalizou.
Vamos ver o pôr do sol
A capital baiana é permeada por ritmos que invadem as paisagens da cidade e se propagam em experiências de união, alegria e celebração. Então, viver a experiência do SOM SALVADOR não poderia estar completa sem a imersão musical em um desses eventos tão característicos da identidade soteropolitana.
No domingo (24), os vencedores do concurso e seus convidados puderam acompanhar o backstage e o frontstage do show “Vamos Ver o Pôr do Sol”, na Ponta do Humaitá, comandado pela banda Jammil e Uma Noites e que teve como convidados Filhos de Jorge e Banda Aiyê. O tradicional projeto que acontece nos verões há quase 10 anos, dessa vez integrou o Festival da Cidade, na programação oficial do aniversário de 475 anos de Salvador.
“São várias sensações que eu estou vivendo desde ontem. Alegria, prazer, felicidade e depois da visita ao Museu, quando a gente ficou sabendo que éramos convidados para o show da Jammil, em Humaitá, nossa! Eu falei logo ‘vamos para casa cedo que amanhã eu quero estar 100% para curtir esse show’ ”, contou Fábio Costa.
O professor de 40 anos já era apreciador do projeto, mas revela que essa foi sua primeira vez vendo os artistas de pertinho. Em grupo, ele e os outros participantes conheceram o camarim do evento e puderam conversar com os artistas da Banda Aiyê e Jammil. Quando se encontraram com o vocalista Rafa Barreto, Fábio não perdeu tempo: “Já fui logo abraçando e desejando sucesso. E ele foi super receptivo, falou com todos nós, tirou foto e convocou a gente né, para dar toda a energia no show. Foi muito legal”, comentou.
Quem também se emocionou foi a operadora de atendimento Vânia Santos, 42 anos, que destaca a alegria que sentiu ao encontrar e abraçar no camarim a Deusa do Ébano, Larissa Valéria, para que torceu na Noite da Beleza Negra. “Me senti muito feliz”, declara. Fã do Ilê, Vânia acompanhou na frente do palco a participação do Mais Belo dos Belos, cantando sucessos como Que Bloco É Esse, Depois Que o Ilê Passar e Crença e Fé. “Sentir a percussão, nesse lugar lindo, que remete a natureza e que pra mim me traz memórias especiais, por ter estudado na cidade baixa, é muito especial”, partilhou.
O leitor Nailson Filho, que é cantor e compositor, descreveu o final de semana como inesquecível, por unir a história, a variedade e a experiência da música em Salvador, além de viabilizar o contato próximo com os artistas. Acompanhado de sua esposa Rosane e da filha Maria Luiza, ele afirma: “Iniciativas como essa, que trazem as pessoas para viver um momento bom, em família, com a natureza, pôr do sol e musica boa é o que a gente precisa”.