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A cara de Salvador: veja 5 motivos para visitar o museu Cidade da Música da Bahia

Museu de 2 mil metros quadrados tem raridades que valorizam cultura local e dão orgulho de ser soteropolitano

  • D
  • Daniel Aloisio

Publicado em 29 de março de 2024 às 04:00

Museu Cidade da Música
Museu Cidade da Música Crédito: Betto Jr./Secom

O soteropolitano é um povo bairrista? Se sim, o museu Cidade da Música da Bahia mostra que há motivos para isso. Através de 700 horas de conteúdo sobre o repertório musical de Salvador, o espaço cultural desperta, em quem vive na cidade, orgulho de pertencê-la. Não é somente produto para turismo, mas o equipamento traz na sua alma as raízes musicais que construíram os 475 anos de história da capital. O CORREIO foi até o local e conferiu cinco diferenciais da Cidade da Música da Bahia. Confira a lista no final abaixo.

“O equipamento cultural tem que estar para as pessoas do município. A gente traz uma conexão dos conteúdos que estão ali com os diversos territórios de Salvador. É importante que cada cidadão se reconheça”, explicou Maylla Pita, mestra em Cultura e Sociedade pela Ufba e diretora de Cultura de Salvador. Ela não esconde, no entanto, a importância do turismo no espaço localizado no bairro do Comércio, vizinho ao Mercado Modelo e Elevador Lacerda.

"A cultura possibilita que o turista que está transitando na cidade vivencie experiências únicas que só acontecem aqui. São duas relações: com quem passa e com quem está aqui"

Maylla Pita

diretora de Cultura de Salvador

Funciona assim: o turista pode conhecer o município através do museu enquanto o cidadão se reconhece em Salvador ao visitar a Cidade da Música.

O sentimento de pertencimento já começa no jogo de palavras que compõe a denominação do espaço. A Cidade do São Salvador da Baía de Todos-os-Santos é o nome original de Salvador, concedido em 29 de março de 1549, ano de fundação. Exatos 475 anos depois, São Salvador é aqui resumido em “música” da mesma forma que a Baía de Todos-os-Santos já está consagrada como “Bahia”.

A música retratada, é claro, não são os hinos ou salmos entoados pelo São Salvador, que nada mais é do que um título devocional dado para Jesus Cristo. A Cidade da Música da Bahia apresenta as melodias que construíram a história da primeira capital do Brasil, desde a colonização até os tempos contemporâneos. Além disso, o museu tem espaços de produção de novas linguagens musicais através de estúdio de gravação.

“Teria que ir em um mês para ver todo o conteúdo que tem lá. Tem gente que vai e se emociona. A gente trouxe o povo contando a história da música. É o melhor museu que eu já fiz, pois é um museu que conseguiu fazer um diálogo com o povo, sem elitizar. As pessoas se sentem representadas na história.”, disse Gringo Cardia, curador do museu junto com Antônio Risério. Conheça os cinco diferenciais do equipamento:

1 – Depoimentos exclusivos de músicos baianos sobre os bairros em que viveram. Destaque para Letieres Leite, Riachão, Leo Santana, Majur, Virgínia Rodrigues, Mônica Millet e Chocolate da Bahia.

Dividido em quatro pavimentos, o museu tem mais de 700 horas de conteúdo audiovisual que retratam a história da música baiana. O primeiro andar é dedicado a um passeio pelos bairros da cidade e a história da música produzida em cada um deles. Para isso, 33 regiões da capital baiana foram representadas através de histórias e depoimentos audiovisuais de artistas. Os filmes são rodados em looping, mas existem estações específicas onde o visitante pode escolher o conteúdo sobre um bairro específico.

Obviamente, não é possível dar conta de todo conteúdo numa visita de uma hora. “Mas isso é bom, pois o visitante pode retornar ao equipamento outras vezes para consumir aquele conteúdo. Nas quartas, o acesso é gratuito”, lembra Maylla.

Na midiateca, você escolhe qual artista quer ver
Na midiateca, você escolhe qual artista quer ver Crédito: Daniel Aloisio/CORREIO

Para quem quiser ver um conteúdo específico, pode optar pela midiateca e escolher o vídeo de preferência. “São depoimentos exclusivos. E tudo feito durante a pandemia. Eu mesmo quem editei. Fiquei preso numa casa do Santo Antônio durante a pandemia e fazendo o museu. Foi uma imersão quase monástica e deu muito certo”, relembra Cardia. Ele destacou alguns depoimentos que você não pode deixar de ver:

Artistas: Letieres Leite e Riachão

Por que não posso deixar de ver o seu depoimento? “São músicos baianos muito importantes e que já morreram. Antes de partir, eles deixaram depoimentos exclusivos sobre suas histórias de vida e do bairro em que viveram, o Garcia”.

Onde encontrar o seu depoimento: Na cabine do Garcia.

Artista: Leo Santana

Por que não posso deixar de ver o seu depoimento? “Leo é um cara simples, humilde e grande artista do Brasil. Ele até hoje é ligado ao bairro em que cresceu, Boa Vista do Lobato, e ele traz isso no seu depoimento”.

Onde encontrar o seu depoimento: Na cabine do Subúrbio de Salvador

Artista: Chocolate da Bahia

Por que não posso deixar de ver o seu depoimento? “Ele é um gênio da arte popular. No seu depoimento, além de contar a história do Comércio, Chocolate fala da música, de sua forma de cantar e de sua relação com Jorge Amado. O seu depoimento é uma preciosidade”.

Onde encontrar o seu depoimento: Na cabine do Comércio

Artista: Mônica Millet

Por que não posso deixar de ver o seu depoimento? “Neta de Mãe Menininha, a percussionista Mônica Millet conta histórias dela de quando era criança, do que ouvia da avó, do que sentia. Isso é lindo, pois é a ancestralidade. A Bahia é feminina. Salvador é uma cidade mãe e é a mãe que guarda a ancestralidade”.

Onde encontrar o seu depoimento: Na cabine do Garcia.

Artistas: Majur e Virgínia Rodrigues

Por que não posso deixar de ver o seu depoimento? “As duas artistas têm em comum o fato de terem cantado em igrejas. São depoimentos lindos, pois mostram essa coisa sacra que tem na Bahia, uma mistura do axé com a coisa católica, esse sincretismo que fez essas mulheres virarem duas grandes artistas”.

Onde encontrar o seu depoimento: Majur está na cabine do Pelourinho. Já Virgínia Rodrigues está no Carmo.

2 - Poesias de Gregório de Mattos transformadas em rap por Vandal

Um poeta soteropolitano do Século XVII cujo apelido era Boca do Inferno por causa da sua crítica feroz a igreja católica e aos costumes da época. Gregório de Matos chegou a fazer poemas quase eróticos e, para isso, usava uma linguagem típica da época, mas difícil de compreender atualmente. “Eu pensei que seria difícil recitar. Então, chamei um rapper, o Vandal, Ele faz como rap, mas com escritos do século XVII”, explicou Cardia.

Durante o processo, palavras precisaram ser traduzidas por um historiador, mesmo com os poemas sendo escritos em português. “Eram termos que não existem mais. Marisa Orth Ajudou na interpretação dele. Desse jeito, o Vandal se tornou um grande colaborador do museu”, explicou. É possível conferir o resultado de forma exclusiva na sala Rap Trap - Vandal de Verdade, no museu.

Vandal transformou poesias de Gregório de Mattos em rap
Vandal transformou poesias de Gregório de Mattos em rap Crédito: Daniel Aloisio/CORREIO

3 – “Os monitores da Cidade da Música são uma atração à parte. Eles são o coração daquele museu”

Vale a pena ir para um museu só para ver os funcionários trabalharem? Para Gringo Cardia, na Cidade da Música, a resposta é sim.

"Com certeza, vale muito a pena. Tem uma juventude muito atenta e com consciência crítica lá dentro. Os monitores da Cidade da Música são uma atração à parte. Eles são o coração daquele museu, pois também estão contando a sua história, a história de onde nasceram, através da música. Logo, é a própria Bahia contando a sua história"

Gringo Cardia

Curador da Cidade da Música da Bahia

Para o curador, isso foi algo tão significante que virou uma referência no seu trabalho. “Em nenhum outro museu eu tinha conseguido fazer o que consegui aqui. É algo que estou tentando aplicar em todo o Brasil”. Os monitores da Cidade Música são, segundo Cardia, estudantes da Universidade da Integração Internacional da Lusofonia Afro-Brasileira (Unilab), músicos do Quabales, membros do Projeto Axé, etc.

Os monitores ficam espalhados durante todos os andares do museu. A dica é aproveitar a visita para perguntar, tirar dúvidas, trocar experiências e vivenciar o momento com esses profissionais.

4 - Coletânea de três volumes com a pesquisa que orientou o processo de curadoria museu.

Biblioteca na Cidade da Música da Bahia
Biblioteca na Cidade da Música da Bahia Crédito: Daniel Aloisio/CORREIO

Logo no primeiro pavimento do museu, além da bilheteria, há uma biblioteca e sala de leitura, cujos acessos são gratuitos. É na biblioteca que fica a coletânea de três volumes com a pesquisa que orientou o processo de curadoria museu. O antropólogo Antônio Risério foi também responsável pela pesquisa.

“É interessante acessar a pesquisa que embasou o processo curatorial do equipamento. Não é sobre a cidade da música e sim sobre a história de Salvador”, disse Maylla Pita. Além dessa coletânea, a biblioteca é recheada de centenas de obras sobre a música soteropolitana. “São acervos específicos, um espaço para pesquisadores e curiosos voltados para a música”, descreveu Mayla.

5 – Elementos interativos que dialogam com a população, como karaokê, estúdio de gravação, batalhas de rap e oficina de percussão.

Oficinas de percussão são oferecidas na Cidade da Música da Bahia
Oficinas de percussão são oferecidas na Cidade da Música da Bahia Crédito: Daniel Aloisio/CORREIO

A Cidade da Música da Bahia é o único museu da cidade que possui um estúdio de gravação para utilização pelos artistas locais. “Inclusive, tem edital que vai ser lançado em breve para estimular o uso do espaço por artistas negros”, garantiu Mayla. Enquanto isso, quem quiser usar o estúdio pode solicitar, através de uma proposta de gravação, pelo e-mail [email protected].

Mas o estúdio não é o único local interativo. Tem karaokê, oficina de percussão e batalhas de rap. A programação desses eventos costuma ser divulgada no perfil do Instagram @cidadedamusicadabahia. “Enquanto o jovem espera aquele momento, ele visita o espaço, conhece tanta riqueza e aprende tanto... É por isso que considero um dos museus mais bem sucedidos”, disse Cardia.

Quando ir?

Terça a Domingo, das 10h às 18h (entrada até às 17h). Ingresso: R$ 20 (meia para residentes em Salvador, estudantes e idosos) - gratuidade às quartas-feiras

O projeto especial Som Salvador é uma realização do Jornal Correio, com patrocínio da Unipar, apoio institucional da Prefeitura Municipal de Salvador e apoio da Wilson Sons e Salvador Shopping.