Acesse sua conta

Ainda não é assinante?
Ao continuar, você concorda com a nossa Política de Privacidade
ou
Entre com o Google

Alterar senha

Preencha os campos abaixo, e clique em "Confirma alteração" para confirmar a mudança.

Recuperar senha

Preencha o campo abaixo com seu email.

Já tem uma conta? Entre

Alterar senha

Preencha os campos abaixo, e clique em "Confirma alteração" para confirmar a mudança.

Dados não encontrados!

Você ainda não é nosso assinante!

Mas é facil resolver isso, clique abaixo e veja como fazer parte da comunidade Correio *

ASSINE

Skyline de Salvador: cidade vista do mar tem contornos iluminados

Num bordejo poético, a escritora Kátia Borges observa a aniversariante do dia; veja fotos

  • Foto do(a) author(a) Kátia Borges
  • Kátia Borges

Publicado em 29 de março de 2023 às 11:16

 - Atualizado há 2 anos

. Crédito: .

A aniversariante de hoje é mesmo uma senhora luminosa. Todas as suas luminosidades descortinam-se à distância numa crescente vertiginosa. Seja na aquarela mística de seus casarões seculares ou no óleo sobre tela de seus terreiros e igrejas. Se, em erosões singulares, os séculos esculpiram, na simetria sinuosa de suas curvas, rochas insones, na guarda marítima da primeira das cidades, ao longo do mesmo tempo, os homens também modificaram sua face, construindo pontes entre o passado e o presente. São desse tipo os contrastes que melhor compreendemos ao navegar o seu Mar Interior.

Vistos da Baía de Todos-os-Santos, os contornos suaves de Salvador delineiam seus declives e aclives, efeitos da falha da encosta, que se alternam entre a Cidade Baixa e a Cidade Alta, desnudando diferenças. Em busca dessas fendas, partimos do Porto Barra, numa manhã de março, do marco fundador, estrutura vertical com o símbolo da Coroa Portuguesa, painel de azulejos em cerâmica, réplica do original produzido em Lisboa, e pegamos o pequeno barco de Goró que, já no nome de batismo, Azul, prenuncia o predomínio desta cor entre os diversos tons que compõem a sua paleta. Contraste  de imponência e natureza (Foto: Marina Silva) Enquanto o barquinho de madeira ganha distância, em remadas ritmadas, das areias do Praia do Porto da Barra, Goró nos conta sobre a primeira habitação que avistaremos em nosso trajeto até a Ponta do Humaitá. O que se sabe, como ele diz, “assim, de ouvir falar”, é que aquela pequena habitação, encravada nas rochas e inteiramente pintada de azul, pertencera a um pescador da região, conhecido como Marco Polo, sim, vejam só, um homônimo baiano do lendário navegador e cartógrafo veneziano, primeiro ocidental a ir até a China e inspiração do livro As Cidades Invisíveis de Ítalo Calvino. Casas da costa (Foto: Marina Silva) “Nosso Marco Polo morreu já tem tempo”, diz o nosso remador. Outra coincidência, pois ao mercador veneziano, lá no século XIV, a história também reservou uma data imprecisa de “passamento”: 8 ou 9 de janeiro. E seguimos, muito vivos e lentos, passando pelo elegante Yatch Clube, que tem a briosa Vila Brandão espremida ao lado e, aos fundos, expandindo-se em construções humildes até o Corredor da Vitória. Embaralhando mais ainda os horizontes, oficinas de lanchas de porte precedem a Cantina da Jô, onde reina absoluto o Catadinho de Aratu com Mamão Verde (R$ 80). O famoso"Prédio de Ivete" e a vibrante Vila Brandão (Foto: Marina Silva) Para sempre, Casa Amarela Na sequência das remadas de Goró, antes que seja ligado o motor de arranque, avistamos a deslumbrante Casa Amarela, que em 2021 se tornou parte do píer da Mansão Wildberger, solar em estilo medieval alemão que, demolido em 2007, deu lugar a um prédio de 40 andares. A história dessas duas habitações se confunde com a expansão urbana da cidade. Não chega a ser um espanto hoje que, construída no século XIX, a Casa Amarela se conecte ao polêmico edifício luxuoso que devora a paisagem da Baía de Todos-os-Santos (cerca de R$ 16 milhões, cada unidade).

“Deixando a profundidade de lado”, como canta Belchior, por mais angustiado que se esteja, é quase impossível não se render à beleza da Casa Amarela, que se entrega inteira ao olhar dos navegantes, com a sua arquitetura totalmente integrada à vegetação e ao azul do mar. Uma família de origem cubana, os Solis, habitava o local e, ao vender o imóvel, fez questão de incluir no contrato uma cláusula de preservação que inclui a manutenção da sua cor. Uma licença poética em um negócio imobiliário milionário, concluído em 2016, com a entrega das chaves aos novos donos.

Sem lirismo que dê conta, a Casa Amarela se tornou o píer mais autêntico daquele trecho marítimo. Estamos cruzando agora, em nosso barquinho de madeira, os fundos dos prédios do Corredor da Vitória, onde o acesso exclusivo ao mar, por meio de escadas e teleféricos, com decks estruturados para o lazer dos condôminos, é a senha de luxo. Eles se sucedem, mais de dez construções de concreto que cravam suas garras nas águas, algumas ainda irregulares. “Olha lá o prédio de Ivete”, aponta Goró. Definitivamente, o Morada dos Cardeais virou o Marco Polo baiano dos edifícios.  A efervescência da Gamboa (Foto: Marina Silva) Do planalto à planície Mas que verde é esse que serpenteia nas encostas, entre gigantes de concreto, emprestando alguma leveza ao concreto? Por ora, apenas contemplamos os contrastes, na transição entre as esquadrias elegantes e os tons primários das tintas quase sem mistura das casas que, na vertical, equilibram-se na comunidade do Solar do Unhão. As delícias do Bar da Mônica, e sua escadinha de acesso quase mágica, onde se pode comer um peixe frito, com farofa e salada, por apenas R$ 29,90. Aqui começa a nossa lenta passagem das paisagens do planalto às paisagens da planície de Salvador.

Alcançamos os arcos do Solar do Unhão, enquanto uma garota tatuada desliza em uma prancha de stand paddle. Mais adiante, um mergulhador simpático sobe à superfície e acena para nós, segurando nas mãos uma alga marinha. E tenho a nítida impressão de ter visto um flamingo pousado numa embarcação. A Prainha do MAM, o Parque das Esculturas. Mal se reconhece o antigo pátio do Solar, hoje com bancos de madeira e vasos estilosos. O barquinho singra as águas verde-azuis em paralelo ao quebra-mar artificial do Bahia Marina, com inusitadas folhagens que parecem brotar nas rochas. Prainha do MAM, uma jóia (Foto: Marina Silva) Uma miríade de lanchas de luxo repousa por ali, como se fossem almas sonolentas. O Fraternidade, de Aleixo Belov, veleiro feito em aço e fibra de carbono, descansa da travessia dos mares. E há sonhos de navegar que habitam os iates com placas de venda e a culinária de muitos lugares que se reinventa no Amado e no Soho. Na parte alta da cidade, avistamos mais um baiano Marco Polo, o solar que pertenceu à cantora Maria Bethânia. E há um prédio bege e musgo de arquitetura retrô que captura o nosso olhar à terra firme. Tentamos nos orientar, do mar, em que bairro se localiza. Elevador Lacerda e a Cidade Baixa, muito de nós (Foto: Marina Silva) O piano dos prédios Vistos de longe, os edifícios desenham no horizonte o teclado de um piano que, aos poucos, desaparece, decrescendo em andares, entre ruínas de casas antigas que ainda resistem, esqueletos ocres. Surgem então os Arcos da Conceição, o Palácio da Aclamação, o Elevador Lacerda. E, no rumo ao Forte de São Marcelo, circundamos o posto flutuante da BR. Construída no século XVII, a fortificação militar se ergue nos arrecifes a 300 metros da costa, onde o HUB de tecnologia trafega ideias no porto por onde entram os navios de carga e os navios de cruzeiro que chegam de outros países. Tecon no Porto de Salvador: conexão com o mundo (Foto: Marina Silva) Tudo se conecta dentro do Azul. O trânsito dos saveiros vindos do Recôncavo, os catamarãs que levam a Morro de São Paulo e a Boipeba. A fisionomia urbana que se transforma, enquanto o barquinho avança, com o sonido do motor. As ruas de pedra do Santo Antônio Além do Carmo. O rasgo criado no verde pela contenção feita nos fundos do Forte da Capoeira. O bairro da Liberdade. Os tentáculos dos andaimes e o jogo de dominó dos contêiners. Em lugar de píeres, encostas de risco. A estação de onde parte o Ferry Boat, os restaurante da Feira de Água de Meninos e a Praia do Cantagalo. Vista do mar (Foto: Marina Silva) O Asilo Dom Pedro Segundo, hoje desocupado, ostenta nos muros do fundo o nome das Obras Sociais de Irmã Dulce e há barracos de madeira fincados na areia, com mesas de plástico e cadeiras de bares amarelas e vermelhas. Tudo se mistura e se mescla, o ontem e o hoje. A Igreja dos Mares, com sua cúpula neogótica, o amarelo desbotado do Edifício Colon, com seus dez andares, o Forte do Monte Serrat, a Colina Sagrada, o pequeno templo cristão, rente ao farol do Humaitá. E então retornamos, o mesmo percurso, as águas batidas subindo até os olhos, no barco Azul de Goró até o Porto da Barra, o marco zero da nossa viagem. Ah, Salvador, sua linda. Sua linda! Parabéns! A Ponta de Humaitá, um específico jeito (Foto: Marina Silva)

Este conteúdo especial em homenagem ao Aniversário de Salvador integra o projeto Salvador de Todas as Cores, realizado pelo Jornal Correio, com patrocínio da Suzano, Wilson Sons, apoio institucional da Prefeitura de Salvador e apoio da Universidade Salvador - Unifacs