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Agência Einstein
Publicado em 23 de dezembro de 2024 às 08:34
Quando o assunto é o uso de telas por crianças, não basta limitar o número de horas para reduzir os danos. É preciso levar em conta também outros fatores, como o conteúdo, o propósito e com quem utilizam. Uma revisão de estudos publicada em agosto no periódico Jama Pediatrics mostra que a prioridade deve ser o uso produtivo e compartilhado com os cuidadores e a exposição a temas adequados.
Apesar de não faltarem evidências dos prejuízos desses dispositivos, as recomendações atuais em diversos países têm se baseado em controlar o tempo total de telas, sem levar em conta o contexto do uso nem diferenciar o tipo (por exemplo, se é recreativo ou educativo). De acordo com especialistas, também é preciso considerar os equipamentos usados: dos aparelhos tradicionais, como televisão e computador, aos smartphones e tablets.
Para dimensionar esses impactos, pesquisadores de diferentes instituições da Austrália fizeram uma revisão de cem estudos, totalizando mais de 176 mil crianças com menos de 6 anos em 30 países. Os resultados mostraram que consumir conteúdos passivamente em excesso, em qualquer dispositivo, está associado a prejuízos tanto cognitivos (linguagem, das funções executivas e habilidades acadêmicas, por exemplo) quanto psicossociais, como problemas de comportamento e falta de competência emocional para lidar com diversas situações.
Isso também ocorre se os cuidadores têm o hábito de usar ou oferecer algum dispositivo enquanto se encarregam da criança, por exemplo, nas refeições. Já o fato de assistir a temas inapropriados para a idade – como violência ou conteúdo adulto - afeta o desenvolvimento psicossocial. O simples hábito de manter a televisão ligada no ambiente também perturba, pois funciona como um disruptor de atenção.
“O estudo mostra que o controle do uso de telas deve estar muito além do limite do tempo, pois o impacto no desenvolvimento da criança é multifatorial”, diz a pediatra Karina Rinaldo, do Hospital Israelita Albert Einstein. “Não basta ter aquelas funções tipo ‘controle parental’, pois eles estão expostos a muito conteúdo inapropriado nas redes, inclusive a publicidade. É um mundo aberto.”
Além disso, sabe-se que estímulos sensoriais e motores na primeira infância são essenciais e formam a base para as conexões neurais e seu desenvolvimento. “Os primeiros mil dias são um período crítico”, frisa a médica. “Nessa fase, a tela que a criança precisa ver são os olhos dos pais, ela precisa desse contato olho no olho. É através dessa comunicação sensorial que ela começa a espelhar as expressões faciais.
Segundo a especialista, essa interação afetiva com o ser humano é a base para a construção de todo seu desenvolvimento futuro. “É assim que se adquire habilidades simples, que são pré-requisitos para o aprimoramento de outras funções”, observa.
Isso sem contar a explosão de casos de doenças mentais, como depressão e ansiedade, que estão aparecendo cada vez mais cedo. “O contato precoce com jogos e o uso exagerado das redes sociais leva a um importante agravo na saúde que é a dependência digital, explicada também pelo mecanismo cerebral de recompensa. Os likes nos posts e a busca pela próxima fase do joguinho têm esse efeito e liberam a dopamina [neurotransmissor associado à sensação de prazer].”
Por outro lado, o estudo constatou uma associação positiva entre cognição e o uso compartilhado com os cuidadores. Segundo os autores, essa forma de usar os equipamentos digitais pode promover a interação, estimular o desenvolvimento do vocabulário e gerar oportunidades de aprendizado, dependendo de como for feita. “Como é difícil eliminar as telas completamente, deve-se associar seu uso a um propósito, ou ainda aproveitar o momento para criar uma nova interação com a criança para que se obtenha um benefício, como demonstram os estudos”, diz a médica do Einstein
Menos telas e mais saúde
A Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP) atualizou em agosto a recomendação sobre o uso de telas por crianças e adolescentes, reforçando que antes dos 2 anos não existe uso adequado. O documento da SBP, chamado #MenosTelas #MaisSaúde, traz as seguintes indicações em relação a esses dispositivos: