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Sanfona, triângulo e zabumba: Veja quais são as 20 músicas juninas mais tocadas em 10 anos

Qual a sua canção preferida? Entenda porque as músicas juninas atravessam gerações e mais gerações carregadas de memórias e tradição

  • Foto do(a) author(a) Priscila Natividade
  • Priscila Natividade

Publicado em 16 de junho de 2024 às 11:00

Mais tocadas no São João
Músicas mais tocadas no São João Crédito: Quintino Andrade

Não tinha caneta, muito menos um bloquinho de anotações onde se pudesse rabiscar qualquer que fosse o verso. Porém, levaram só 20 minutos até nascer o refrão. Uma inspiração ‘gonzaguiana’, garante o compositor e forrozeiro, Targino Godim. E foi assim, durante o banho, cantarolando no chuveiro a canção ‘Daquele Jeito’, de Gonzagão, que veio o trecho que vó, vô, mãe, pai, menino, menina - se vacilar até o cachorro - sabe cantar de cor: Por isso eu vou na casa dela, ai, ai/ Falar do meu amor pra ela, vai/ Tá me esperando na janela, ai ai/ Não sei se vou me segurar.

“Estava cantando no chuveiro uma música de Luiz Gonzaga - ‘Quando a Maria olha pra gente/ Olha daquele jeito/ Quando ela ri pra gente/ Ri daquele jeito/ Quando pega em minha mão/ Pega daquele jeito/ Quando encosto na janela/ Tá daquele jeito’ - e aí veio a inspiração. O saudoso Manuca Almeida, meu parceiro, me trouxe umas letras que ele tinha feito de outras canções com Raimundinho do Acordeon. Eu peguei, conclui com a minha música e o meu refrão e assim criamos ‘Esperando na Janela’”, conta.

E ninguém conseguiu segurar o sucesso que a canção alcançou depois que foi gravada por Gilberto Gil e se tornou trilha sonora de Eu, Tu Eles (Brasil, 2000), longa dirigido por Andrucha Waddington e com Regina Casé, Lima Duarte, Stenio Garcia e Luiz Carlos Vasconcelos, no elenco. “A música foi parar no filme, a convite da Regina Casé. Estava tocando num forró e ela pediu várias vezes para repetir a canção e aí me convidou para tocar no filme. Gilberto Gil estava fazendo a trilha sonora e incluiu ‘Esperando na Janela’. A música aconteceu e foi um sucesso. Ganhamos o Grammy Latino na época como melhor canção”.

‘Esperando na Janela’(Targino Gondim / Raimundinho do Acordeon / Manuca Almeida) ocupa atualmente a oitava posição no ranking das 20 músicas mais tocadas em Festas Juninas na última década no Brasil, segundo dados levantados pelo Escritório Central de Arrecadação e Distribuição (Ecad). Na lista, mais canções que já fizeram, com certeza, seu pé arrastar do chão em algum arraiá desses por aí.

“‘Esperando na Janela’ é uma música que atravessou e atravessará gerações. Ela entrou aí como um dos forrós mais tocados de todos os tempos, junto com as canções imortalizadas de Luiz Gonzaga, Dominguinhos, Marinez, Trio Nordestino. E ela se torna inesquecível, justamente, por conta do toque, da melodia, do momento em foi lançada, além de ser meiga, brejeira, inocente e romântica”, comenta.

"‘Esperando na Janela’ é uma música que atravessou e atravessará gerações. Ela entrou aí como um dos forrós mais tocados de todos os tempos, junto com as canções imortalizadas de Luiz Gonzaga, Dominguinhos, Marinez, Trio Nordestino"

Targino Godim

compositor e forrozeiro

No topo da lista, uma música que vai ser reconhecida logo nos seus primeiros acordes, afinal, não há festejo sem esse ‘tan-taran-tan' que se tornou um hino na tradição junina. 'Festa na roça' de Palmeira e Mario Zan está em tudo: em reels de rede social, dancinha no Tik Tok, vinheta de propaganda e embalada na quadrilha também, ainda que seja uma canção instrumental do início da década de 50 e que tem um músico italiano radicado no Brasil como um de seus criadores.

“Uma canção junina traz muitas recordações. Eu, por exemplo, vou lembrar do meu pai caminhoneiro indo buscar lenha para a rua inteira acender a fogueira na noite de São João. O que não pode faltar nessas canções é justamente isso, cantar essa tradição. Por mais que você brinque, faça toda uma narrativa de amor e de todo aquele momento tem que ter alguma coisa que remeta a noite que a gente adora e tanto ama”, diz.

Do pedido a Santo Antônio, passando pela noite sertaneja do São João até o agradecimento a São Pedro chegam ao ranking das mais executadas nos últimos 10 anos, as canções 'Pagode russo' (João Silva / Gonzagão), 'O sanfoneiro só tocava isso' (Haroldo Lobo/ Geraldo Medeiros), 'Asa branca' (Gonzagão / Humberto Teixeira), 'Eu só quero um xodó' (Anastacia/ Dominguinhos). 'Fogo sem fuzil' (Gonzagão/ Jose Marcolino) e 'O xote das meninas' (Zé Dantas / Gonzagão) também marcam presença na lista do Ecad. Logo depois de 'Esperando na Janela', as canções 'São João na roça' (Zé Dantas/ Gonzagão) e 'Frevo mulher' (Zé Ramalho) ocupam a nona e a décima posição, respectivamente.

Consagração

Os festejos de São João ficam abaixo apenas do Carnaval em relação à arrecadação dos direitos autorais de música. No último ano, o Ecad distribuiu R$ 5,5 milhões em direitos autorais no segmento de Festas Juninas no país, contemplando mais de 17.280 compositores, intérpretes, músicos, editores e produtores fonográficos. O volume representa um crescimento de 54% em comparação ao mesmo período de 2022.

Doutor e professor da Escola de Música da Universidade Federal da Bahia (UFBA), Alfredo Moura explica como essas canções surgiram e se tornaram tão importantes na preservação da tradição da cultura junina brasileira e nordestina. “Nas culturas antigas, estas celebrações envolviam rituais ligados ao sol e aqui na terrinha, tais festas foram adotadas pelos portugueses. Como era de se esperar, elas conquistaram novos aspectos, embriagadas das culturas africana e indígena. Ou seja, melodias antigas, folclóricas, europeias, adaptadas para o contexto brasileiro”.

Cada qual fez e faz à sua maneira, mas quem responde pela maior parte das criações entre as mais tocadas é o rei do baião, Luiz Gonzaga. Gonzagão garante a liderança com cinco canções, seguido do empate entre Zé Dantas (seu parceiro de composições), Dominguinhos, Mario Zan e Tato (aquele mesmo do ‘Xote dos Milagres’).

“Num ambiente onde músicas são constantemente tocadas, cantadas e dançadas, as letras criativas e melodias deliciosas, facilitam a memorização, a transmissão oral. Muitas dessas obras foram gravadas e popularizadas por artistas inspirados, garantindo a presença contínua no interior. Cada um tem um jeito. Luiz Gonzaga, assim como Jackson do Pandeiro, ambos tiveram um papel crucial na popularização dos hits juninos, os elevando esteticamente”.

E quem resiste ao baião, ao xote, ao xaxado? “A capacidade de evocar o festivo, o nostálgico, o festeiro. Uma canção junina nasce da inspiração elemental das características de festas populares, como a vida no campo, o clima festivo, as tradições religiosas, e o amor. Compositoras e compositores capturam a essência deste elemento, aprisionam o sagrado e a transforma em lírica e rítmica”.

"A capacidade de evocar o festivo, o nostálgico, o festeiro. Uma canção junina nasce da inspiração elemental das características de festas populares, como a vida no campo, o clima festivo, as tradições religiosas, e o amor"

Alfredo Moura

doutor e professor da Escola de Música da UFBA 

Ainda que não esteja na lista mais recente do Ecad, para Alfredo Moura, ‘Olha Pro Céu’, de José Fernandes e Luiz Gonzaga é uma das canções juninas mais emblemáticas. “Traduz a essência da comemoração, nos envolve, fala de amor, de beleza, canta as noites de São João. Sua profundidade emocional faz com que seja amada por todas as pessoas pela eternidade, mantendo-se viva, coletiva, inclusiva e, sobretudo, feminina”.

Entre os elementos que fazem uma canção junina também está o que o compositor, radialista e professor, Tom Tavares, chama de ‘santíssima trindade dos festejos’: “Os ritmos, os temas regionais e a prosódia são fundamentais na caracterização da música junina. Outro aspecto a ser considerado é a execução dessa música, em que a sanfona, o triângulo e a zabumba se nos apresentam como uma espécie de Santíssima Trindade dos festejos. Essas canções funcionam como uma espécie de elemento aglutinador e, mais que tudo, há que se considerar o caráter ecumênico que elas proporcionam”.

"Outro aspecto a ser considerado é a execução dessa música, em que a sanfona, o triângulo e a zabumba se nos apresentam como uma espécie de Santíssima Trindade dos festejos"

Tom Tavares

compositor, radialista e professor

Uma canção junina será levada anos e anos afora a partir de dois componentes, como complementa Tavares: “a qualidade composicional (aliada ao gosto de cada um) e a importância de algum fato concomitante são fatores decisivos para que isso aconteça. A memória afetiva determina a longevidade. A temática, o falar regional e os ritmos específicos dão a essas canções um caráter diferenciador”.

Memória

Uirá Nogueira é músico, baterista e educador musical. A vivência com as canções juninas ainda criança remete sempre as melhores memórias. “Sou do interior, de Vitória da Conquista. Meu São João era aquele de roça mesmo. É você sentir, fechar o olho, escutar. Automaticamente, se você ouvir agora um Luiz Gonzaga ou um Dominguinhos, essa canção vai te transportar para aquele lugar e todas as emoções que sentia quando estava lá. O cheiro da fogueira, do amendoim, da pamonha, dos bolos, o cheiro da terra”.

A música que permanece é raiz e enfrenta o desafio de manter o legado, permanecer influente e tocante. “A gente se encontra num caminho sem volta e de muitas mudanças. Seja na indústria da música ou nas gerações, a música eletrônica e a inteligência artificial vão abandonando a tradição. Porém, o que torna uma canção inesquecível, sem dúvida, é aquela que te causa alguma coisa, traz essas emoções”.

"Seja na indústria da música ou nas gerações, a música eletrônica e a inteligência artificial vão abandonando a tradição. Porém, o que torna uma canção inesquecível, sem dúvida, é aquela que te causa alguma coisa, traz essas emoções"

Uirá Nogueira 

 músico, baterista e educador musical

Para o forrozeiro, cantor e compositor Del Feliz é justamente essa memória que não pode faltar. “O ‘Hino do São João da Bahia’ eu fiz brincando, cantarolando quando surgiu um estalo e uma frase: ‘o céu se muda para a Bahia na noite de São João’. Pronto. Ali já foi para a música e tudo certo. Uma das coisas que ajudam muito são exatamente nossas memórias afetivas que vão trazendo tudo que é a essência do São João”.

Pode falar da comida, da noite junina de uma forma poética, de um amor vivido, das brincadeiras - são inúmeros os caminhos. Entretanto, seja qual for a história, ela vai impor uma alegria que prevalece. “É da música junina trazer alegria”, ressalta o cantor, que defende que as composições protejam a cultura tradicional sem deixar de dar espaço para o novo:

“Essas músicas contam a sua própria história. Se falava muito antes em candeeiro, sala de reboco. Hoje a gente fala no celular, em rede social e isso também é tema para as músicas juninas. É muito importante que as pessoas entendam - e a gente enquanto artista também - que a cultura não é estática, ela vai se moldando. A existência e resistência deve manter a base, enquanto o novo agrega sem que isso signifique destruí-la”, completa.

AS 20 MÚSICAS MAIS TOCADAS NAS FESTAS JUNINAS DO BRASIL NOS ÚLTIMOS 10 ANOS

1. Festa na roça (1951)  - Palmeira / Mario Zan

2. Pagode russo (1946) - João Silva / Gonzagão

3. O sanfoneiro só tocava isso (1949)  -  Haroldo Lobo / Geraldo Medeiros

4. Asa branca (1947) -  Gonzagão / Humberto Teixeira

5. Eu só quero um xodó (1962) - Anastacia / Dominguinhos

6. Fogo sem fuzil (1965) - Gonzagão / Jose Marcolino

7. O xote das meninas (1953) - Zé Dantas / Gonzagão

8. Esperando na janela (1999) - Targino Gondim / Raimundinho do Acordeon / Manuca Almeida

9. São João na roça (1958) - Zé Dantas / Gonzagão

10. Frevo mulher (1979) - Zé Ramalho

11. Isso aqui tá bom demais (1985) - Dominguinhos / Nando Cordel

12. Xote dos milagres (2000) - Tato

13. Quadrilha brasileira (1967) - Gerson Filho / José Maria de Aguiar Filho

14. Rindo à toa (2000) - Tato

15. Xote da alegria (2001) - Tato

16. Quadrilha (instrumental) - Josias Damasceno de Almeida

17. Pula a fogueira (1936) - João Bastos Filho / Amor

18. Fim de festa (1958) - Zito Borborema

19. Marcando a quadrilha (1949) - Mario Zan

20. Antonio Pedro e João (1939) - Benedito Lacerda / Oswaldo Santiago

O Projeto São João 2024 é uma realização do jornal Correio com apoio do Sicoob.