Receba por email.
Cadastre-se e receba grátis as principais notícias do Correio.
Eduardo Dias
Publicado em 14 de fevereiro de 2020 às 16:08
- Atualizado há 2 anos
A morte do grafiteiro Jaílson Galdino Souza dos Santos, 27 anos, causou revolta nas redes sociais devido ao pronunciamento da Polícia Militar enviado à reportagem do CORREIO, na tarde de quinta-feira (13). Questionados sobre a morte do artista, a assessoria de comunicação da PM se referiu ao rapaz como ‘elemento’ e a mensagem também incomodou a mãe do jovem."Estou tentando superar, pedindo a Deus força para superar tudo isso", disse a mãe dele, a cozinheira Leonice Galdino.O artista foi assassinado com um tiro nas costas enquanto trabalhava com um amigo na Avenida Jorge Amado, próximo à entrada da comunidade do Bate Facho, no bairro do Imbuí, na madrugada desta quinta-feira (13). O amigo dele, identificado como Jerry, foi espancado e socorrido para a Unidade de Pronto Atendimento (UPA) do Marback. O corpo de Jaílson foi velado e sepultado na tarde desta sexta-feira (14), no Cemitério Municipal de Brotas.
Mãe de Scank, como Jaílson era conhecido nas ruas, Leonice não gostou da forma como se referiram ao seu filho. Mas não foi apenas isso que mexeu com ela. A cozinheira conta que, quando chegou ao local do crime, na companhia do filho caçula, perguntou a um dos policiais o estado de saúde do grafiteiro, que estava caído no chão, e a resposta foi "a pior possível".“Quando cheguei no local eles me trataram bem no começo, até que meu outro filho perguntou: “E aí, ele tá vivo, qual a situação?”, e um deles respondeu: “Esse aí já foi”. Ou seja, simplesmente, os policiais trataram a situação como mais um marginal que morreu, discriminando os negros, vendo como ladrões, usuário de drogas”, desabafou Cleonice, que disse estar revoltada com o posicionamento da polícia militar.“Eu fico revoltada com a polícia militar, com o tratamento que eles dão aos jovens negros. Eles não sabem se era uma pessoa de bem, se era marginal ou vagabundo. É muito triste que pessoas que trabalham para a nossa segurança julguem pela cor da pele. Elemento? Isso é forma de tratar alguém? Para eles, pode ser qualquer pessoa, mas esquecem que aquela pessoa tem mãe, tem família e que também é um ser humano”, completou a mãe do rapaz. Leonice durante enterro do filho no Cemitério de Brotas (Foto: Marina Silva/CORREIO) Na noite de quinta-feira (13), amigos e familiares de Scank realizaram um encontro na pista de skate dos Barris para arrecadar dinheiro para pagar o funeral e sepultamento do artista e conseguiram mais de R$ 2,5 mil.
Sem condição emocional de comparecer ao ato, Dona Leonice agradeceu pela homenagem e disse que não sabia que seu filho era tão querido e respeitado. (Foto: Marina Silva/CORREIO) “Eu não estive presente por não estar em condições emocionais. Estou tentando superar, pedindo a Deus força para superar tudo isso. Senti uma emoção muito grande, não tinha noção de como meu filho era popular e querido por tanta gente. Quando eu vi a quantidade de gente lá na pista de skate, mobilizados, querendo ajudar, eu fiquei muito comovida. Pude sentir o quanto ele era mais querido do que o que eu imaginava”, contou a cozinheira.
Ela lembrou ainda de momentos especiais ao lado do grafiteiro, como os aniversários que fez para ele, sempre cheio de convidados.
“Sempre fazíamos reuniões nos aniversários dele e sempre vinha uma galera grande, em média 30 a 40 pessoas. Para mim, aquele era o círculo de amizade dele, de gente que o conhecia. Mas ontem eu tive noção do quanto as pessoas gostavam do meu filho, do trabalho dele, o quanto ele era importante. Inclusive, recebi até ligações de pessoas de Minas Gerais, São Paulo e Rio Grande do Norte, todos falando sobre o trabalho dele. Isso foi muito gratificante. Pena que isso aconteceu em um momento de tristeza, porque se ele estivesse vivo para sentir essa emoção que eu estou sentindo, ele estaria dando pulos de alegria”, destacou.
Leonice garantiu que a manifestação realizada pelos amigos e simpatizantes do trabalho do seu filho confortou o seu coração e fez com que ela se sentisse mais forte para seguir em frente e buscar respostas sobre a autoria e motivação do crime que tirou a vida de seu filho.
“Hoje eu vou enterrar meu filho, mas depois vou começar a providenciar, cobrar soluções. Não vou deixar isso acabar no esquecimento. Vou lutar para que a justiça seja feita a favor do meu filho e que ele não seja mais um jovem negro, indefeso, que foi maltratado, espancado e morto por vagabundos e destratado pela polícia logo depois”, completou.
O CORREIO entrou em contato com a PM, mas não obteve resposta até a publicação desta reportagem.
*Com supervisão do chefe de reportagem Jorge Gauthier