Receba por email.
Cadastre-se e receba grátis as principais notícias do Correio.
Da Redação
Publicado em 24 de janeiro de 2022 às 05:15
- Atualizado há 2 anos
A construção de uma torre de telefonia no bairro Parque Ribeirão, zona residencial do município de Lençóis, tem causado discórdia e uma atmosfera de incertezas. Na última terça-feira (18), o Ministério Público estadual (MP-BA) recomendou que a prefeitura suspendesse o licenciamento concedido à American Tower do Brasil. Dois dias depois, a gestão municipal ouviu os moradores em uma reunião. Eles relatam receio com a saúde, além de prejuízo econômico, caso a obra seja levada adiante no local.
Era 24 de dezembro do ano passado, véspera de Natal, quando os moradores do bairro localizado próximo à trilha do Ribeirão do Meio, que costuma atrair muitos turistas, levaram um susto. Sem nenhum aviso prévio, trabalhadores começaram a construção de uma base para uma torre de telefonia, que seria inicialmente erguida com 50 metros de altura. Quem mora perto relata que a obra chegou a contar com 15 homens e foi feita com rapidez, inclusive em feriados. A torre está sendo construída ao lado de casas e no caminho para a trilha Ribeirão do Meio (Foto: Arquivo Pessoal) Gustavo Barbosa é carioca e há cerca de 40 anos planejava se mudar para Lençóis em companhia da esposa. Em julho de 2021, em plena pandemia, o sonho se tornou realidade. O que eles não imaginavam é que pouco tempo depois estariam lutando contra a construção de uma torre na rua de sua casa. “Obviamente não somos contra a tecnologia e a modernidade, mas achamos que é necessário definir critérios. A nossa principal reivindicação é que o município defina critérios de localização de torres, que não sejam próximas a residências e que não tragam poluição visual”, defende. A moradora Edileide Mauhnoom é dona de uma pousada que fica bem em frente ao terreno onde a obra começou. Ela também faz parte da empreitada que luta para que a obra seja suspensa. A falta de diálogo com a população, medo da radiação e desvalorização dos imóveis ao redor são alguns dos motivos que a fazem questionar a construção. “Essa obra começou do nada, sem nenhuma explicação à comunidade e sem identificação”, relata.
Edileide conta que o mestre de obras chegou a informar que a torre seria de 5G e que outras cinco iriam ser construídas, o que aumentou o burburinho em toda a cidade. O secretário de Meio Ambiente de Lençóis, Raimundo Baracho, explica que a gestão passada da prefeitura foi quem concedeu a licença para a construção da torre naquele local e que não se sabe qual companhia telefônica fará uso dela.
O secretário ainda afirma que a construção foi inspecionada e aprovada pelo Consórcio Chapada Forte e que o município não possui uma legislação específica sobre o tema. “Nós resolvemos parar a obra e ouvir os moradores desse local, mas em nenhum momento agimos ilegalmente”, diz. A previsão é que a obra fique suspensa até que um acordo com a população seja feito. Reunião dos moradores do Parque Ribeirão com o secretário de Meio Ambiente em Lençóis, que decidiu paralisar a obra (Foto: Leonardo França) Apesar do parecer do consórcio, o morador Gustavo Barbosa lembra que a emissão da licença só poderia ser dada após a aprovação do parecer técnico do Conselho Municipal de Meio Ambiente, o que não teria sido feito. Para deixar a situação ainda mais nebulosa, Lençóis firmou, em outubro do ano passado, um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) com o Ministério Público, visando estruturar e regularizar todo o Sistema Municipal de Meio Ambiente.
Na recomendação de suspensão da obra, o promotor de Justiça levou o acordo em consideração, já que havia previsão de suspensão da atividade de licenciamento até que fossem sanadas falhas. Entre as determinações impostas pelo TAC, está a contratação de funcionários especializados, como biólogos e engenheiros ambientais. Parecer técnico do Consórcio Chapada Forte, que exige aprovação do Conselho de Meio Ambiente (Foto: Gustavo Barbosa) “A secretaria de Meio Ambiente está se adequando a esse novo TAC, no sentido de fortalecer a questão ambiental. (...) Ficou acertado que, como a prefeitura não tem condições de contratar todos os profissionais que o MP pede, uma parte deles poderia ser utilizada do Consórcio Chapada Forte”, pondera o secretário Raimundo Baracho.
Riscos à saúde Quais são os reais riscos que a proximidade de uma torre de telefonia celular pode causar? Segundo o engenheiro de telecomunicações Pedro Vieira, toda fonte de radiação é um risco potencial à saúde. Ele explica que as torres de telefonia são emissoras de radiação não ionizante. A luz do sol e o infravermelho também fazem parte deste grupo.
“Temos que ter cuidados ao implantar um sistema de radiofrequência e ao definir regulamentações que irão reger essas instalações. É preciso definir limites para distâncias mínimas, níveis de potência e coisas relacionadas, assim salvaguardamos as pessoas”. Apesar de Lençóis não possuir uma legislação específica, as recomendações são de que as torres sejam construídas a uma distância mínima de 50 metros de hospitais, escolas, asilos e clínicas.
Apesar dos moradores relatarem a proximidade com as casas, o engenheiro diz que, aparentemente, a instalação guarda distância entre os limites do terreno. Pedro Vieira também ressalta que, pela altura, a base da torre parece ser bem planejada. Homens trabalhando na obra de construção da torre de telefonia (Foto: Arquivo Pessoal) Os moradores ouvidos pelo CORREIO que não residem no bairro também são contrários à escolha do lugar. Heraldo Barbosa foi secretário de Lençóis e, na sua gestão, implantou a segunda torre de telefonia da cidade, há cerca de 20 anos. Mas, diferentemente da que está sendo construída no Parque Ribeirão, a antiga torre foi construída no alto de montanhas, onde outras também foram sendo instaladas.
“Sou a favor do investimento, mas não nesse lugar, que é um bairro residencial. Tem que ser feito em um local adequado”, afirma. Quem divide a mesma opinião é Anselmo Macedo, dono de um hotel em Lençóis. Apesar de ser a favor das torres, inclusive por elas serem benéficas ao turismo da região, o empresário questiona se aquele local é o melhor tecnicamente: “Não sei se ali tem o sinal melhor, parece que só vai poluir”.
Anselmo também lembra que em pelo menos um outro povoado da cidade, Tanquinhos, uma torre foi construída em circunstâncias parecidas. A reportagem tentou entrar em contato com a American Tower do Brasil e com a Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel), mas não obteve retorno até a finalização desta reportagem.
*Com orientação da chefe de reportagem Perla Ribeiro.