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Ivan Dias Marques
Publicado em 1 de abril de 2021 às 05:00
- Atualizado há um ano
Coube a um “baiúcho” de 64 anos simbolizar o salto de sustentabilidade verificado em menos de uma década na Salvador que completou, recentemente, 472 anos. Geólogo por formação e nascido no Rio Grande do Sul, Hari Hartmann se mudou para a Bahia há mais de 30 anos, trazendo na bagagem a paixão pelo modelo sustentável de negócios. Desse sentimento, nasceu em 2012 a Polo Salvador, fábrica de camisas polo com pouco mais de 50 funcionários, localizada no bairro do Uruguai.
Pequena, mas emblemática, a empresa foi idealizada com todo o projeto de sustentabilidade pronto, resultado da busca por um conceito especial de gerenciar empreendimentos. “A Polo Salvador é um projeto icônico para o Brasil e um dos únicos mundo afora, ainda mais no caso de uma indústria”, garante Felipe Faria, CEO do Green Building Council (GBC) Brasil, organização sem fins lucrativos que direciona o mercado da construção civil em prol da sustentabilidade.
Tal conceito ganhou corpo em meio às necessidades de investir no cuidado com o planeta e às gerações futuras. No entanto, tornou-se também um forte motor de retorno econômico para quem resolve aplicar recursos e ideias voltadas à redução de impactos ambientais. E Salvador tem todos os elementos naturais para brilhar nesse segmento, especialmente o clima abundante em sol, chuva e ecossistemas variados. Polo Salvador funciona em galpões no bairro do Uruguai (Foto: Estúdio 071/Divulgação) “A gente tem visto algumas iniciativas do setor privado, em termos de investimentos voltados a edificações com melhor performance energética ou na questão da água, no uso reduzido de recursos naturais. Mas o principal destaque tem sido a liderança do poder público”, analisa Faria, ao destacar o pioneirismo de Salvador nas iniciativas governamentais.
A caminhada começou em 2015, com o IPTU Verde, que dá descontos no Imposto sobre Propriedade Predial e Territorial Urbana (IPTU) a partir de ações realizadas pelos proprietários de casas e apartamentos que sejam benéficas do ponto de vista sustentável, como reutilização de água de chuva, uso de energia renovável, entre outras 70 práticas enumeradas em decreto.
Junto com ele, veio a Outorga Verde, dessa vez, para estimular que empresários, técnicos, engenheiros e arquitetos adotassem tecnologias sustentáveis, ainda durante a fase de licenciamento, capazes de reduzir o consumo de recursos naturais e de impactos ao meio ambiente dos empreendimentos. “Tínhamos o IPTU Verde, que era para os moradores e havia a necessidade de que as empreiteiras fossem incluídas nessa rede sustentável também. Para isso, surgiu o Outorga Verde, que dá desconto de até 40% na outorga onerosa”, conta o vereador André Fraga (PV), então secretário de Cidade Sustentável na época do lançamento dos projetos.
Dois anos mais tarde, o projeto foi expandido com o IPTU Amarelo, com descontos para quem utilizar energia solar em casas e empreendimentos residenciais e comerciais.“Salvador é exemplo no quesito do IPTU verde. Foi aprimorando ao longo dos anos e tornando ele mais efetivo. É o primeiro munícipio a fazer isso no Brasil e como lei, valendo”, atesta Faria. Felipe Faria, CEO do Green Building Council (GBC) Brasil (Foto: Divulgação) Zero Energy Foi ao trilhar essa estrada que a fábrica de camisas do “baiúcho” recebeu em 2020, pelo segundo ano seguido, o certifica Zero Energy, concedido pelo GBC. “A gente está olhando somente energia, mas é um olhar muito muito rígido. A gente está falando de um prédio autossuficiente em energia. Ele gera toda a energia que ele consome no período de um ano”, explica o CEO do GBC Brasil. Apenas 52 certificados como esse foram emitidos no país.
“Temos uma empresa verde. Todo o equipamento e as instalações são sustentáveis, compramos a matéria-prima sustentável, trabalhamos em um ambiente sustentável, ambientalmente correto”, elenca Hartmann, que elege três pilares do negócio: ambiental, social e econômico. Na questão ambiental, a fábrica acabou com uma conta de energia de R$ 3 a 4 mil mensais ao investir R$ 150 mil em painéis solares fotovoltáicos. Paga só os R$ 70 de taxa mínima.
Antes, porém, trabalhou a eficiência energética trocando mais de 150 lâmpadas convencionais por lâmpadas de LED e colocando sensores de presença, por exemplo. Assim, diminuiu a necessidade das placas: de 140 para 118. No empreendimento de 400m², há uma parede verde, abastecida pela água captada da chuva, usada também em chuveiros e banheiros da fábrica. O que resultou numa economia enorme: a conta de R$ 1.500 mensais caiu para cerca de R$ 350.
O adubo da parede verde é originário da compostagem do lixo orgânico da Polo Salvador. Outra parte vai para uma empresa que faz a coleta deste tipo de resíduo. O seco vai para uma cooperativa. E o que sobra da produção de tecidos é totalmente doado para uma creche no bairro de São Cristóvão. Parede verde da Polo Salvador (Foto: Reprodução/Facebook) “De 70% a 80% da creche é mantida pela renda desse retalho. Eles fazem estopa. Também temos logística reversa. Uma pessoa que traz uma camisa velha ou usada, ela recebe desconto na compra de outra. A gente retalha ela e encaminha para a creche”, explica Hartmann.
E não para por aí. A matéria-prima é um fio de algodão orgânico comprado de uma cooperativa no Paraná. A tinturaria, em Santa Catarina, foi escolhida a dedo e é sustentável também. São cerca de 10 certificações nos últimos seis anos, incluindo a primeira camisa carbono zero do Brasil, homologada pela Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT). Hari nasceu no Rio Grande do Sul e está na Bahia há mais de 30 anos (Foto: Estúdio 071/Divulgação) No aspecto social, a Polo Salvador construiu um bicicletário com placas solares e sorteia bicicletas com frequência para seus funcionários, com o objetivo de incentivar a prática. “Seu negócio vai bem se seu pessoal estiver motivado. No nosso negócio, a motivação do trabalhador é extremamente importante. Nossa produção média está 20% acima da média nacional. Por que isso? Temos maquinário, cadeia econômica do trabalhador, ambiente bem ventilado, boa remuneração. Aqui ninguém ganha salário mínimo. Trabalhou mais, ganhou mais. O jogo é aberto. Só posso remunerar assim se o pessoal souber como está empresa”, revela Hartmann.
Nessa pandemia, nenhum funcionário foi demitido. Todos concordaram em diminuir comissões, quando a empresa perdeu 20% do faturamento. Nos meses seguintes, recuperou-se e fechou o último trimestre de 2020 com os melhores resultados na história, garante o empresário. Nas suas redes sociais, a Polo Salvador publica conteúdos sobre sustentabilidade e possui até e-book disponibilizado gratuitamente para ajudar empresas a se tornarem, assim como ela, símbolos sustentáveis.
O Aniversário de Salvador é uma realização do jornal Correio com o patrocínio da Wilson Sons, Jotagê e CF Refrigeração e o apoio da Sotero, Salvador Shopping, Salvador Norte Shopping, JVF e AJL.