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Por um fio: Associação Vó Flor pede ajuda para não fechar as portas

Creche acolhe centenas de crianças desde 1978 e chegou a ser ponto de apoio para a cantora Majur

  • D
  • Da Redação

Publicado em 26 de julho de 2022 às 06:00

. Crédito: Marina Silva/CORREIO

Ao chegar na Rua Marquês de Santo Amaro, na Ribeira, a casa azul já chama atenção. De dentro dela, saem risadas, conversas e movimentação típicas de crianças reunidas. É lá que há 22 anos Florenice Santos Gomes, a Vó Flor, chegou e instalou pela última vez a associação que leva o seu nome. Fundada em 1978, a Associação Vó Flor passou os anos iniciais em Água de Meninos e um período em frente à Igreja do Bonfim. Mas agora, com dívidas que chegam a R$ 45 mil, corre o risco de ser desapropriada.

As dificuldades enfrentadas pela creche beneficente são muitas. As faltas começam a ser percebidas na fachada, com pintura descascada e tijolos aparentes. No quintal, que já reuniu 120 crianças, as 30 que ficaram sentem o espaço vazio. Na despensa, os alimentos sequer preenchem todas as prateleiras. Na geladeira, uma enorme quantidade de pimentões ocupa o espaço, que só abriga mais uma caixa de leite. Uma ausência, entretanto, se impõe acima de todas as outras: Florenice, Vó Flor, ou bisa, como chamam os menores, morreu em junho deste ano, com 92 anos, por complicações de um AVC. 

No último dia 28 de maio, Florenice, já debilitada, pressionou o neto Prisco a contar qual era o cenário enfrentado pela associação. Desde dezembro de 2021, a família parou de pagar o aluguel de R$ 4,5 mil mensais, por conta de dificuldades impostas pela pandemia, além da doença da avó, que tentavam poupar de mais um sofrimento. Mas, ela percebia. Foi assim que perguntou: “Qual é a real situação que está acontecendo?”. Prisco respondeu e, no mesmo dia, ela teve o AVC. 

Até o início da pandemia, 60 crianças de Salvador eram atendidas na creche, onde passam o dia, são alimentadas e recebem cesta básica para as famílias da região da Ribeira. Mas, com a escassez, só 30 puderam continuar sendo atendidas. “Vim desde pequenininha e aqui faz parte da minha vida. Tenho amigos, gente que cuida de mim e já morei aqui, por isso tenho muito orgulho. E, para mim, Florenice nunca vai morrer. Agradeço muito a ela por dar carinho e amor pra gente”, diz uma das meninas, de 10 anos. Todas as crianças queriam comentar sobre a importância de Vó Flor e da associação em suas vidas.  Crianças podem ficar desassistidas (Foto: Marina Silva/CORREIO) Além dos pequenos, mães, parceiros e outros beneficiados pela associação se reúnem na casa azul em uma campanha para mantê-la funcionando. Luziane Santos, líder do coletivo de mulheres As Pretas Falam, faz questão de apoiar a associação de Vó Flor, que a acolheu há 20 anos, quando o pai dos filhos foi embora e ela bateu na porta da creche para pedir ajuda com crianças de 3 e 4 anos. Uma dessas é a hoje cantora e compositora Majur, nova cara do MPB e R&B no país. “Eu e várias outras mulheres fomos beneficiadas aqui. Minha filha caçula hoje tem 24 anos, é uma mulher trans, que é a cantora Majur, e tem condições de me dar um conforto. E isso tudo partiu daqui. Ela passou por aqui várias vezes. Sempre gostou de cantar, já cantou aqui [...] tudo por Vó Flor, e ela sempre acreditou na gente”, conta Luziane. “A importância dessa mulher é muito grande”.  Crianças recebem cuidados no local (Foto: Marina Silva/CORREIO) Rita de Cássia, 63, hoje é voluntária na casa azul, mas antes também foi acolhida pela Vó Flor. Vendedora de queijo na praia, ela conta que há 23 anos, com filhos de 4 e 5 anos, recebeu a ajuda da associação e ganhou uma segunda mãe. “Eu vinha todos os dias como adolescente, vinha durante o dia e voltava para casa para dormir. Aqui é um lugar que os meninos almoçam, têm reforço escolar, merenda, uma tia muito boa que é Mari, e [se fechasse] isso iria afetar eles, ainda mais que eles estão aqui há muito tempo”. 

As trinta crianças são cuidadas por oito voluntários. Além delas, 60 famílias de Salvador e do interior recebem cestas básicas. Os moradores da rua Marquês de Santo Amaro e pessoas em situação de rua também são acolhidos. Assim como aqueles que nem sequer têm filhos, mas precisam de almoço e estadia. 

“Vou fechar as portas? Não. Preciso que me ajudem para eu poder ajudar as crianças. Tenho dois cadeirantes, um deles mandou até vídeo aqui, ele diz que recebe R$ 1,2 mil, compra remédio, não tem dinheiro para comprar fralda. O que a gente tem que fazer? Nossa parte. Não sabemos se vamos conseguir, mas estamos pedindo socorro”, conta Soraya Fonseca, filha de Vó Flor. 

O problema principal, no momento, é pagar os R$ 45 mil. Os proprietários querem vender a casa para a associação, mas o valor é de R$ 600 mil, que eles não têm como pagar. Em conversa no último sábado, foi estabelecido que a família poderia tentar quitar a dívida até dezembro. Depois disso, se não conseguirem, vão precisar sair.  

As doações podem ser entregues no local, na casa azul que fica localizada na Rua Marquês de Santo Amaro, no Largo da Madragoa, Ribeira (40420-510) e também podem ser feitas pelo Pix no celular (71) 98672-7579, em nome de Prisco Lucas Santos Gomes.

Uma outra entidade beneficente, chamada Olhar de Esperança, fez uma Vakinha virtual para arrecadar R$ 12 mil e entregar à creche de Vó Flor. Até o momento, arrecadaram quase R$ 5 mil. As doações podem ser feitas neste link. A Associação Vó Flor também pede ajuda no Instagram (@voflor.011).

*Com orientação da chefe de reportagem Perla Ribeiro