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Família não consegue entender o crime; polícia investiga acerto de contas
Wendel de Novais
Publicado em 25 de outubro de 2022 às 05:15
As famílias de Elber Santos da Conceição, 21 anos, e seu amigo, identificado apenas como Gabriel, ainda tentam assimilar a morte dos dois. Eles foram executados a tiros por sete homens na madrugada do último domingo (23), por volta das 4h20, no bar Club in Fuego, no bairro do Rio Vermelho, em Salvador.
Nesta segunda-feira (24), no Cemitério do Campo Santo, na Federação, o corpo de Elber foi velado e sepultado. Valnei dos Santos, 40, tio da vítima, falou sobre a dor da família e a partida inesperada do sobrinho, além de dizer que todos estão em choque com o crime.
"Ninguém esperava ver uma perversidade dessa com ele. Está todo mundo sem conseguir comer aqui, sem acreditar. Muitos passando mal, chorando e numa situação difícil porque ele era querido. Não só pela família, mas pelo bairro", fala ele, ainda abalado com a morte doo sobrinho.
Tanto Elber como Gabriel eram do bairro da Federação. Ainda de acordo com Valnei, além de se tratar de uma pessoa tranquila, o seu sobrinho nunca teve qualquer envolvimento com o crime.
"Ele tinha muita amizade boa, não andava com ninguém errado. Meu sobrinho trabalhava em mercado na Federação. Era do trabalho para a casa. Nunca se envolveu com nada e, por isso, ninguém esperava", diz Valnei.
Uma fonte da Polícia Cívil, que preferiu não se identificar e nem gravar entrevista, confirmou a fala de Valnei. De acordo com a pessoa ouvida, as investigações iniciais encontraram uma ficha limpa das duas vítimas, que não têm ligação com o crime organizado ou com o tráfico.
Motivação e autores
O Departamento de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP) e a 7° Delegacia Territorial (DT) do Rio Vermelho investigam, em parceria, o crime. De acordo com informações, a motivação ainda é desconhecida, dado ao não envolvimento das vítimas com práticas ilícitas.
A principal suspeita dos investigadores, porém, é que um deles ou até os dois seriam alvos de um acerto de contas. Apesar do motivo ser desconhecido, só um conflito grave justificaria uma ação articulada com sete homens bem armados, segundo fontes.
Mesmo com as investigações no início e sem definir ainda uma motivação para o crime, a polícia já tem suspeitos principais. Em resumo, os investigadores trabalham com a hipótese de que um grupo criminoso do Nordeste de Amaralina teria sido responsável por organizar e executar o crime.
A polícia tem ainda informações de que os suspeitos só ficaram sabendo da presença das vítimas no bar por conta de publicações nas redes sociais de Gabriel e Elber. Há também a suspeita de que havia um informante que teria gravado cenas dos dois e deu a dica da hora do ataque, quando as vítimas esperavam um carro por aplicativo na frente do bar.
Medo no Rio Vermelho
O caso assustou não só quem estava no bar quando tudo aconteceu, mas quem mora na região também. A reportagem foi ao local, encontrou o Club in Fuego fechado, mas conversou com quem passava por lá. Uma moradora, que prefere não se identificar ouviu tudo e ficou aterrorizada com a ação.
"Eu ouvi quando aconteceu, foram muitos tiros que assustaram a gente. Me fez pular da cama. Isso não é comum aqui. Já fiquei sabendo de roubos, mas tiro dessa forma é a primeira vez que tenho notícia, ainda mais pelo movimento que é intenso", relata.
Gabriela dos Santos, 27, estudante, mora na região do Rio Vermelho. Mais que isso: vai em muitos dos bares espalhados pela orla do bairro. Assustada com a situação, pretende dar um tempo das mesas de bar.
"Eu moro aqui no Rio Vermelho, mas não fica perto o suficiente para ouvir o que aconteceu. Porém, tenho o costume de frequentar os bares, inclusive este onde rolou. Agora, fiquei preocupada e não quero arriscar", confessa.
Outro morador, que preferiu manter preservada a sua identidade, diz o mesmo. Além de ir aos bares na área, fica na orla da região com amigos até a madrugada durante os fins de semana. Porém, não sabe se é seguro ainda.
"Venho não só nos bares, como as vezes passo um tempo aqui na bancada em frente ao mar. Não estava aqui no dia, mas me preocupei quando fiquei sabendo. A gente não tem sossego nem para tomar uma cerveja sem correr risco de estar no meio de um tiroteio", lamenta.
A Associação Brasileira de Bares e Restaurantes da Bahia (Abrasel-BA) foi procurada para comentar o caso e o impacto disso na segurança e, consequentemente, no movimento dos estabelecimento no bairro. No entanto, preferiu não emitir uma nota sobre o assunto.
De acordo com a polícia, o último homicídio que aconteceu no Rio Vermelho tinha dois anos. Foi uma briga no Réveillon de 2020 para 2021, quando dois homens discutiram e um acabou esfaqueando o outro, levando-o a óbito no mesmo momento. No entanto, moradores se preocupam com a possibilidade de ondas de violência, como houve no bairro da Pituba.
Mesmo no Rio Vermelho, ao longo do 2022, situações preocupantes foram registradas. Há duas semanas, um traficante entrou em uma troca de tiros com agentes da Polícia Militar da Bahia (PM) na Praia da Paciência. Na ocasião, ninguém se feriu e o suspeito acabou capturado.
Em julho, um homem foi preso depois de realizar assalto no Rio Vermelho, ameaçando a vítima com um facão encontrado em sua posse. Um mês antes, um homem arrancou um portão de uma farmácia na Rua Fonte do Boi, também no Rio Vermelho, rendeu funcionários e roubou o caixa do estabelecimento. Na ocasião, as vítimas relataram que o suspeito se mostrou bem exaltado e aparentava estar sob efeito de drogas.
Já em maio, um homem foi baleado durante a manhã no Largo de Santana, próximo ao Acarajé de Dinha. O crime teria ocorrido após uma discussão entre a vítima e uma pessoa que estava com ele na mesa. Questionada se pretende tomar medidas específicas para combater a criminalidade no Rio Vermelho, a Secretaria de Segurança Pública da Bahia não respondeu à reportagem até o fechamento desta matéria. No local da execução, na segunda-feira (24), uma unidade móvel da PM foi colocada para reforçar o policiamento. Além disso, agentes foram vistos fazendo ronda a pé.