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Bruno Wendel
Publicado em 18 de abril de 2015 às 08:08
- Atualizado há 2 anos
Geovane (Foto: Arquivo CORREIO)Geovane Mascarenhas de Santana, 22 anos, foi morto dentro das dependências da sede da Rondesp (Rondas Especiais), unidade da Polícia Militar, no bairro do Lobato. É o que consta na denúncia oferecida do Ministério Público Estadual (MPE) à 1ª Vara do Tribunal Júri, a que o CORREIO teve acesso.>
Segundo a denúncia, Geovane foi morto por decapitação, de joelhos, depois de ser colocado no fundo de uma viatura da Rondesp e conduzido ao local sem que “estivesse na prática de qualquer delito que justificasse sua prisão”.>
Ao todo, 11 policiais foram denunciados pela promotora de Justiça Isabel Adelaide Moura no último dia 11, com base em inquérito policial, instaurado pelo Departamento de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP). >
O crime, cometido no dia 2 de agosto, foi apurado depois de o CORREIO denunciar o desaparecimento do rapaz, no dia 13 daquele mês. O jornal revelou, com exclusividade, imagens da abordagem policial em que Geovane é colocado dentro de uma viatura da Rondesp. A denúncia aponta como responsáveis pela morte 11 policiais da Rondesp Baía de Todos-os-Santos: o subtenente Cláudio Bonfim Borges; os sargentos Gilson Santos Dias e Daniel Pereira de Souza Santos; e os soldados Jesimiel da Silva Rezende, Jailson Gomes Oliveira, Cláudio César Souza Nobre, Fábio Nobre Lima Masavit Cardozo, Jocenilton Santos Ferreira, Roberto Santos de Oliveira, Alan Moraes Galiza dos Santos e Alex Santos Caetano.>
Os 11 foram denunciados por sequestro, roubo (a moto e o celular de Geovane não foram localizados) e homicídio qualificado (por motivo torpe e sem possibilidade de defesa da vítima). Seis deles (Cláudio, Jesimiel, Roberto, Alan, Daniel e Alex) foram denunciados também por ocultação de cadáver. Apesar disso, a promotora Isabel Adelaide não pediu a prisão de nenhum dos policiais, e excluiu da denúncia, os crimes de tortura e formação de quadrilha, que constavam no inquérito policial que investigou o caso. >
“No momento não existe motivos para pedir a prisão deles. Primeiro, porque o fato se deu em agosto, então não posso dizer que existe um clamor popular. São pessoas que têm profissão definida e endereço certo e, até então, não existe nenhum motivo que justifique ultrapassar o direito que eles têm de responder ao processo em liberdade”, declarou a promotora, ontem, durante coletiva no Ministério Público Estadual, no CAB.>
Presente também na coletiva, o comandante-geral da Polícia Militar, coronel Anselmo Brandão, disse que todos os policiais foram afastados do serviço ostensivo para atuar em atividades administrativas, além de responderem a processo disciplinar.>
A ação agora será julgada pelo 1º Juízo da 1ª Vara do Tribunal do Júri. >
O crime Segundo a denúncia, no dia 2 de agosto de 2014, às 16h58, Geovane pilotava sua moto CG 125 (JRB 9929), quando foi parado por uma guarnição da Rondesp BTS, na Rua Nilo Peçanha, na Calçada e abordado “de forma excessivamente agressiva” — as imagens mostram que Geovane é agredido pelos policiais. >
A guarnição era integrada pelo subtenente Claudio Bonfim Borges, e os soldados Jesimiel e Jailson (os três já ficaram dois meses em prisão temporária pelo crime, entre 15 de agosto e 12 de outubro). Geovane foi levado pela viatura de número 2.2211, juntamente com a moto, para a Rua Luiz Maria, nas imediações do Atacadão Recôncavo, quando foi apresentado a uma mulher que alegou ter sido vítima de roubo. Ela, porém, não reconheceu Geovane. >
Às 17h21, chegou ao local a segunda viatura, de número 2.2203, com o sargento Gilson e os soldados Claudio, Fabio e Jocenilton. As viaturas permaneceram juntas até às 17h25 e depois seguiram para a sede da Rondesp, no Lobato.>
Geovane foi, então, executado dentro das dependências da Rondesp. Às 21h, Cláudio e Jesimiel, que no dia se encontravam de serviço extra na Operação Visão Noturna deixam a sede da unidade, junto com o sargento Daniel e os soldados Roberto, Alan e Alex. O grupo sai dividido em duas viaturas, 2.2204 e R-10, até a Travessa São Rafael, Rua das Casinhas, próximo ao Parque São Bartolomeu, onde abandonaram o corpo mutilado, para em seguida atearem fogo, “na tentativa de ocultar o cadáver”.>
A denúncia acrescenta que “o corpo da vítima foi localizado no dia seguinte, numa casa abandonada, e a motocicleta deste, juntamente com o aparelho celular que carregava, foram subtraídos pelos acusados”. >
[[saiba_mais]]Decapitação Como o CORREIO revelou em 19 de setembro do ano passado, os laudos apontaram que Geovane foi morto por decapitação. >
No entendimento do MP, os acusados impossibilitaram qualquer ação defensiva da vítima , “sendo ela surpreendida, sem nenhuma justificativa legal, presa, e mantida sob a guarda dos denunciados quando então foi subjugada, e morta, com a ressalva de que, de acordo com a perícia, foi ela decapitada”.>
Ainda segundo o MPE, Geovane teve decepadas as mãos e a genitália, e, como também já havia sido revelado, os denunciados extraíram do corpo partes das tatuagens com o objetivo de dificultar a identificação. A abordagem da PM a Geovane (Foto: Reprodução)GPS A investigação mostrou que os policiais desligaram o GPS da viatura 2.2211 e cortaram a fiação da câmera instalada no carro, o que demonstrou que os acusados “já com o objetivo de agir ilicitamente, tentaram inviabilizar eventual controle de suas ações”. Por fim, eles ainda elaboraram um relatório de serviço descrevendo que naquele dia haviam feito rotas e rondas em locais “absolutamente diversos” do real.>
O que os policiais provavelmente não sabiam — e que permitiu à polícia apurar as reais localizações — é que o GPS, mesmo desligado, emitiu sinais a uma central em outro estado e que o radiocomunicador portátil (HT) usado por Jesimiel também registrava a localização. Além disso, as localizações das viaturas 2.2204 e R-10 foram emitidas pelos seus rádios fixos. >
Conhecidos A denúncia não deixa clara a motivação do crime. Fala apenas em motivação “torpe, considerando que agiram os acusados em comunhão de ação e desígnios, em uso de autoridade conferida pelo Estado, para sequestrar e matar quem por eles eleito deveria morrer”.>
O documento revela ainda que o soldado Jesimiel conhecia Geovane e que o identificou na abordagem inicial, na Rua Nilo Peçanha — já que ele estava sem capacete — e que a ex-companheira de Geovane é prima “carnal” da esposa de Jesimiel havendo relatos de que havia uma antipatia do policial com a ex de Geovane. Comandante da PM e secretário Maurício Barbosa durante coletiva sobre caso Geovane (Foto: Almiro Lopes)Cronologia do Crime1 - às 16h58 do dia 2 de agosto de 2014, Geovane, que pilotava a moto CG 125 Fan, de placa JRB 9929, na Rua Nilo Peçanha, na Calçada, é abordado por guarnição da Rondesp/BTS integrada pelo subtenente Claudio e os soldados Jesimiel e Jailson (veja abaixo os denunciados).2 - EM SEGUIDA, “sem que estivesse na prática de qualquer delito que justificasse sua prisão”, segundo a própria denúncia, Geovane é conduzido na viatura Nº 2.2211 para a rua Luiz Maria, e apresentado a uma mulher vítima de roubo. Ela não o reconhece. 3 - ÀS 17h21, chega à rua Luiz Maria a viatura Nº 2.2203, com o sargento Gilson Santos e os soldados Claudio César, Fábio Sodré e Jocenilton Ferreira. As viaturas ficam juntas ali até 17h25, quando ambas seguem para a sede da Rondesp, no Lobato. 4 - Na sede da Rondesp, os policiais militares matam Geovane, “inclusive retirando-lhe as mãos, a genitália e a cabeça” e “ainda extraíram do seu corpo as partes tatuadas”, segundo a denúncia, que acrescenta que a vítima foi “subjugada” e decapitada, como o CORREIO já havia revelado.5 - ÀS 21h, o subtenente Claudio e o soldado Jesimiel saem da sede da Rondesp, junto com o sargento Daniel Pereira e os soldados Roberto Santos, Alan Moraes e Alex Santos. O grupo se divide nas viaturas 2.2204 e R-10 e segue para o Parque São Barolomeu, onde abandonam e ateiam fogo no corpo mutilado. OS DENUNCIADOSSubtenente Claudio Bonfim BorgesSargentos: Gilson Santos Dias e Daniel Pereira de Souza SantosSoldados: Jesimiel da Silva ResendeJailson Gomes OliveiraClaudio Cezar Souza NobreFábio Sodré Lima Masavit CardozoJocenilton dos Santos FerreiraRoberto Santos OliveiraAlan Moraes Galiza dos SantosAlex Santos Caetano>