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Marcela Vilar
Publicado em 12 de abril de 2021 às 05:00
- Atualizado há 2 anos
A pandemia do novo coronavírus provocou uma forte alta no custo de construção de imóveis em todo o país. Para se ter uma ideia, na Bahia, no início da crise sanitária, em fevereiro do ano passado, as construtoras gastavam, em média, R$ 1.073,09 por metro quadrado. Em fevereiro deste ano, este valor subiu para R$ 1.296,42, ou seja, 20,81% a mais, segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). >
O custo da construção no estado - composto de materiais, equipamentos e mão de obra - manteve-se praticamente estável em 2019, ficando, em média, em R$ 1.070,00. Em 2020, com a pandemia e com mais gente construindo, reformando ou optando por uma nova moradia, os preços subiram mês a mês. Começou o ano em R$ 1.067,03 e chegou, em dezembro, a R$ 1.250,07. Em fevereiro, alcançou os atuais R$ 1.296,42.>
Esse custo foi repassado pelas construtoras para o preço final dos imóveis. Isso, no entanto, não impediu que as vendas de unidades de todos os tipos e padrões decolassem. Na construtora MRV, por exemplo, o primeiro trimestre de 2021 superou o de 2020 e o de 2019. A empresa registrou aumento de 17% no valor geralde vendas (VGV) em Salvador e Região Metropolitana em relação ao ano passado. Para o Conselho Regional de Corretores de Imóveis da Bahia (Creci-BA), a expectativa é que o mercado ainda cresça entre 20% e 50% em 2021 frente a 2020. >
O presidente da Associação de Dirigentes de Empresas do Mercado Imobiliário da Bahia (Ademi-BA), Cláudio Cunha, acredita que esse aumento será de 20%. “O ano de 2021 continua aquecido. Temos como principais fatores a valorização do imóvel como o centro das nossas vidas, o crédito imobiliário permanece com as taxas de juros baixas e oferta de imóveis que atendem as mudanças de comportamento. Isso, aliado ao constante diálogo e proposições da Ademi para contribuir com a recuperação econômica da nossa cidade e estado, com o crescimento na vacinação, nos permite fazer a projeção de um crescimento de 20%”, estima Cunha. >
Escassez de insumos impede maior crescimento do setor Já o Sindicato da Indústria da Construção do Estado da Bahia (Sinduscon-BA) acredita que a construção civil, que inclui o segmento do mercado imobiliário, obras públicas e obras sociais, tenha alta de 10% em 2021. O setor só não “deslancha” por conta do alto preço dos insumos e materiais – alguns inclusive em falta. Segundo o vice-presidente do Sinduscon-BA, Alexandre Landim, os principais produtos mais difíceis de serem encontrados são tubos e conexões, fios e cabos e aço. >
Mas uma coisa é certa: há um consenso entre as fontes entrevistadas pelo CORREIO de que o setor não foi abalado pela crise sanitária da covid-19. “Temos hoje um estoque de imóveis novos reduzido. Há uma oportunidade para novos lançamentos, porque muito de nossos hábitos mudaram e a pandemia fez com que a gente repensasse nossa forma de viver, então novos imóveis estão surgindo para essa demanda. Mas há um empecilho em função do aumento dos preços dos materiais de construção e escassez de insumos, temos uma dificuldade de compra direto com a fábrica com prazos e certeza de entrega. Esse crescimento poderia ter sido maior”, explica Landim. >
O vice-presidente do sindicato ainda pontua que a solução para a crise econômica que assola o Brasil e, consequentemente, a Bahia, poderia ser resolvida com maior investimento em obras. “Na construção civil, para cada real aplicado, há uma geração direta maior que em outras industrias, porque a nossa mão de obra, não é tão industrializado como a da indústria química, automotiva. A gente se pauta pela mão de obra. O grande remédio para o desemprego é investir em construção civil", defende Landim. >
O grande “boom”: por que cresceu tanto? Na avaliação do diretor de patrimônio do Creci-BA, José Alberto Oliveira, o maior crescimento de compra foi registrado no mercado de imóveis novos. “Houve um crescimento do mercado, principalmente de imóveis novos. Isso tem vários fatores, um dos principais é a liquidez de dinheiro no mercado, a Selic que baixou e está em 2%, o que fez automaticamente os financiamentos baixaram muito, assim como valor da prestação, então a pessoa passou a poder comprar”, analisa Oliveira. >
Para o 2º Secretário do Creci-BA, Noel Silva, o mercado imobiliário ficou mais rentável para os investidores, que saíram do mercado financeiro para comprar apartamentos. “Por nossa sorte, o mercado imobiliário tornou-se uma alternativa de investimento porque, com a Selic [Taxa básica de juros estabelecida pelo Banco Central] baixa, os rendimentos financeiros estão dando prejuízo, ainda mais se você tem 2% em inflação”, diz Silva. Ele cita ainda uma pesquisa da Ademi-Brasil em que 46% dos investidores migraram do mercado financeiro para o imobiliário. A Ademi-BA não enviou dados regionais até o fechamento da matéria. >
“São pessoas que deixaram de aplicar em banco e passaram a investir em imóvel. Um apartamento de 300 mil reais, se você colocar no banco, ele está rendendo 2% no CDB e 100% no CDI. Ou seja, uns R$ 6 mil por ano. Já um imóvel de R$ 300 mil, se você aluga ele por R$ 1 mil, então é o dobro que renderia no banco, você teria em um ano R$ 12 mil. E quem tem dinheiro aplicado faz essa conta e prefere comprar o imóvel”, argumenta Noel. >
O diretor explica que o cenário ficou favorável por conta da baixa taxa de juros. “O que trouxe maior crescimento do mercado imobiliário foi o fato de que as taxas de juros para financiamento estão muito baixas em relação a outros períodos. Há dois 2 anos, estava em 10 a 12%, e, hoje, está entre 6,5% e 7,5%. Isso trouxe muitas pessoas que estavam fora do mercado, que não podiam comprar porque a parcela não encaixava na renda”, complementa. >
Na Linha Verde, houve um grande aumento de vendas, aliado ao aumento de preço. “Com o aumento de vendas, aumentou o preço dos imóveis, o que não é bom para gente porque aumenta a dificuldade de vender. Guarajuba e Itacimirim foram duas localidades que tiveram um incremento de vendas fantástico. Hoje é difícil comprar uma casa na região por menos de R$ 1 milhão de reais”, conta Noel Silva. Na sua corretora, até 2019, a venda média por ano de casas na região era de duas a três por ano. Já em 2020, ele fechou 10 casas – ou seja, houve um crescimento de mais de 230% nas vendas. >
Baianos investem em imóveis fora de Salvador Com a pandemia, moradores de Salvador revolveram se mudar para um espaço maior e inclusive sair da capital baiana para uma casa nos arredores. Foi o caso tanto da família da publicitária Jéssica Moreira, 23, que escolheu se mudar para Abrantes, no Litoral Norte II, quanto da professora e doula Sara Pinto, 34 que resolveu morar em Lauro de Freitas, na RMS. >
Jéssica morava com os pais, dois irmãos e dois cachorros em um apartamento de quatro quartos na Pituba desde 2011. Nos finais de semana, o apartamento enchia mais ainda: vinha o marido dela, Felipe Valim, a cunhada, as sobrinhas e os tios. “Apesar de ter quatro quartos, era um apartamento de 90 m² e a nossa família é muito grande. Pelo dia a dia corrido, com todo mundo fora de casa, trabalhando, a gente acaba não sentindo tanto. Mas no final de semana ficava lotadíssimo, aglomerado demais”, conta Jéssica. >
Por isso, eles começaram a buscar opções com mais segurança e conforto. “Eu fui criado em casa e minha pretensão era morar numa casa em um condomínio que tivesse uma estrutura de lazer e segurança Pesquisamos em Salvador mas não achamos. Então conheci o Alphaville no Litoral Norte, que tem uma estrutura muito boa, tudo fica aberto e ninguém mexe em nada”, narra o pai de Jéssica, o administrador Fernando Freitas, 60. >
Hoje, eles moram em uma casa de quatro quartos, três suítes, seis banheiros, duas salas e varanda, em um terreno de 500 m². A mudança foi feita em dezembro de 2020 e casa saiu de R$ 1,490 milhão para R$ 850 mil. “Nem o fiscal da prefeitura acreditou no preço quando veio fazer a escritura da casa”, brinca Freitas. A família ainda não vendeu o apartamento da Pituba, avaliado em 550 mil, porque um dos filhos ainda mora por lá. A distância da capital não atrapalha, porque todos passaram a trabalhar em casa, de forma remota, com a pandemia. Fernando, a esposa Joelma e a filha Jéssica na casa nova, no Litoral Norte. Crédito: Acervo Pessoal. Sara também viu seu apartamento ficar pequeno durante a pandemia. Ela é professora e o marido também, então ambos passaram a ficar 100% do tempo em casa, dando aulas online. Com o filho Martin de 5 anos e dois cachorros – um inclusive foi adotado durante a pandemia – eles optaram por sair do apartamento e morar em Lauro de Freitas. A compra já foi finalizada, mas ainda é preciso fazer alguns ajustes no cartório para concluir a mudança. >
“Veio muito forte a vontade de ter um espaço mais amplo, pelo aumento da convivência em casa. Por nós dois sermos professores, estamos o tempo todo fazendo alguma coisa, então o espaço ficou pequeno para tanto tempo dentro de casa”, relata Sara. Em Salvador, no valor que eles queriam, não encontraram. >
A solução foi buscar em Lauro, onde adquiriram a casa em Vilas, dentro de um condomínio fechado. O valor do imóvel foi de R$ 790 mil e tem 350 m². O que eles moram atualmente, apesar de ser uma cobertura, tem três quartos em 136 m² e fica no Costa Azul. A busca maior pela mudança foi também por conta do filho. “De fato a gente precisava de ar livre, de mais espaço, de um local arborizado, principalmente por conta do pequeno que se viu nesse lugar mais fechado e sentiu muita falta”, acrescenta a professora. Família de Sara preferiu se mudar para um espaço maior na pandemia. Crédito: Acervo Pessoal. Número de lançamentos de imóveis crescerá 38,2% em 2021 Neste embalo, o número de lançamentos imobiliários crescerá em 2021 em relação a 2020. A alta será de 38,2%. Em 2020, foram 34 lançamentos e 47 estão previstos para 2021 em Salvador, segundo o presidente da Associação de Dirigentes de Empresas do Mercado Imobiliário da Bahia (Ademi-BA), Cláudio Cunha. >
As vendas de imóveis também estão em uma crescente na capital baiana. De 2019 para 2020, houve um aumento de 14% no número de vendas imobiliárias. Ou seja, mesmo com a inflação do preço do metro quadrado, os soteropolitanos não deixaram de comprar. Só no segundo semestre de 2020, a Ademi-BA registrou um aumento de 19% em relação ao mesmo período do ano anterior. O número de lançamentos também registrou crescimento de 13% entre os dois períodos. >
“O ano de 2020 teve o seu primeiro semestre de muito aprendizado e incertezas. Fizemos investimentos em tecnologia e pesquisas, para propiciar a melhor jornada de compra para os clientes, levando a um segundo semestre de forte aceleração e com 34 novos lançamentos”, explica Cláudio Cunha. >
De acordo com uma pesquisa recente da associação apartamentos de dois quartos ainda são maioria absoluta entre os produtos - representam 73,19% de toda a oferta de Salvador. No caso dos imóveis de três dormitórios, que estavam em queda, cresceram e passaram a responder por quase 10% dos produtos imobiliários disponíveis no mercado da capital baiana. A instituição ainda destaca que força dos imóveis de alto padrão. Eles somavam, até o fim do último ano, em Salvador, 16,72% das unidades ofertadas e eles também são os responsáveis pelo aquecimento das vendas. >
Construtoras aumentam lucros Quem se deu bem nessa história foram as construtoras, que viram seus lucros subirem, na contramão da crise econômica do país. A MRV começou a dar descontos de R$ 5 a R$ 10 mil no início da pandemia, mas, a demanda subiu tanto, que ela teve que aumentar o valor das unidades em torno de 5 a 10%. As vendas decolaram e é o melhor primeiro trimestre da empresa desde 2019. Em 2020 , foram 460 unidades vendidas, contra 560 em 2021 – e ainda estamos em abril. Em média, são 200 unidades vendidas por mês. >
“Esse trimestre não dei desconto, tive aumento dos preços, e mesmo assim, tive aumento de 17% no VGV, em relação ao mesmo tri do ano passado. Apesar da pandemia as pessoas continuam dando continuidade da vida, buscando a casa própria, buscando um lugar seu, que não é aluguel, e que gere mais privacidade e independência, porque o convívio no isolamento se torna mais difícil", conta Flávia Cezimbra, Gestora Comercial da MRV Bahia. A construtora lançou um novo empreendimento em Cajazeiras, a Reserva da Colina, em 29 de março. São 228 apartamentos com 42,5 m² cada, com dois quartos, em condomínio fechado. >
Coincidentemente, a Nova Cipasa também teve o melhor trimestre dos últimos três anos. “A pandemia, no início, trouxe muitas incertezas, mas em fevereiro e março deste ano, tivemos uma retomada boa nas vendas e fizemos os melhores meses dos últimos três anos, também porque retomamos obras que estavam na parte final da conclusão, além dos lançamentos, o que ajudou o consumidor e conseguimos reverter o cenário”, diz o diretor-executivo da Nova Cipasa, Rogério Riquelme. Foram mais de 300 unidades vendidas. O novo lançamento da empresa é em Camaçari, em abril. A Cipasa lança a segunda fase do Vívea Camaçari, que tem 228 unidades, e VGV de R$60 milhões. >
A construtora OR também teve que aumentar os preços dos produtos pelo aumento da demanda. Ao todo, dois empreendimentos são lançados em 2021: um no Caminho das Árvores, que serão 100 unidade de alto padrão, outro em Camaçari, com 418 lotes, e a entrega da segunda fase da Reserva Sauipe. No segundo semestre, a empresa busca novos terrenos. >
“Os preços estão mais caros pela procura e os materiais de construção civil estão com aumento significativo de preço. Então há um crescimento do custo de construção, o INCC também está subindo, então, por isso o preço dos imóveis estão crescendo. Temos demanda para todo tipo, mas principalmente de quarto e sala, para quem está começando a vida”, conta o diretor regional da OR, Daniel Sampaio. >
Já a Pejota apostou em vendas online, o que foi uma saída para não perder vendas enquanto os stands estiveram fechados. “Em setembro do ano passado lançamos o Ulisses Guimarães, que foi um sucesso, vendemos 90 apartamentos em um único mês. Todos os meses, vendemos pelo menos 25 unidades e temos 40% do empreendimento vendido. Há uma procura muito grande, mesmo em março, em que tudo esteve fechado, vendemos 13 unidades”, explica o gerente de vendas da Pejota, Antônio Oliva. >
“Facilitamos algumas coisas, como forma de pagamento, dando descontos, trabalhando muito forte nas mídias digitais, o que trouxe um retorno muito bom. O material que a gente mandava para o cliente era todo online, com vista 360º e eles perceberam que comprar imóvel é um bom investimento, porque ele deixa o dinheiro dele em algo que está valorizando”, adiciona Oliva. Mais dois produtos serão lançados este ano, um na região da orla e outro em um bairro que o gerente não pôde revelar. Ambos estão com uma média de preço de R$ 270 a R$ 330 mil. >
Variação do custo do m² em R$ na Bahia (Fonte: IBGE)2019 janeiro - 1.035,26 fevereiro - 1.035, 26 março - 1.053,17 abril - 1.053, 31 maio - 1.056,75 junho - 1.061,17 julho - 1.065,90 agosto - 1.070,35 setembro - 1.067,13 outubro - 1.067,8 novembro - 1.066,59 dezembro - 1.067,03>
2020 janeiro - 1.067, 03 fevereiro - 1.073,09 março - 1.097,60 abril - 1.098,84 maio - 1.098,27 junho - 1.099,34 julho - 1.104,27 agosto - 1.118,39 setembro - 1.145,15 outubro - 1.178,73 novembro - 1.213,26 dezembro - 1.250,07>
2021 janeiro - 1.277,72 fevereiro - 1.296,42>
*Sob orientação da chefe de reportagem Perla Ribeiro >