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Gilberto Barbosa
Publicado em 1 de agosto de 2024 às 05:00
Quando pisar no ringue da Arena Paris Nord nesta quinta-feira (1), para a primeira luta na Olimpíada de Paris-2024, Bárbara Santos, 33 anos, carregará consigo a trajetória de 15 anos dedicados ao boxe. O período foi marcado pela persistência de Bynha, com três passagens pela seleção brasileira e dificuldades que a levaram a quase desistir do esporte. Agora, o cenário é diferente, e a terceira melhor lutadora do mundo é uma das esperanças de medalha do Brasil - e da Bahia - na modalidade.
Nascida em Salvador, Bárbara passou a infância no bairro de Vila de Abrantes, em Camaçari. O primeiro contato com as lutas ocorreu ainda na infância, quando foi levada pelo pai, José, para uma roda de capoeira na região. “Meu pai era capoeirista e eu sempre tive interesse em aprender algumas coisas. Eu pratiquei, mas fazia mais por hobby, nunca cheguei a competir”, lembra.
Aos 16 anos, ela se mudou para Aracaju, em Sergipe. Durante uma aula de matemática no ensino médio, um barulho do lado de fora chamou sua atenção: era um treino de kickboxing ministrado pelo técnico Williames Silva, conhecido como Mestre Chacal. “Meus pais são separados e eu fui morar com meu pai. Com isso, conheci o kickboxing e participei de alguns campeonatos. Pouco tempo depois, mudei de modalidade”, detalha Bynha.
A trajetória de Bárbara nas lutas mudou em 2009, quando conheceu o técnico Amônio Silva, conhecido como Mone Nocaute, que contou que o primeiro contato ocorreu durante um torneio de kickboxing em Aracaju. Ele já tinha ouvido sobre Bárbara e, após vê-la lutando, se aproximou e convidou para se juntar à Academia Nocaute, em Pernambués.
“Eu vi a maneira que ela lutava, sempre indo pra cima e pressionando as adversárias, e pensei que era isso que o boxe precisava. Eu me aproximei, começamos a conversar e ela me disse que tinha vontade de lutar, mas não tinha oportunidades. Foi quando eu perguntei se ela aceitava largar tudo em Aracaju e vir para Salvador”, lembra o treinador, que integra a comissão da seleção brasileira de boxe em Paris.
O começo da parceria foi bastante frutífero, com Bárbara conquistando bons resultados na sua estreia no Campeonato Brasileiro de 2011 e sendo convocada para um período de treinos com a seleção nacional. Em 2014, ela passou a fazer parte da equipe permanente.
Apesar do sucesso inicial, precisou lidar com um problema: a sua carreira profissional no kickboxing feria as regras da Confederação Brasileira de Boxe, que não permitia a transição imediata de atletas de outros esportes de combate. Com isso, ela foi desligada da equipe nacional e suspensa por cerca de um ano das competições da modalidade.
Quase saída
Após o seu retorno, em 2016, Bárbara acumulou bons resultados nos torneios nacionais de boxe, culminando no retorno para a seleção brasileira em 2017, mas não conseguiu manter a constância nas competições e saiu da equipe em 2018. Nesse período, ela precisava dividir a rotina de lutadora com o trabalho como auxiliar de cozinha e nem sempre era liberada pelos patrões para competir. A dificuldade de conciliar os dois mundos, juntamente com algumas demissões, fizeram com que a baiana pensasse em desistir da carreira.
“Ela tinha sido liberada para disputar o [Campeonato] Brasileiro e ficou no pódio. Quando fomos ao trabalho dela para mostrar a medalha e agradecer pela liberação, ela recebeu a notícia de que havia sido demitida. Isso foi o limite para ela, que resolveu sair de vez do boxe. Durante quase um ano, eu ia buscar ela em casa para treinar e pedi pra ela uma última chance: se eu não conseguisse nada em um ano, ela poderia largar o esporte e tentar uma outra carreira”, detalha Mone.
A confiança entre treinador e lutadora deu resultado, e Bárbara retomou a carreira no boxe em 2019. Pouco tempo depois, ela foi chamada para integrar a equipe da Marinha e participou do Mundial Militar em 2021, ficando na segunda posição. “Foi a injeção de ânimo que eu precisava para voltar aos ringues e fazer o que eu amo”.
No mesmo ano, ela retornou à seleção brasileira e, em 2022, foi campeã dos Jogos Sul-Americanos, no Paraguai. Os bons resultados seguiram até 2023, quando ficou em terceiro lugar no Campeonato Mundial, realizado na Índia e foi campeã dos Jogos Pan-Americanos de Santiago, no Chile, garantindo a vaga para Paris.
“Além da experiência, essas participações me dão mais confiança, porque eu já venci algumas delas e posso pensar em repetir o plano e até criar um plano B já que elas vão estudar as derrotas. Mas ainda assim são competições bem diferentes. Eu tive contato com apenas 7 das 22 lutadoras, mas vou estudar os vídeos delas e tentar trazer a medalha”, disse Bárbara.
Antes dos combates, a baiana tem como hábito organizar os materiais que vai usar na luta com antecedência. A entrada do ringue é sempre a mesma: pisando firme com o pé direito. Além disso, Mone conta que Bynha costuma estar sempre conversando com a equipe no aquecimento para se distrair.
Para a disputa da Olimpíada de Paris, a baiana fez sua preparação junto com a delegação brasileira em São Paulo. Em julho, os boxeadores foram à cidade de Rio Maior, em Portugal, para finalizar os treinamentos para os Jogos e desembarcaram na capital francesa na última semana. Ela estreia nesta quinta-feira (1), às 11h34, contra Nien Chin Chen, de Taiwan, pela categoria até 66kg.
“Eu estou confiante e cada dia mais preparada para chegar lá e buscar o melhor resultado. A minha família está bem ansiosa, sempre falo com minha mãe. Não pude ir à Bahia nesse período por ser uma época de muito foco e concentração, mas a gente mata a saudade por ligação. Eles não vão viajar para assistir em Paris, mas vão acompanhar pela TV”, afirma Bárbara.
“Essa Olimpíada coroa toda a persistência dela, o fato de nunca ter desistido do esporte, mesmo com todos os obstáculos no caminho. Eu acredito que ela consiga uma medalha em Paris”, finalizou Mone.