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Da Redação
Publicado em 29 de abril de 2022 às 10:30
No Dia Internacional da Dança, comemorado em 29 de abril, um dos mais importantes nomes da dança do Brasil, o bailarino e coreógrafo José Carlos Arandiba, mais conhecido como Zebrinha, fala de suas principais inspirações para trilhar a carreira da dança. Entre elas está a dançarina soteropolitana Altair Amazonas e Silva.
Atualmente compondo o júri técnico do quadro Dança dos Famosos, do Domingão com Huck (Rede Globo), Zebrinha é diretor artístico de dois importantes grupos da cultura baiana: o Bando de Teatro Olodum e o Balé Folclórico da Bahia, uma das companhias de dança mais aclamadas do mundo.
Para Zebrinha, a dançarina Amazonas é a diva e inspiradora da dança negra na Bahia, de quem todo mundo era fã na década de 1970. Amazonas era o destaque da companhia de dança folclórica Olodumaré, criada por Edvaldo Carneiro e Silva, o mestre de capoeira Camisa Rosa. Os ensaios e apresentações do grupo aconteciam no Teatro Castro Alves, atraindo a atenção da cidade para a presença marcante daquelas pessoas negras no espaço de reconhecimento da arte da Bahia. “Quando aquela tropa de 20, 25 negros e negras, altivos, belos, saía do Teatro Castro Alves pelo Centro de Salvador, para mim, que era adolescente na época, era a grande inspiração. Eu comecei a saber o quanto eu valia a partir dali, a me achar bonito vendo Amazonas, a mulher mais bonita que tinha nesta cidade, de verdade”, lembra Zebrinha.“Quando aquele grupo aparecia na rua, você só não se submetia a isso se você fosse muito ruim com você mesmo. Mas se você quisesse uma mudança de raciocínio e comportamento era imediato”, desabafa o dançarino. Amazonas foi também a responsável pela decisão de Zebrinha realizar um documentário sobre a Memória da Dança Negra na Bahia. Amazonas inspirou Zebrinha a fazer o documentário (Foto: Adeloyá Ojú Bará / Divulgação) Zebrinha afirma que sempre contou sua própria história através da dança e, há tempo, nutria o desejo de contar as histórias de outros artistas negros como ele. “Até que um dia eu encontrei a dançarina Amazonas, no Centro de Salvador. Uma mulher maravilhosa e uma artista importantíssima para a dança, pioneira, em um momento ainda mais difícil para as mulheres negras e para toda a população negra. Ela sempre foi altiva, corajosa, enfrentando o racismo e o machismo. Por conta de histórias como a de Amazonas eu decidi tocar o projeto deste filme”, detalha Zebrinha.
Filme trará depoimento e registros de diferentes gerações “A nossa história está sendo perdida. precisamos contar a nossa história pela boca de negros e negras como Amazonas”. O documentário é pautado pelas vivências, memórias e saberes das mestras e mestres, com entrevistas, performances e importantes registros guardados em imagens de arquivo.
O filme foi todo gravado em Salvador, no mês de março, e a previsão é que o lançamento aconteça em novembro deste ano. Zebrinha é idealizador, diretor e roteirista do projeto e conduz as entrevistas com artistas responsáveis por elevar a dança da Bahia ao reconhecimento nacional. Além de Amazonas (Altair Amazonas e Silva), estão Nadir Nóbrega, Clyde Morgan, Inaycira Falcão, Edeise Gomes, Edleuza Santos, Senzala, Luiz Bokanha, entre outras.
“Há muitas outras pessoas maravilhosas e que foram importantes para a história, mas que por limitação da duração do filme não puderam entrar no documentário”, explica o diretor.
O público poderá conhecer como esses artistas foram protagonistas de uma série de movimentos, a exemplo dos grupos Viva Bahia, Frutos Tropicais, Olodumaré, e do fortalecimento da Escola de Dança da UFBA (Universidade Federal da Bahia). Na década de 1970, o afro-americano Clyde Morgan, um dos entrevistados, foi quem introduziu a dança negra na estrutura de ensino de uma das primeiras escolas de nível superior em dança do Brasil. O primeiro homem a estudar nesta Escola de Dança da Ufba foi Raimundo Bispo, o Mestre King, um dos homenageados pelo filme Memória da Dança na Bahia.
“Conhecer a história na voz de protagonistas é um trabalho de pesquisa importante e fundamental para a preservação da memória da dança negra. Dar visibilidade ao protagonismo negro no Brasil é também aproximar toda a população de suas raízes. É entender heranças e criações fundamentais nas nossas práticas e que não encontramos explicações nos livros”, explica Zebrinha, que possui mais de quatro décadas dedicadas à dança.
Ele é formado em dança clássica e moderna no Stadeliyk Conservatorium en dans Academie te Arnhem (Holanda), onde também lecionou, e no Alvin Ailey American Ballet Theater, em Nova Iorque (EUA). Em Paris, foi professor na Academie Internacionale de Dance, no Project Studio, em Munich, e na Bélgica, deu aula na Federatie Friy Tiyed. Como solista, atuou no Introdanns, Paradis Latin, em Paris, no Alcazar de Paris e no Ballet de MonteCarlo. Atuou e dançou em shows com artistas consagrados tais como Joel Grey, Ben Vereen, Liza Minelli e Tina Turner.
Foi coreógrafo da novela Lado a Lado, da série Mr. Brau e fez a preparação de atores da novela Segundo Sol, todas produzidas pela Rede Globo de Televisão, além do musical D. Ivone Lara e dos espetáculos O Jornal, com direção de Lázaro Ramos e Exú (Cia de Teatro NATA). Foi indicado ao prêmio Shell pelo espetáculo Candaces da Cia dos Comuns (RJ), e recebeu o Prêmio Braskem de Teatro pelo espetáculo Bença (BA), um dos muitos espetáculos do Bando de Teatro Olodum que ajudou a montar.
Pioneira Com muita disciplina e entrega, aliada ao corpo esguio, simpatia e beleza exuberantes, Amazonas se destacava em diversas coreografias e em todos os elementos da dança afro, como a capoeira, o maculelê, o samba de roda e a dança feita para os orixás.
A dançarina integrava a companhia criada por Camisa Roxa, que faleceu em 2013 e era discípulo de Mestre Bimba, sendo responsável por divulgar a capoeira pelo mundo. Amazonas também dançou com nomes de referências como Flexa e Mestre King, e integrou o Viva Bahia, companhia criada pela etnomusicóloga, professora e pesquisadora da música folclórica brasileira, Emília Biancardi, em 1962.
No documentário, Amazonas fala da dedicação dos dançarinos da sua geração ao desenvolvimento de uma linguagem negra na dança, aborda o preconceito sofrido como mulher e negra nas artes e das suas boas lembranças ao lado de mestres e mestras da dança da Bahia. Ela revelou que, na década de 1980, deixou a dança para se dedicar à família, incluindo os pais idosos e um filho recém-nascido que necessitavam dos seus cuidados.
O projeto do documentário é realizado em cooperação com a Fundação Pedro Calmon e Secretaria de Cultura da Bahia, com produção da Modupé Produtora, produzido por Zebrinha, Susan Kalik e Thiago Gomes. Com roteiro de Zebrinha e Susan Kalik, fotografia de Gabriel Teixeira, trilha sonora original de Jarbas Bittencourt, com Thiago Gomes, como montador e diretor assistente.
“O filme traz muitas histórias inspiradoras de resistência, coragem e crença na arte. Mas também abordará o racismo que limitou muitas trajetórias. Não quero amenizar o discurso. O documentário também terá um tom de denúncia”, antecipa o diretor.