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TJ-BA retira da PM exclusividade de investigação de crimes praticados por PMs

Conduta especial havia sido disciplinada por normativa estadual de 2019

  • D
  • Da Redação

Publicado em 27 de março de 2023 às 12:54

 - Atualizado há 2 anos

. Crédito: Arisson Marinho/CORREIO

O Tribunal de Justiça da Bahia (TJ-BA) julgou constitucional a Ação Direta de Inconstitucionalidade (Adin) movida pelo Ministério Público da Bahia (MP-BA) contra uma normativa de 2019, que restringiu à própria PM a exclusividade de investigar crimes violentos cometidos por militares. Com a decisão, publicada no dia 23 de março, perdem a aplicabilidade seis pontos do documento, inclusive o que determina a exigência de pedido do MP, do titular da SSP-BA e/ou do delegado-geral para que a Polícia Civil investigue casos de homicídio doloso, consumado ou tentado, ainda que praticado contra civil; homicídio culposo e a lesão corporal seguida de morte atribuída a militar estadual em serviço. O Estado da Bahia ainda pode recorrer da decisão colegiada. 

Na ação, o MP argumenta que o processamento e julgamento dos crimes cometidos por militares estaduais não pode invadir a competência do tribunal do júri quando a vítima for civil. Conforme a decisão, pontos da normativa ferem a Constituição do Estado da Bahia, assim como “distorcem o modelo federativo de segurança pública e atribuições investigativas dos órgãos de segurança pública estadual, como praticamente subordinam a atuação da Polícia Civil a situações específicas, enquanto a Polícia Militar mantém o poder de investigar nesses casos de forma ampla e irrestrita”. 

“Declara-se inconstitucionais os arts. 3º, 7º, 8º § 2º, 16 e 18 da Instrução Normativa 01/2019 por ofensa formal aos arts. 11, 125, 147 e 148, IV, da Constituição do Estado da Bahia”, diz a decisão. 

A ação ajuizada pelo MP teve como participantes "amicus curiae" (amigo da corte) o Sindicato dos Policiais Civis e Servidores da Secretaria de Segurança Pública do Estado da Bahia (Sindipoc) e o Sindicato dos Delegados de Polícia Civil do Estado da Bahia (ADPEB). 

“Essa decisão do TJ Bahia demonstra qual será o norte da Segurança Pública baiana, que terá como foco a inteligência, a investigação e a elucidação dos crimes como prioridades.  Uma polícia que respeite os direitos humanos. O sindicato espera que o governo não recorra já que o próprio secretário de segurança pública já sinalizou que a nova gestão irá adotar um modelo mais pautado na inteligência, na  elucidação e na investigação para que a gente possa combater o crime organizado na Bahia e acabar com a sensação de impunidade", pontua Eustácio Lopes, presidente do Sindipoc. 

Dados de 2022 da Rede de Observatórios da Segurança apontam a Bahia no topo da do ranking de letalidade em ações policiais. Das 2.061 operações realizadas no estado entre julho de 2020 e junho de 2022, 330 pessoas foram mortas, o que representa uma letalidade de 16%. A Bahia está à frente dos cinco estados analisados, entre eles o Rio de Janeiro. Também foram analisados os resultados nos estados de São Paulo, Pernambuco e Ceará. 

Pele-alvo  Na Bahia, 98% das pessoas mortas em ações ou operações policiais são negras, de acordo com o relatório da Rede de Observatórios da Segurança Pública, divulgado em novembro de 2022. 

O período analisado pela Rede foi o ano de 2021. Das 616 pessoas mortas no ano passado, com informações sobre cor e raça registradas, 603 eram negras. Em números absolutos, o estado é o mais letal da região Nordeste.

Na capital, a tendência persiste. A incidência, em termos percentuais, no entanto, é maior: 99,6%. Das 299 mortes em ações policiais em Salvador, 241 têm registros de cor e raça na cidade. Dessas, 240 são pessoas negras e apenas uma morte foi de vítima branca.   

Veja na íntegra os artigos reconhecidos como inconstitucionais pelo Tribunal de Justiça da Bahia:

Instrução Normativa Conjunta SSP/PM/CBM/PC/DPT N°. 01, de 08 de julho de 2019:  Dispõe sobre as medidas de polícia judiciária que devem ser adotadas em casos de crime violento letal intencional - CVLI atribuído a militar estadual, inclusive quando a vítima seja civil, e disciplina a apuração da morte ou lesão corporal de civil em confronto com militar estadual em serviço, disciplina a apuração de condutas correlatas atribuídas a policial civil e dá outras providências.

Art. 3°. Crime Violento Letal Intencional - CVLI, conforme o definido no parágrafo único do art. 1° do Decreto Estadual n°. 14.953 de 07 de fevereiro de 2014, é o homicídio doloso, o roubo qualificado pelo resultado morte ou a lesão corporal dolosa seguida de morte.

Art. 7°. O homicídio doloso, consumado ou tentado, inclusive o praticado contra civil, o homicídio culposo e a lesão corporal seguida de morte atribuída a militar estadual em serviço, respectivamente enquadrados nos artigos 205 (combinado com o art. 30, II, do Código Penal Militar, se tentado), 206 e 209, §3°, do Código Penal Militar, serão apurados, no âmbito da Polícia Militar e do Corpo de Bombeiros Militar, mediante a instauração de inquérito policial militar, por meio das suas Corregedorias Gerais, se ocorridos na Região Metropolitana de Salvador.

Art. 8°. A instauração de inquérito policial militar para apurar homicídio doloso atribuído a militar estadual não impede que a mesma conduta seja apurada pela Polícia Civil, considerando que há divergência jurisprudencial e doutrinária acerca da natureza jurídica de tal de crime, se militar ou comum, além de que é admitida a apuração do mesmo fato, mediante a instauração de inquérito, tanto pela Polícia Militar quanto pela Polícia Civil, conforme o decidido pelo Supremo Tribunal Federal na ação direta de inconstitucionalidade - ADIN n°. 1.494-DF e no recurso extraordinário - RE n°. 260404/2001.

§2°. A Polícia Civil somente poderá instaurar inquérito policial para apurar homicídio doloso atribuído a militar estadual se houver requisição do Ministério Público ou determinação do Secretário da Segurança Pública e/ou do Delegado-Geral da Polícia Civil, observando-se os artigos 5° e 9° desta instrução normativa.

Art. 16. Considera-se confronto, para efeito desta instrução normativa, a situação em que o militar estadual em serviço seja alvo de ato hostil, especialmente mediante disparo de arma de fogo.

Art. 18. A conduta do militar estadual que espontaneamente comunicar formalmente o confronto ocorrido durante o exercício da sua atividade funcional e cumprir todas as diligências previstas como de sua alçada na portaria n°. 291/2011-SSP deve ser considerada justificada, salvo prova em contrário, a critério da autoridade que estiver responsável por presidir o inquérito policial civil ou militar.