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Laura Fernades
Publicado em 19 de setembro de 2016 às 03:18
- Atualizado há 2 anos
Lucy Alves foi uma das revelações de 'Velho Chico'(Foto: Arthur Meninea/TV Globo)Uma das revelações dramatúrgicas da novela Velho Chico, a cantora e sanfoneira paraibana Lucy Alves, 30 anos, conversou com o CORREIO uma semana antes do acidente que resultou na morte trágica e inesperada do seu parceiro de gravação, o ator Domingos Montagner (1962-2016). A seguir, confira a entrevista da artista. >
Luzia é uma mulher forte e expressiva. O que você mais gosta na personagem?Adoro essa energia da Luzia, esse ímpeto que ela tem. Adoro a relação que ela tem com a família, que não é 100%, mas é muito bonita. Gosto do brilho que ela tem, é uma mulher que pode mostrar vários lados. Tem hora radiante, hora mais quieta, hora confabulando o que pode fazer para ter o amor de Santo. Gosto muito da energia, ela é uma pessoa muito inquieta. É um papel que qualquer ator gostaria de ter.>
Quais foram os principais desafios em interpretar Luzia?No começo foi complicado entendê-la, por ser complexa, e foi difícil aprender a não julgar algumas atitudes dela. Nunca teria coragem de rasgar as cartas, por exemplo. >
Ela agiu de maneira cega. Luzia tem também um desprendimento com as filhas: é mãe e tem hora presente, mas o mundo a consome tanto... Tem essa tempestade dentro da cabeça dessa mulher e eu ficava julgando “nossa, não faz isso Luzia!”. Ao mesmo, entendi um perfil de mulher que existe aos montes. Pude entender e amadurecer enquanto ser humano, enquanto mulher, que existe essa dificuldade, essa carência.>
Como foi sua reação ao se perceber atriz?Estou muito feliz, porque pra mim foi uma surpresa. Isso foi mérito de Luiz (Fernando Carvalho, diretor artístico da novela) e de toda a equipe que viram o que poderiam extrair lá na frente. Claro, a gente é artista, a gente já lida com esse universo, mas é um outro tipo de linguagem. Eu duvidava muito desse meu lado atriz, fiquei muito assustada no início.Lucy contracena com Camila Pitanga em 'Velho Chico'(Foto: Renato Rocha Sampaio/TV Globo)Devo muito ao trabalho de equipe, ao auxílio de todos os atores, com essa direção que tem um olhar muito sensível. Muita coisa acontece no “gravando” e a gente não sabe como vai reagir. De repente, estamos imersos na história. É muito louco! Mexe com a cabeça, com o físico. Saio com estômago doendo, juro! Mas é muito bom poder se jogar nesse universo desconhecido. Não tenho medo. Eu gosto de me lançar. É emocionante!>
Como Luzia encarou o fim do relacionamento com Santo (Domingos Montagner), já que seu maior medo é ficar sozinha?Ela sabia desde o início que Santo amava Tereza, mas a vida inteira tentou fazer com que ele gostasse dela do jeito que ela o amava. Insistiu, porque ela não desiste do que quer. Em determinado momento, ela viu que não deu. Mas porque fez errado! Ficou triste, mas teve que reconhecer que por fazer errado, a vida veio e cobrou. >
Que bonito que ela está percebendo o erro, a singeleza disso é muito forte. Ela tem um temperamento muito forte. Os rompantes vão voltar, claro, porque ela não muda da água para o vinho. Mas a tentativa de mudar, ela está buscando. E outra, ela vai ter Santo por perto. Não é do jeito que ela quer, mas esse carinho, esse cuidado, ela não vai perder. Não sei o que vai ser dela, mas acho interessante a força que não cessa. Luzia continuou sozinha, mas disse: “Vou recomeçar”. Lucy vive Luzia, ex-mulher de Santo, interpretado pelo saudoso Domingos Montagner(Foto: Estevam Avellar/TV Globo)A novela Velho Chico é um reencontro com a história do nosso país e nosso povo, segundo o diretor artístico Luiz Fernando Carvalho. O que acha disso?É um tom informativo e a novela ganha muito nisso. Não é só uma obra que traz beleza, mas mostra o que se passa no interior do Brasil, nesse Brasil mais profundo. Acho muito salutar levantar questões tão bonitas como a do São João: o que está sendo feito com esses trios que não tocam mais por aqui? >
A gente é forte e passa por um momento muito delicado que precisa de união, informação, para parar com esse egoísmo. Está cada um no seu quadrado e não é assim. Acho muito bacana esse olhar, essa atenção para a informação do povo brasileiro.>
Como é poder atuar nesse universo cultural nordestino?Não podia desejar outro papel, outro momento, outro tipo de trabalho para descobrir essa história da atriz. Tudo isso veio na hora certa e com um propósito de falar do meu povo, homenagear meu povo. É um presente, gratificante poder usar meu sotaque que é tão bonito, trazer toda essa diversidade incrível que o Nordeste tem: do chão rachado, do rio, do verde que não se acaba. Venho de João Pessoa, uma cidade maravilhosa, banhada pelo mar, tão verde, tão bonita... >
Convivi com os sanfoneiros, com a área mais rural, com a terra, com o cheiro do milho. Muito bonito revelar para o resto do país uma região culturalmente tão rica nas artes todas e na música que me deu um vocabulário imenso. O jeito de falar do nordestino traz essa métrica do coco, do repente, é tão bonito perceber isso. Estou plena. É um trabalho que não vou esquecer nunca! É um presente divino!Lucy Alves foi revelada no 'The Voice'(Foto: Estevam Avellar/TV Globo)Soube que você decora os textos de uma forma curiosa, usando a música. Como é isso?>
Irandhir (Santos) usava a base rítmica do coco, sem melodia, e punha o texto dele na métrica. Aí eu disse: “Cara, é isso!”. Adotei isso pra mim. E muitas vezes usei o bandolim para encontrar a melodia da minha fala. A música está presente em tudo e me ajudou. No início, fui pegando jeito, hoje memorizo muito rápido.>
Como consegue lidar com as duas carreiras?Essa parte da novela me consumiu muito e foi uma opção mergulhar de cabeça, quis me doar de corpo e alma. Mas terminou que sacrifiquei um pouco a música, não estou nos palcos como queria. Mas estou trabalhando como formiguinha. Em janeiro, a gente pretende lançar um single e um álbum em seguida. >
Estou de mala e cuia no Rio, desde o Carnaval. Muitos projetos acontecem por aqui, gosto da cidade, e preciso estar perto desses profissionais. Estou sempre voando pra lá e pra cá. É uma fase de fazer parcerias, de me mudar, ainda é um período de plantio.>
Você foi revelada para o Brasil no The Voice, mas sua paixão pela música começou lá na infância. O que a música representa pra você? Como foi esse processo?A música hoje é minha vida e carrega muitas memórias, sempre. Desde criancinha fazia parte das minhas brincadeiras, da minha família. Ela que me trouxe aqui e está abrindo portas pra mim. Sinto prazer imenso de poder viver da arte. >
Sempre tive apoio total de 100% da minha família que sempre foi um esteio. Desde o The Voice, sinto como é colher alguns desses frutos que foram plantados lá atrás. Foi um programa bacana que me lançou para o Brasil inteiro. Não tenho o que reclamar da minha vida, não, viu? (risos)>