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Mario Bitencourt
Publicado em 11 de novembro de 2017 às 15:58
- Atualizado há 2 anos
Milhares de pessoas de cidades da região Oeste da Bahia foram às ruas de Correntina, a 914 km de Salvador, neste sábado (11) para uma manifestação em defesa da Bacia do Rio Corrente, composto por quinze rios, seis riachos e cinco córregos.
O protesto acontece nove dias após a invasão e destruição de equipamentos nas fazendas da empresa agrícola Igarashi, dia 2 deste mês. Segundo a Força Tarefa da Secretaria da Segurança Pública da Bahia, criada para investigar o crime, ao menos 8 mil pessoas estavam na manifestação deste sábado.
Já os organizadores do evento disseram que mais de 12 mil pessoas das cidades de Correntina, Santa Maria da Vitória, São Desidério, Baianópolis, Barreiras, Santana, Bom Jesus da Lapa, Sítio do Mato, dentre outras, foram às ruas. (Foto: SSP/Divulgação) Participam lideranças políticas da região, como deputados e prefeitos, e religiosas, como o bispo da Diocese de Bom Jesus da Lapa, dom João Santos Cardoso. A manifestação teve início às 7h30 e foi encerrada às 12h, depois de percorrer ruas centrais da cidade e margear o Rio das Éguas, que corta a cidade de 33 mil habitantes e é um dos que fazem parte da Bacia do Rio Corrente.
Acompanhada por cerca de 300 policiais, entre civis e militares, a manifestação foi pacífica e não foram registrados conflitos. Um helicóptero da Polícia Militar acompanhou toda a manifestação. Garantindo a ordem Delegada integrante da Força Tarefa da SSP-BA responsável por investigar a destruição das propriedades, Núncia Zaíra Pimentel, disse que o papel da equipe foi apenas dar apoio para que a manifestação ocorresse sem maiores problemas.
“Em nenhum momento a polícia esteve aqui para reprimir qualquer manifestação democrática. Nos fizemos presentes para dar aos participantes a segurança necessária para a realização do ato, que é um direito de todo cidadão”, declarou.
A delegada investiga junto com o delegado Marcelo Calçado, titular em Correntina, a destruição da fazenda Igarashi, que causou prejuízo estimado em mais de R$ 10 milhões ao grupo.
Mais de 20 pessoas já foram ouvidas no caso, entre elas o vice-prefeito de Correntina Michael Delgado (PV), o presidente da Câmara de Vereadores Ebraim Moreira (PMDB) e da vereadora Albanice Magalhães (PR), os quais também estavam na manifestação deste sábado.
O ato, segundo os organizadores, busca também dar maior visibilidade aos problemas socioambientais do Oeste da Bahia, cuja área está inserida na região do Matopiba, projeto governamental de incentivo à produção agrícola nos estados do Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia, e onde estão os últimos remanescentes de Cerrado no Brasil. A região do Matopiba é a principal fronteira agrícola brasileira.
Na região também estão os rios Carinhanha, Corrente e Grande, bem como suas nascentes, subafluentes e afluentes, principais contribuintes com as águas do rio São Francisco na Bahia, responsáveis por até 90% de suas águas no período seco.
A água desses rios abastece não só grandes projetos agrícolas como também pequenos produtores, como os que protestaram contra o projeto de irrigação da Igarashi, que possui a outorga da Secretaria Estadual do Meio Ambiente (Sema) desde 2015 para irrigar 2.530 hectares com 180 mil metros cúbicos de água por dia do Rio Arrojado, que faz parte da Bacia do Rio Corrente.
A quantidade de água retirada do rio foi o argumento para a invasão da fazenda que ocorreu no dia 2 de novembro, quando entre 500 e 800 pessoas, transportadas em cinco ônibus e caminhonetes, destruíram em duas fazenda da Igarashi 32 pivôs de captação de água, caminhões, máquinas colheitadeiras, uma retroescavadeiras, uma patrol, uma máquina pá carregadeira e ao menos dez tratores. Todo o sistema elétrico da fazenda também foi danificado. Os autores do crime bem como os patrocinadores dos mesmos ainda não foram identificados.
Sem soluções A autorização da Sema dá a Igarashi o direito de retirar do Rio Arrojado 106 milhões de litros por dia. O Sistema Autônomo de Água e Esgoto de Correntina (SAAE), órgão municipal, informou que utiliza duas bombas d’água para abastecer cerca de 7 mil residências da cidade, sendo que o consumo diário é de 3 milhões de litros por dia.
“O governo da Bahia tem ciência desses problemas há vários anos, mas não resolve. Fica só protelando, empurrando com a barriga, e as pessoas da região sofrendo com os problemas ambientais, sem que se tenha uma resposta para isso. O governo da Bahia só tem olhos para o agronegócio na região”, disse Samuel Santos, que atua na região como agente da Comissão pastoral da Terra (CPT), braço da Igreja Católica.
Também presente no ato, o presidente da Câmara de Vereadores de Correntina, Ebraim Moreira (PMDB), disse que é preciso resolver os problemas de grilagem de terras na região. “Essa área que a Igarashi ocupa, por exemplo, faz parte de uma área de mais de 600 mil hectares que são do Governo da Bahia. São terras devolutas, e por isso eu nem considero que houve uma invasão nas fazendas que a empresa diz ser dela. Muitos empresários do agronegócio aqui simplesmente invadiram as terras do Estado da Bahia e grilaram”, ele afirmou.
Em nota ao CORREIO, a empresa Igarashi declarou que “todos os imóveis em que a empresa realiza suas atividades são regulares”. A empresa diz que rechaça “qualquer tentativa de caracterizar irregularidade em nossas atividades ou imóveis, se tratando de uma tentativa de justificar o injustificável, desviar o foco da inequívoca violência cometida e induzir a sociedade a erro”.
“Reiteramos nosso papel de produzir alimentos com sustentabilidade e nossa confiança na responsabilização dos autores dos atos de profundo vandalismo e ilegalidade”, declarou a Igarashi em nota.