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Waldeck Ornelas
Publicado em 15 de setembro de 2021 às 17:00
- Atualizado há 2 anos
Mais um casarão tombado tombou na Soledade; outro mais em Nazaré; um outro no Santo Antônio. Esta tem sido a sina dos antigos casarões “protegidos” pelos órgãos do patrimônio histórico localizados em áreas que, tendo perdido o dinamismo econômico, perderam valor de mercado e têm proprietários sem condições ou interesse em restaurá-los.
Que é preciso preservar os casarões do Centro Histórico de Salvador não há dúvida. Há iniciativas e ações isoladas, ora do poder público, ora de particulares, que recuperam alguns imóveis, mas nada que resolva estruturalmente o problema. E, com frequência, sempre perdemos mais um casarão antigo, muitas vezes por demolição, em seguida a desabamento parcial.
Há até incentivos fiscais para a recuperação, pelos proprietários ou por investidores. Mas não existe capacidade financeira de muitos herdeiros e falta sensibilidade à iniciativa privada. A revitalização do Centro Histórico ainda não despertou o interesse econômico dos empresários locais. Uma estupidez!
A CODESAL já fez vistorias em quase 1.700 casarões, detectando cerca de 300 com risco iminente de desabamento. Enquanto o mercado não se interessa por essa área da cidade é indispensável que haja iniciativas públicas capazes de manter de pé os antigos casarões.
Estudos técnicos demonstram que é menos onerosa a estabilização que a demolição, mas tem prevalecido sempre a solução mais simplista e predatória. Tampouco é solução o escoramento, um paliativo caro e sem resolutividade.
O IPHAN-Bahia desenvolveu uma metodologia de estabilização que endereça para a restauração, funcionando como uma primeira etapa desse processo, aliás aplicada com êxito no casarão dos azulejos azuis da Praça Cairu, hoje já restaurado pela Prefeitura, que aí implantou a primeira etapa da Cidade da Música da Bahia, um belíssimo trabalho de Gringo Cardia e Antonio Risério, a que o público ainda não teve acesso por conta da pandemia.
Outras dezenas deles, na área do Comércio, geralmente ocupados com atividades comerciais no térreo e desocupados nos pavimentos superiores, sujeitos a degradação e incêndios, estão incluídos em um projeto habitacional da Prefeitura e aguardam a oportunidade de voltarem a cumprir plenamente sua função social.
Mas impõe-se a existência de uma política pública para preservar a todos. Um programa permanente de estabilização e restauração. Nos três níveis de governo! Os órgãos para executar esta tarefa são facilmente identificáveis: o IPHAN, na área federal; o IPAC, no nível estadual; e a CODESAL, no âmbito do Município. No nível estadual, a ação deve priorizar a Soledade, pela situação crítica em que se encontra e pela proximidade do bicentenário da Independência da Bahia.
Estamos na hora das Leis Orçamentárias. É preciso criar em cada um desses órgãos um projeto orçamentário específico, destinado à estabilização dos casarões do Centro Histórico. Esta é uma iniciativa para os respectivos Poderes Executivos, mas será bem-vinda por meio de senadores, deputados federais, deputados estaduais e vereadores, com a vantagem do caráter impositivo das emendas parlamentares, ou seja, da garantia de liberação dos recursos.
Paralelamente, a Prefeitura precisa notificar os proprietários, com base no instrumento da edificação ou utilização compulsória. O novo PDDU de Salvador definiu o Centro Histórico como área onde deva ser utilizado; a lei do Revitalizar regulamentou a matéria; a SEDUR, no entanto, nunca tomou a iniciativa de aplicá-lo.
Haverá os que dirão que a quase totalidade desses imóveis não é pública. Serão os burocratas e os negacionistas de sempre. Mas o Direito tem solução para permitir tanto a intervenção quanto o ressarcimento. Pública, com certeza, é a obrigação de preservá-los.
*Waldeck Ornélas é especialista em planejamento urbano-regional, autor de Cidades e Municípios: gestão e planejamento.