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Bruno Wendel
Publicado em 13 de agosto de 2014 às 06:10
- Atualizado há 2 anos
Geovane desapareceu no dia 2Pior que a notícia da morte é não ter notícia nenhuma. “Não durmo e não como direito. É uma angústia muito grande não saber o que houve de fato com o meu filho”. As palavras são do comerciante Jurandy Silva de Santana, 40 anos, ontem pela manhã, em mais uma busca no Instituto Médico Legal Nina Rodrigues (IML).
Há 11 dias, ele não sabe o paradeiro do filho Geovane Mascarenhas de Santana, 22, que desapareceu no último dia 2, depois de ser abordado por policiais militares na Calçada. A única pista que Jurandy tem é um vídeo, que ele mesmo conseguiu, em que o filho é colocado no porta-malas de uma viatura da PM.
Nas imagens, o rapaz é abordado, às 16h58 do último dia 2, por três PMs. Logo na abordagem, mesmo com as mãos atrás da nuca, Geovane apanha de dois policiais – leva dois tapas e um chute - enquanto o terceiro aponta uma pistola para sua direção. Geovane é revistado e, instantes depois, colocado no fundo da viatura. Em seguida, os policiais deixam o local. Um dos PMs sai pilotando a moto (CG 125 Fan, placa JRB-9929), que até agora também não foi localizada. Toda a ação dura cinco minutos.
“Tenho certeza que é meu filho ali. Além das características físicas, altura, a roupa, a moto, têm pessoas que conhecem a nossa família e viram”, disse Jurandy. A qualidade da imagem não permite a identificação da Companhia, mas o comerciante disse se tratar de uma guarnição das Rondas Especiais (Rondesp), citada em duas ocorrências em que registrou do sumiço do filho na Corregedoria da Polícia Militar, no dia 4, e no Departamento de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP), no dia 9.
Buscas Ontem pela manhã, o CORREIO acompanhou mais um dia de busca de Jurandy pelo filho. Acompanhado da nora, Jamille Santos de Jesus, ele foi até o local da abordagem policial para saber se alguém sabia de mais alguma coisa. “É duro vir aqui. Se pelo menos deixassem ele em algum lugar...”, dizia o comerciante, quando foi interrompido por um morador da região que diz ter testemunhado um trecho do diálogo entre os PMs e Geovane.
“Um policial disse: ‘Se pique, se pique’. Mas o rapaz não queria ir sem a moto e acabou sendo colocado nos fundos da viatura”, contou o homem, pedindo anonimato. “A moto está no nome de meu filho e está em dia”, disse o pai, mostrando o documento do veículo. No Sistema Nacional de Informações de Segurança Pública, Prisionais e sobre Drogas (Sinesp) do Ministério da Justiça, o veículo não aparece como roubado. ASSISTA A ABORDAGEM DA PM
Uma notícia de que o rapaz estaria na Cadeia Pública levou o pai e a mulher de Geovane ontem ao Complexo Penitenciário da Mata Escura. “Tenho esperança de encontrá-lo”, disse Jurandy, antes de entrar no complexo.
Isso mesmo: ver o filho preso, no caso de Jurandy, seria um alívio. Quarenta e cinco minutos depois, o comerciante e a nora retornaram. “Nada, mais uma vez”, lamentou ele. No IML, os dois únicos corpos ignorados no necrotério não eram do filho. “O primeiro usava cavanhaque, o que meu filho não gostava. O segundo usava um casaco amarelo, mas Geovane saiu de bermuda estampada azul e camisa preta”, disse o comerciante. Meia hora antes de seu desaparecimento, Geovane tinha acabado de lavar a moto comprada pelo pai. “Ele disse que ia ver uns amigos e que à noite sairíamos para dormir fora”, disse a mulher dele, Jamille. Ela contou que já foi a vários hospitais. “O HGE, Roberto Santos, Hospital do Subúrbio e nada. Nossos parentes estão ligando todos os dias para várias unidades médicas. Todos estão mobilizados e desesperados”, disse Jamille. “Sonho com ele todos os dias pedindo ajuda”, contou. Na esquina onde o filho foi abordado, Jurandy mostra denúncias registradas na Corregedoria da Polícia Militar e no Departamento de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP). Em nota, a PM informa que suacorregedoria ‘não recepcionou a referida denúncia’Humilhação Jurandy relatou que passou por várias unidades da polícia. Central de Flagrantes, 1ª Delegacia (Barris), 2ª DP (Lapinha), 5ª DP (Periperi), 9ª DP (Boca do Rio), 22ª DP (Simões Filho), Delegacia de Repressão a Furtos e Roubos de Veículos (DRFRV), 37ª Companhia Independente (Liberdade), além dos Batalhões da Rondesp de Lobato e Simões Filho.
“Quando chego nas delegacias, mandam aguardar o corpo aparecer boiando em algum lugar ou jogado num matagal. Eles desprezam por que meu filho já esteve preso duas vezes. Na Rondesp de Simões Filho, um policial disse: ‘Vá lá no IML que tem 30 corpos’! É muita humilhação. Não se importam com a dor de ninguém”, relatou. Geovane foi preso duas vezes em 2011 por roubo (veja ao lado). Atualmente, segundo o pai, o rapaz trabalhava limpando ônibus de uma empresa em Santa Mônica. “Mas estava afastado há oito meses. Levou um tiro no braço quando passava pela rua e se recuperava”. Geovane é o filho mais velho de sete irmãos por parte do pai. Ele tem mais três irmãs por parte da mãe, que mora em São Paulo.
Geovane foi preso duas vezes por roubo há três anos Geovane foi preso duas vezes, em 2011, ambas por roubo. “A primeira vez, em março, ele foi levado para a 9ª DP (Boca do Rio). Passou três meses lá. Uns três meses depois, foi levado para a Delegacia de Repressão a Furtos e Roubos (DRFR) e em seguida transferido para a Cadeia Pública. Passou duas semanas lá”, relatou Jurandy. No Tribunal de Justiça da Bahia há três processos cujos réus se chamam Geovane Mascarenhas de Santana: dois em 2011, por roubo e por furto qualificado, e um mais recente, em 2014, por homicídio contra Cristiano Silva Almeida, vulgo Galego.
No processo, consta que Geovane teria contado com a ajuda de Antônio Henrique e Davi dos Santos Batista. No entanto, o juiz Eduardo Augusto Leopoldino Santana negou o pedido de prisão preventiva por ausência de provas. Na decisão, o juiz diz que Geovane vinha colaborando com a investigação e que, “das provas colhidas até então, só há o depoimento de uma testemunha não presencial, que apenas afirma a autoria do representado, como justificativa por ter tentado matá-lo e aos seus companheiros”. O pedido de prisão preventiva foi negado no dia 22 de maio deste ano e o processo arquivado na última quinta-feira (7), cinco dias depois do desaparecimento de Geovane.