Cadastre-se e receba grátis as principais notícias do Correio.
Geraldo Bastos
Publicado em 15 de agosto de 2019 às 06:00
- Atualizado há 2 anos
A indústria de mineração da Bahia - uma das "joias" do setor no país - tem para os próximos anos uma longa lista de oportunidades e desafios. Se por um lado o estado tem sido contemplado com a descoberta de minerais raros e a atração de grandes investimentos, beneficiando sobretudo as regiões mais pobres, por outro, é preciso modernizar a infraestrutura, investir em pesquisa, melhorar o diálogo das empresas com as comunidades e reduzir a burocracia. Só assim, entendem os especialistas, será possível ampliar a participação do setor no PIB estadual, que hoje não chega a 2%. No país como um todo esse percentual é de 4%.
"O ponto crítico é o investimento em pesquisa", diz Eduardo Ledsham, presidente da Bamin. Ele conta que o Brasil hoje responde por apenas 0,7% do investimento global em pesquisa mineral. "A Bahia, a despeito do grande trabalho realizado pela CBPM (Companhia Baiana de Pesquisa Mineral), investe 25 vezes menos na comparação com países como o Canadá e Austrália", conta o executivo, que participou do painel sobre os "desafios e oportunidades da mineração", na abertura do I Fórum Internacional de Inovação e Sustentabilidade na Mineração.
Ledsham salientou ainda que falta ao estado brasileiro o que ele chama de "mecanismos de reconhecimento ao esforço de risco na pesquisa". E cita o exemplo de um vizinho sul-americano: "No Peru, um investidor que tem sucesso em sua pesquisa, tem de volta todo o imposto pago do período que vai do início da pesquisa até o primeiro ano da operação do projeto", diz, acrescentando que o sucesso da exploração mineral na Bahia se deve à "persistência" e ao trabalho da CBPM. "A participação da mineração no PIB da Bahia hoje é de 1,4%. Eu vejo que podemos triplicar isso em dez anos".
Paulo Misk, presidente da Vanádio de Maracás e do Sindimiba, concorda. "Pesquisa é fundamental", diz ele, que defende também condições "fiscais mais favoráveis", principalmente para as empresas exportadoras. Misk lembra que o setor tem crescido de forma expressiva no estado nos últimos anos. Em 2017, a expansão foi de 19%. No ano passado, 23%. "A sociedade baiana e o governo têm, de forma muita clara, consciência de que a mineração tem um papel importante no desenvolvimento", diz. Burocracia
A burocracia é outro entrave para o desenvolvimento do setor. O ciclo da mineração - entre a descoberta e a entrada em operação de uma mineradora - leva, em média, no mundo, entre de 10 a 12 anos. No Brasil, chega a 20 anos. A cobrança das empresas é por mais agilidade e simplificação nos processos de licenciamento de pesquisa. Alexandre Vidigal, secretário de mineração do Ministério de Minas e Energia, reconhece o problema.
"Esta questão de prazo no Brasil é muito séria. Não dá para fechar os olhos para isso", diz ele, informando que no Canadá e na Austrália o prazo de licenciamento e outorga de uma lavra não passa de quatro anos. "Temos que copiar esses modelos", afirma Vidigal, que apontou seis grandes desafios para o setor no país. Ele destacou durante o debate, mediado pelo jornalista Donaldson Gomes, editor de Economia do CORREIO, o grande potencial mineral da Bahia. " Aqui, o lastro que se tem para crescimento é de impressionar, são muitas as possibilidades".
Comunicação
Outros desafios enfatizados pelos debatedores foram a necessidade de garantir a segurança jurídica da atividade, a sustentabilidade das operações e a necessidade de melhorar a comunicação com o cidadão que, com frequência, ainda vê as mineradoras como interessadas apenas no lucro e na exploração a qualquer custo. As recentes tragédias em Mariana e Brumadinho, em Minas, pioraram ainda mais a imagem da atividade.
"A sociedade tem que compreender que a mineração é fonte de riqueza. Uma riqueza que pode ser produzida sem estar associada a esses dramas", afirmou Paulo Misk, presidente da Vanádio de Maracás. Eduardo Ledsham, da Bamin, afirmou que "não existe nada sem mineração". Eduardo Athayde, diretor do Worldwatch Institute - WWI Brasil, diz que a mineração só existe para melhorar a vida das pessoas e tornar o mundo mais sustentável. "A mineração existe porque as pessoas utilizam de seus produtos para ter uma vida melhor, mais confortável e de melhor qualidade".
O I Fórum Internacional de Sustentabilidade na Mineração é uma iniciativa da Companhia Baiana de Pesquisa Mineral (CBPM) e da Secretaria de Ciência Tecnologia e Inovação da Bahia (Secti), com o apoio do CORREIO, que tem como patrocinadores a Companhia Vale do Paramirim, Bahia Mineração (Bamin), Sindicato das Indústrias Extrativas de Minerais (Sindimiba) e a Vanádio de Maracás S/A.
O QUE É PRECISO PARA ATRAIR NOVOS INVESTIMENTOS PARA O PAÍS
Setor aguarda ferrovia e porto A conclusão das obras de Ferrovia de Integração Oeste-Leste (Fiol) e a construção do Porto Sul, em Ilhéus, no sul da Bahia, são consideradas obras fundamentais para o desenvolvimento da atividade mineral na Bahia. O trecho I da Fiol, de Ilhéus a Caetité, com extensão de 537 km, já tem 76,2% de execução física da obra completada. A expectativa é a de que o leilão de concessão da ferrovia ocorra no primeiro trimestre do ano que vem. A Bamin e um consórcio formado por empresas da China irão iniciar a construção do Porto Sul ainda neste semestre, num investimento da ordem de R$ 2,5 bilhões.
Responsabilidade ambiental e social Por atuar em regiões quase sempre longínquas do país, onde o estado nem sempre está presente como deveria, a indústria da mineração deve assumir a responsabilidade e tomar medidas efetivas para evitar a degradação ambiental e garantir que haja retorno social e econômico para as populações locais. O secretário de Geologia, Mineração e Transformação Mineral do Ministério de Minas e Energia (MME), Alexandre Vidigal, diz que não há como se pensar em mineração hoje sem ações de sustentabilidade. "Sustentabilidade e a atividade mineral são perfeitamente compatíveis", afirmou ele.
Segurança jurídica é fundamental A denominada segurança jurídica para o minerador vai muito além da garantia de que aquele que investiu na pesquisa e foi bem-sucedido terá a garantia de que obterá a concessão de lavra. Dentro do conceito de segurança encontra-se a justa expectativa de que a atividade mineral será regulada por leis modernas, equilibradas, estáveis e compatíveis com o estágio de desenvolvimento da atividade, em uma visão global. O país precisa atrair investimentos saudáveis para a mineração. "Não conseguirá isso sem demonstrar ao empreendedor que aqui encontrará ambiente seguro", diz Alexandre Vidigal.
Comunicação com a sociedade As mineradoras do país têm adotado cada vez mais boas práticas e tecnologias de ponta para reduzir os impactos ambientais, mas suas ações nem sempre são comunicadas com a assertividade devida à sociedade. Falta informação à cidadania. "Por conta disso, o setor é muitas vezes visto como ruim, danoso e depreciativo", diz o secretário do Ministério de Minas e Energia (MME), Alexandre Vidigal, lembrando que o setor é responsável por 25% das exportações do país. "E vale lembrar que apenas 0,5% do território do país é utilizado para atividades minerais", acrescentou o secretário do MME.
Novas fronteiras da mineração A abertura da mineração em terras indígenas e faixa de fronteira é um dos grandes desafios. O entendimento do governo é que as restrições que existem para a mineração nessas áreas prejudicam seu desenvolvimento. Prevista na Constituição, a exploração em áreas indígenas por garimpeiros ou mineradoras nunca foi regulamentada. Pela lei, essas terras são da União e se destinam à posse permanente dos índios que as ocupam. Porém, há regimes distintos de propriedade. Jazidas do subsolo são passíveis de concessão, desde que a atividade tenha sido aprovada pelo Congresso e pelos indígenas, que devem ter direito a uma parte do lucro.
ANM SE MODERNIZA PARA SER MAIS ÁGIL
Presente no painel que discutiu os desafios e oportunidades da mineração, o diretor-presidente da Agência Nacional de Mineração (ANM), Victor Hugo Froner Bicca, disse ontem que o foco do trabalho da nova agência neste momento tem sido incrementar o uso de tecnologias da informação nos procedimentos do órgão regulador e investir na qualificação e valorização dos servidores. Ele informou que a ANM tem hoje cerca de 194 mil processos em tramitação ainda no meio físico (papel).
Segundo ele, com a digitalização dos processos, as concessões de licenças ganharão um novo ritmo. "A gente precisava dotar o órgão desse importante setor de um mecanismo de gestão mais moderno, mais rápido, mais eficiente", afirmou ele, lembrando que com a digitalização o custo das empresas também vão diminuir. "Todo o processo poderá ser acompanhado pela internet. Cálculo que as empresas terão uma economia de pelo menos R$ 12 milhões ao ano", afirmou ele.
Entre as ações previstas para a sua gestão, o geólogo Victor Bicca apontou a adoção das melhores práticas internacionais, de acordo com a OCDE, que prevê a construção do guia de boas práticas regulatórias, elaboração da agenda regulatória e consulta pública como atividade de rotina da construção de atos normativos. “As deliberações serão totalmente transparentes”, afirmou o gestor.
Atividades
Criada em substituição ao antigo Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM), a ANM tem, entre suas atribuições, a fiscalização da atividade de mineração e a responsabilidade por vistorias, notificações, autuação de infratores e adoção de medidas como interdição e aplicação de sanções. Pela Constituição, a atividade de mineração é autorizada sob o regime de concessão pública.Como contrapartida, as empresas exploradoras têm de pagar compensação aos entes da União.
GOVERNO ANUNCAI LEILÃO PARA OUTUBRO
O primeiro leilão de áreas de mineração do governo Jair Bolsonaro está marcado para o próximo dia 21 de outubro. A área fica em Palmeirópolis, no estado do Tocantins, e tem potencial para cobre, chumbo e zinco. Alexandre Vidigal, secretário de mineração do Ministério de Minas e Energia, disse ontem, em Salvador, que este leilão estreia o modelo em que o governo oferece ao mercado o direito de exploração de áreas das quais possui título minerário e conhecimento geológico.
Vidigal conta que a medida é uma iniciativa piloto e que o objetivo é realizar novos leilões. "Outras 300 da Companhia de Pesquisa de Recursos Minerais (CPRM) deverão ser leiloadas. Além disso, há outras 20 mil áreas da Agência Nacional de Mineração (ANM) que também serão oferecidas ao mercado", afirmou.
"Nosso projeto é com a sociedade. De concreto o que estamos dizendo é que não faz sentido todo esse patrimônio retido no cofre do estado, trancado a sete chaves. Estamos abrindo este cofre e entregando ao empreendedorismo essas áreas para que eles gerem riqueza", afirmou, para completar: "Mineração é um patrimônio que só tem sentido de ser se for convertido em riqueza, se for retirado do solo".
Licitação
A licitação da área de Palmeirópolis será realizada em duas etapas. As empresas interessadas entregarão as propostas em envelopes fechados. As três melhores classificadas nesta etapa poderão disputar o bloco em lances viva voz.
Vence o certame a empresa que oferecer o maior percentual de royalty sobre o faturamento bruto durante a produção. A expectativa de Alexandre Vidigal é que o leilão atraia grandes empresas do setor e investidores estrangeiros.