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Thais Borges
Publicado em 9 de julho de 2017 às 03:55
- Atualizado há 2 anos
Na casa da vendedora Jéssica Avelino Morais, 25 anos, os dois frascos dos medicamentos oxandrolone e stanozolol ficaram pela metade. Apontados pelos médicos como dois dos anabolizantes sintéticos mais comuns, eles haviam sido usados pela jovem, morta no último dia 27, segundo os pais da vítima.A jovem Jéssica Avelino passou mal na academia que frequentava logo após a aula de dança(Foto: Reprodução/ Facebook) Ela teve uma parada cardíaca após passar mal em uma aula de dança, na academia do bairro de Tancredo Neves. “A gente não tem certeza se ela estava usando os medicamentos, até porque ela queria emagrecer. Pesava mais de 80 quilos. Quando eu vi os frascos, estavam acima da metade (no número de cápsulas), então, ela deve ter tomado algumas há muito tempo, até pela validade”, contou o tio da jovem, Vinicius Avelino. Pelo menos um dos medicamentos estava vencido desde janeiro. Jéssica também tinha histórico de doenças cardíacas na família.
Mas, segundo a endocrinologista Thaisa Prugilio, mesmo quem não tem casos de problemas cardiovasculares na família deve evitar o uso de anabolizantes. Ela explica que essas substâncias são drogas derivadas do hormônio testosterona e conhecidas por efeitos que vão desde o aumento dos músculos até efeitos andrógenos. “A principal indicação do uso é para pacientes com hipogonadismo, que têm uma deficiência. Mas há algumas indicações especiais, como pacientes com doenças crônicas ou que tenham passado por algum processo cirúrgico mais intenso”. Entre os anabolizantes, há aqueles chamados bioidênticos - substâncias que têm a mesma estrutura molecular que os hormônios já produzidos pelo corpo humano, como a testosterona – e os sintéticos, como os que Jéssica teria usado, e que o corpo não produz nada parecido. Um dos riscos, devido a isso, é justamente desencadear um processo inflamatório, já que o corpo não reconhece aquela substância.
RiscosQuem usa anabolizantes sem indicação médica pode ter desde alterações na fertilidade e aumento de pelos na face, no caso das mulheres, até aumento das mamas, redução dos testículos e disfunção erétil, nos homens, de acordo com a endrocrinologista. “O uso dessas drogas de forma abusiva para fins estéticos tem se mostrado perigoso por efeitos adversos e graves”, diz Thaisa, citando, ainda, problemas hepáticos.
Do ponto de vista cardiovascular, um dos riscos é o aumento do tamanho do coração, com a hipertrofia do ventrículo (uma das cavidades do coração), e até mesmo ao estímulo do crescimento de tumores - especialmente em órgãos como ovários, testículos e fígado, como explica o cardiologista Marcos Barojas, diretor da Sociedade Brasileira de Cardiologia Seção Bahia e vice-coordenador da unidade coronariana do Hospital Português.
Quando o coração cresce, há um ambiente mais propício a arritmias. “Não é uma coisa que tomando hoje a pessoa vai morrer hoje, mas a hipertrofia do ventrículo pode levar a uma situação ruim do coração, que tem como consequência a arritmia. Com o esforço físico e uso de estimulantes, como a cafeína, há um ambiente propício a arritmias letais.”
E, segundo o cardiologista, a maioria das pessoas que usam anabolizantes não tem nenhuma queixa que indique necessidade de reposição hormonal. Entre os sintomas, estariam a perda de libido e características de virilidade nos homens. “Mas esse público não tem essas queixas. A queixa é: ‘quero ficar forte’. E quando você vai ver, as dosagens hormonais estão dentro da faixa de normalidade.”
No mês passado, foi sancionada a lei municipal que determina que toda pessoa que quer ter aulas em uma academia precisará apresentar um atestado médico. A Lei 9.224/2017 estabelece que a avaliação médica deve ser feita de acordo com o tipo de exercício escolhido pelos alunos - o documento é obrigatório e deverá ser entregue no ato da matrícula. A academia que descumprir pode ser multada e ter o alvará cassado.
Médicos devem abordar mudança de hábitosDe acordo com a nutricionista clínica e esportiva Alice Alagia, o interesse por anabolizantes é cada vez mais frequente, até mesmo por quem procura um consultório. Há desde aqueles que já chegam claramente perguntando por sintéticos até os que pedem um ‘empurrãozinho’.
Segundo ela, a primeira coisa que deve ser abordada com o paciente é justamente a mudança de hábitos - seja para a saúde, seja para aumentar a duração dos resultados. “Existem, dentro da própria alimentação, formas de chegar ao resultado. Mas, quanto mais objetivo você tem, mais intensa deve ser a atividade e mais restritiva a dieta. E as pessoas hoje querem comer tudo e fazer pouco exercício”, afirma Alice.
Quando alguém quer emagrecer, com dieta e exercícios físicos, os primeiros resultados já podem aparecer na mesma semana, mas passam a ser mais consistentes a partir do primeiro mês. Já para quem quer aumentar a musculatura, os primeiros resultados começam entre três a quatro meses - a depender do corpo da pessoa, podem aparecer em até dois meses.
Os anabolizantes encurtam o caminho, mas são perigosos. Os resultados podem aparecer em até 30 dias. “Tem que achar uma atividade física que você goste. Agora, arriscar a vida em troca de 15 segundos de fama não vale a pena”, diz a nutricionista.