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Mario Bitencourt
Publicado em 16 de agosto de 2019 às 19:50
- Atualizado há 2 anos
(Foto: Acervo pessoal) Uma mulher de 35 anos deu à luz a gêmeas siamesas unidas pelo abdômen nesta quinta-feira (15), em Santo Antônio de Jesus, no Recôncavo da Bahia. Liliane Silva dos Santos, que estava com 36 semanas de gestação, viajava para Salvador para uma consulta médica quando a bolsa rompeu. Ela e as filhas, batizadas de Laura e Laís, passam bem.
O nascimento de gêmeos siameses é um evento raro em todo o mundo. No Brasil, se registra um caso para cada 150 mil nascidos vivos. De acordo com o Ministério da Saúde, em 2018 houve 43 nascimentos deste tipo. A Secretaria de Saúde da Bahia (Sesab) não soube informar quantos casos ocorreram no estado.
As gêmeas nasceram no Hospital Maternidade Luiz Argolo, mantido pela Santa Casa de Misericórdia de Santo Antônio de Jesus, e estão com os batimentos cardíacos e respiração normais. Elas, que juntas pesam 3,798 kg, nasceram de parto cesáreo que durou cerca de uma hora, tempo considerado normal pela equipe médica. A mãe das bebês já sabia da condição delas desde o quarto mês de gravidez.
Laura e Laís compartilham o intestino delgado e grosso, a bacia e o sistema urinário, e possuem uma anomalia no reto (há apenas um ânus). Em 101 anos de existência, esse foi o primeiro parto de gêmeos siameses na unidade hospitalar, que ocorreu às 9h48 de quinta-feira. A mãe delas é de Piraí do Norte, no Baixo Sul da Bahia.
Na madrugada desta sexta-feira (16), as irmãs foram transferidas para Feira de Santana e, depois, embarcadas em um avião da Força Aérea Brasileira (FAB) para o Hospital Estadual Materno-Infantil Dr. Jurandir do Nascimento (HMI), em Goiânia (GO), referência nacional nesse tipo de procedimento.
Cirurgia Ao CORREIO, o médico cirurgião pediátrico Zacharias Calil, de reconhecimento internacional no assunto, garantiu que as gêmeas poderão passar pela cirurgia de separação, mas precisarão esperar no mínimo, um ano para que isso aconteça.
Segundo o especialista, a demora para realizar a cirurgia se explica porque “é uma patologia muito complexa, sobretudo por conta da parte da bacia”. Nesse tipo de cirurgia, segundo ele, “não tem pele suficiente para fechar após a separação, sendo necessário colocar expansores de silicone para criar pele”.
Ainda segundo Calil, casos de gêmeos siameses ligados pelo abdômen são ainda mais raros: ocorrem em apenas 6% dos nascimentos do tipo. Em Goiânia, Laura e Laís estão sendo acompanhadas por uma tia, com quem o CORREIO não conseguiu contato.
Através de um comunicado, a direção do HMI informou que as gêmeas estão internadas na Unidade de Cuidados Intermediários Neonatal (Ucin). “Estão em estado estável e vão começar uma dieta via oral. Ainda não tem a data da cirurgia”, informa.
O HMI, unidade hospitalar do Sistema Único de Saúde (SUS), é referência em separação de gêmeos siameses. Já foram registrados 39 nascimentos do tipo, com 18 separações.
A primeira acorreu em 2000, das gêmeas Larissa e Lorrayne, que eram unidas pelo abdômen e pela pelve. A literatura médica mundial indica que, dentre os siameses operados, um em cada cinco sobrevive à cirurgia. No HMI, esse índice chega a 50%, segundo a direção do hospital.
Retirada do útero A mãe das gêmeas também precisou de cirurgia após o parto. Liliane teve uma hemorragia em decorrência de o útero não ter contraído. “A contração é o que faz com que cesse o sangramento depois do parto. Como isso não ocorreu, tivemos de retirar o útero totalmente”, disse a médica Jussara Argolo Guilhard, diretora médica da Santa Casa de Misericórdia de Santo Antônio de Jesus.
A mãe das meninas segue internada e deve receber alta do Hospital Maternidade Luiz Argolo neste sábado (17), segundo Jussara. O médico Caio Nogueira Lessa, presidente da Associação de Obstetrícia e Ginecologia da Bahia (Sogiba), disse que o procedimento realizado em Liliane é comum e geralmente é feito para proteger as pacientes.
“Quando ocorre a contração uterina após o parto, a própria musculatura do útero faz com que os vasos sanguíneos sejam bloqueados e o sangramento controlado. Se isso não ocorre, faz-se massagem uterina e medicamento para ajudar o útero a contrair, mas se não tem resposta, faz a retirada do útero para proteger a mãe. A retirada é uma medida extrema, que pode ser parcial ou total”, explicou Lessa.
Durante a gravidez, Liliane estava sendo acompanhada no Hospital Roberto Santos, em Salvador, onde teria atendimento antes da bolsa romper.
Antes de chegar a Santo Antônio de Jesus, de acordo com a Santa Casa de Misericórdia, Liliane passou por dois hospitais do Baixo Sul, que teriam se negado a fazer o parto por não oferecer suporte necessário para esse tipo de procedimento. A direção da Santa Casa não citou quais hospitais seriam esses.