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Morre aos 72 anos cantor baiano Moraes Moreira

Ele estava em casa no Rio de Janeiro e faleceu durante o sono

  • D
  • Da Redação

Publicado em 13 de abril de 2020 às 11:11

 - Atualizado há 2 anos

. Crédito: Divulgação

O cantor baiano Moraes Moreira morreu nesta segunda-feira (13) no Rio de Janeiro. Segundo o Blog do Marrom, que informou em primeira mão a notícia, o também cantor e compositor Paulinho Boca de Cantor confirmou a informação. Muito emocionado, Paulinho mal conseguia falar e contou que ele faleceu durante o sono. 

Moraes sofreu um infarto agudo do miocárdio, segundo a assessoria. Não há informação sobre quando e onde será o sepultamento. Ele estava em sua casa, na Gávea, ao falecer - ele vivia sozinho e já foi encontrado morto. O cantor deixa dois filhos, o também músico Davi Moraes e Maria Cecília, e dois netos, Alice e Francisco.

Em janeiro, o cantor fez um show no Pelourinho, ao lado do filho. Sentado durante a apresentação, já parecia estar debilitado. Em fevereiro, no Carnaval, voltou a se apresentar no Pelô. "Eu já passei por tantos carnavais aqui na Bahia e o povo no chão  pedia para a gente cantar. E hoje em dia o  trio elétrico é essa loucura toda", disse. "Aqui, no Pelourinho, se forma. Viva o Pelourinho!". (Foto: Divulgação) Leia mais: Armandinho revela que Moraes 'se despediu' em sonho na última noite

Nascido Antônio Carlos Moreira Pires na cidade de Ituaçu, Moraes começou a carreira tocando sanfona em festas de São João. Na adolescência, aprendeu a tocar violão enquanto estudava em Caculé. Depois, se mudou para Salvador e conheceu Tom Zé. Formou com Baby Consuelo, Pepeu Gomes, Paulinho Boca de Cantor e Luiz Galvão os Novos Baianos, ficando com o grupo de 1969 até 1975.

Com Luiz Galvão, compôs a maioria das canções do grupo, que é responsável por um dos discos mais icônicos da música brasileira, Acabou Chorare, de 1972. O disco foi eleito o melhor da música nacional pela edição brasileira da Rolling Stone em 2007. "Obra-prima dos Novos Baianos, Acabou Chorare nasceu do choque entre o grupo e João Gilberto (engana-se quem imagina que a influência musical foi unilateral. Vale ouvir João Gilberto, o 47º colocado desta mesma lista, e perceber imediatamente que se trata do outro lado de uma mesma moeda.) Depois de um primeiro disco semitropicalista, um tanto psicodélico e essencialmente roqueiro gravado em São Paulo (É Ferro na Boneca, de 1970), a trupe se mudou de mala e cuia para o Rio de Janeiro e por lá se instalou", diz trecho da matéria.

Três anos depois de Acabou Chorare, Moraes parte em carreira solo, lançando mais de vinte discos. Acabou Chorare fez história (Foto:Divulgação) Em 2012, Moraes gravou o disco A Revolta dos Ritmos, que trazia 12 composições inéditas dele. Paralelo ao novo CD, Moraes viajou pelo Brasil, ao lado do seu filho Davi, com uma turnê comemorando os 40 anos de Acabou Chorare.

Em 2016, foi a vez de fazer uma turnê comemorativa com os Novos Baianos. Depois de 17 anos, Moraes, Baby do Brasil, Pepeu Gomes, Paulinho Boca de Cantor e Luiz Galvão se reencontram para a nova turnê, batizada com nome do disco mais famoso do grupo. Um ano depois, algumas apresentações da banda foram suspensas porque o cantor foi internado em decorrência de uma úlcera.  (Foto: Divulgação) Moraes foi o primeiro artista a cantar num trio elétrico no Carnaval, junto com  o Trio Elétrico Armandinho, Dodô & Osmar. A partir daí, seus frevos ‘trieletrizados’, como ele denominava, passaram a ser marca registrada do nosso Carnaval: Pombo Correio, Chame Gente, Eu Sou o Carnaval, entre outros. 

O cantor foi homenageado pelo Carnaval de Salvador em 2017, ao completar sete décadas de vida. Naquele ano, o trio dele teve um problema na embreagem que atrasou bastante a saída. Mas o público se manteve fiel, esperando Moraes, que estava acompanhado do filho Davi.  (Foto: Evandro Veira/Arquivo CORREIO) “Tentaram melar meu baba, mas não conseguiram. O povo baiano viu que eu estava lá com minha história, meu repertório, com Davi Moraes, a banda e uma equipe dedicada”, comentou o cantor ao CORREIO. 

“Nossas canções resistiram a tudo e a todos, dando mostras de que vieram para ficar. Passada a euforia dos sucessos imediatos, elas ressurgem gloriosas, no gogó dos foliões, inteiras e renovadas pela juventude. Reforçam assim um conceito que tenho: um bom Carnaval se faz com passado, presente e futuro”, analisou. Davi, filho de Moraes, também seguiu carreira na música Na última entrevista concedida, ao jornal O Globo, publicada há menos de duas semanas, Moraes criticou Baby do Brasil. O motivo da desavença foi o espetáculo musical que conta a história dos Novos Baianos, com direção de Otávio Muller e direção musical de Pedro Baby, filho dela, e Davi, filho do cantor. Moraes afirmou que Baby queria um espetáculo que "fosse evangélico" e ignorasse o uso de drogas por parte dos Novos Baianos. Hoje evangélica, a cantora afirmou que a peça é "ficção".

Moraes se irritou. "Dizer que o musical não retrata os Novos Baianos é uma mentira deslavada. Baby queria que o espetáculo fosse evangélico. Que não dissesse que fumou maconha, que tomou ácido, que fez tudo. Assim, os Novos Baianos não seriam revolucionários. João Gilberto deve estar se mexendo na sepultura. Porque o nosso grupo fumou, sim, tomou ácido, sim, fez músicas maravilhosas em estado de fumar maconha, sim. A gente fazia música de inclusive pra ela. As canções dela que fizeram sucesso, como "A menina dança", "Tinindo, trincando", "Os pingos da chuva" e tantas outras, foram feitas na onda, porque naquele tempo a onda era essa", afirmou. Moraes começou carreira tocando sanfona e depois passou ao violão Ele disse ter adorado o espetáculo e aproveitou para fazer uma crítica política ao momento do Brasil. "Vamos parar de mentir em nome de Deus! Éramos fãs de Jimi Hendrix, Janis Joplin. Estávamos afinados com a geração daquele tempo. Será que os Beatles fariam músicas tão lindas se não tivessem tomado ácido? Não morremos de overdose porque a gente era esperto, malandro, seguramos a barra. Isso é preconceito de evangélico. Vai votar em Bolsonaro!".

Durante a quarentena, no mês passado, Moraes escreveu um cordel. Falava da covid-19, mas também do medo da violência e no final faz uma referência a Marielle Franco, vereadora do Rio de Janeiro assassinada em 2018.

Quarentena (Moraes Moreira)

Eu temo o coronavirus E zelo por minha vida Mas tenho medo de tiros Também de bala perdida, A nossa fé é vacina O professor que me ensina Será minha própria lida

Assombra-me a pandemia Que agora domina o mundo Mas tenho uma garantia Não sou nenhum vagabundo, Porque todo cidadão Merece mas atenção O sentimento é profundo

Eu não queria essa praga Que não é mais do Egito Não quero que ela traga O mal que sempre eu evito, Os males não são eternos Pois os recursos modernos Estão aí, acredito

De quem será esse lucro Ou mesmo a teoria? Detesto falar de estupro Eu gosto é de poesia, Mas creio na consciência E digo não a todo dia

Eu tenho medo do excesso Que seja em qualquer sentido Mas também do retrocesso Que por aí escondido, As vezes é o que notamos Passar o que já passamos Jamais será esquecido

Até aceito a polícia Mas quando muda de letra E se transforma em milícia Odeio essa mutreta, Pra combater o que alarma Só tenho mesmo uma arma Que é a minha caneta

Com tanta coisa inda cismo…. Estão na ordem do dia Eu digo não ao machismo Também a misoginia, Tem outros que eu não aceito É o tal do preconceito E as sombras da hipocrisia

As coisas já forem postas Mas prevalecem os relés Queremos sim ter respostas Sobre as nossas Marielles, Em meio a um mundo efêmero Não é só questão de gênero Nem de homens ou mulheres

O que vale é o ser humano E sua dignidade Vivemos num mundo insano Queremos mais liberdade, Pra que tudo isso mude Certeza, ninguém se ilude Não tem tempo,nem idade

Moraes era ainda escritor, publicando os livros "Poeta não tem idade" (2012) e "A História dos Novos Baianos e Outros versos" (2008), ocupando a cadeira de número 38 da Academia Brasileira de Literatura de Cordel.