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Maria pioneira: conheça a história da primeira mestre de obras da Bahia

Maria do Amparo Xavier, 63, emprestou seu nome para projeto que capacitará mulheres para a Construção Civil

  • Foto do(a) author(a) Gabriel Amorim
  • Gabriel Amorim

Publicado em 16 de julho de 2019 às 05:20

 - Atualizado há 2 anos

. Crédito: Foto: Gabriel Amorim/CORREIO

“Entrei para varrer e disse: eu vou ser mestre de obras. Enfrentei tudo e cheguei lá”. Foi assim que se apresentou Maria do Amparo Xavier, 63, a primeira mestre de obras do estado da Bahia, que sonha em ver mais mulheres tomando os canteiros. Sorridente e feliz, dona Maria emprestou seu nome ao projeto ‘Marias na Construção’ que capacitará mulheres para trabalhar no setor em Salvador. “Quando é para falar de Construção Civil a gente tem que sorrir não é?”, questiona enquanto conversa com a reportagem do CORREIO. 

O caminho de 49 anos no setor começou cedo, aos 14 anos. A escolha pela construção civil partiu de um sonho de Maria, que queria dar a sua família, natural de Camassandi, no município de Jaguaribe, uma vida melhor. “A minha família é muito pobre e eu morava numa casa de palha. Quando eu conheci uma casa de construção eu me apaixonei. E entendi que eu precisava aprender a fazer aquele trabalho porque eu precisava colocar a minha mãe e meus irmãos dentro de uma casa de verdade”, conta a mestre de obras.

Determinada, como demonstra sua fala assertiva, a então adolescente decidiu sair de casa e enfrentar a desconhecida cidade grande. No início da década de 70, quando Maria do Amparo chegou a Salvador, essa não era uma tarefa fácil. Por vezes, e durante muito tempo, ela foi a única mulher dentre todos os trabalhadores de uma obra. O início, aliás, não foi como ela sonhou. “Na época não tinha mulher na obra, a não ser para lavar banheiro, fazer café, e não era isso que eu queria, mas como eu precisava entrar na obra, então o que eles me dessem estava bom. Eu entrei para varrer a obra”, lembra ela.

Uma vez dentro dos canteiros, Maria do Amparo foi atrás do seu sonho. A baixinha de 1,60 foi conquistando seu espaço até ocupar o cargo mais alto dentre os operários da construção civil. Para D. Maria, não tem tempo ruim. Ela se orgulha em contar que aprendeu todos os ofícios do setor e trabalhou em obras das maiores construtoras do estado, como por exemplo a construção do metrô soteropolitano. “Eu faço tudo! Armadora, carpinteira, soldadora, pinto, faço parte elétrica. Eu gosto de botar a mão na massa”, bate no peito pra dizer. 

Dificuldades 

Como nem tudo são flores, D. Maria lembra que precisou enfrentar um temido obstáculo em um ambiente dominado por homens: o machismo. Depois de anos sem sofrer qualquer resistência dos colegas, a história de preconceito  de Amparo ocorreu em 2006. Ela conta que estava em uma grande obra em Salvador quando um gerente nacional da construtora chegou para comandar os trabalhos. 

“Ele disse: Mulher nunca trabalhou comigo na frente de obra, você não vai ser a primeira. A partir de hoje você vai lavar os banheiros dos peões, olhando para o céu e contando as estrelas Eu disse: não vou mesmo”, detalha.

Maria lembra que saiu da sala consciente de que havia sofrido um assédio e não se fez de rogada. Mesmo sem testemunhas para comprovar seu depoimento, a mestre de obras procurou as autoridades competentes e denunciou o caso. Depois de idas ao Ministério Público, Sindicato, e à justiça, ela conseguiu que a empresa fosse condenada em todas as instâncias, pela discriminação e preconceito que sofreu. O tal gerente, ela lembra, mesmo com cargo nacional e 38 anos de empresa, foi demitido. “Ele me viu pequeninha, numa obra daquele tamanho, não estava acostumado. Às vezes o homem se incomoda com o sucesso da mulher”, acredita ela. 

Luta

Apesar da única história de preconceito de sua longa caminhada. Maria do Amparo não acredita que episódios como esses devem parar qualquer mulher que queira conquistar o seu espaço, nessa ou em qualquer outra área, mesmo nas profissões dominadas pelos homens. “Onde o homem estiver a mulher também pode estar. A mulher é tão boa na construção civil quanto o homem. O homem acha que só tem a força, mas a mulher tem a força, o perfeccionismo, e amor ao seu trabalho”, defende. 

A crença de Amparo é tão forte que ela resolveu encontrar uma maneira de ajudar na prática. Além de querer participar ativamente do projeto que ajudou a batizar, ela é a atual secretária de políticas para as mulheres do Sindicato da Construção Pesada e Montagem Industrial (Sintepav-Ba). “Eu continuo lutando para colocar as mulheres no mercado de trabalho, indo a tudo que é canteiro de obras para fiscalizar, ver como estão sendo tratadas as mulheres”, diz ela. 

Chefe de uma família de mulheres, com uma filha e duas netas, ela deixa um recado, para quem sonha como ela. “Não desista do seu sonho, vá trabalhar no que você quiser, na Construção Civil ou em qualquer lugar. Estando na obra, entre linda e saia linda, porque nós temos esse direito”.

Hoje, a mestre de obras se orgulha de ter conseguido, com o seu trabalho, tirar do interior toda a família. Mãe e irmãos hoje moram, como ela sonhou, em casas de construção. “A Construção Civil foi e é muito importante”, diz ela emocionada, mas sem tirar o sorriso do rosto.    *Com orientação do chefe de reportagem Jorge Gauthier