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Livro reúne 200 depoimentos de pessoas que curtiram a década do desbunde na BA

Idealizado pelo produtor cultural Sérgio Siqueira e pelo escritor Luiz Afonso, o livro Anos 70 Bahia será lançado nesta terça, às 17h30, no restaurante Póstudo, no Rio Vermelho

  • Foto do(a) author(a) Alexandre Lyrio
  • Alexandre Lyrio

Publicado em 3 de abril de 2017 às 06:00

 - Atualizado há 2 anos

Caetano Veloso e Chico Buarque em Buraquinho, um dos paraísos baianos nos anos 70 (Foto:Arlete Soares) O jornalista Nelson Cadena senta-se em um banco na Praça da Piedade. Morou ali, na rua mesmo, por conta própria, em meados da década de 1970. Mais de 40 anos depois, de volta ao lugar em que passou noites a fio, ele senta-se, ajeita os óculos e suspira. Além das recordações que pipocariam na mente e no peito, estampava outras duas marcas daqueles tempos: a camisa florida e o resto da cabeleira. Um dos personagens do livro Anos 70 Bahia - que será lançado nesta terça-feira (04/04), a partir das 17h30,  no restaurante Póstudo - Cadena foi hippie dos mais viscerais. “Eu era um hippie pobre. Colhia cogumelo na ilha porque não tinha dinheiro para comprar maconha”, disse, com vestígios de sotaque castelhano. “Fazia meu chá de cogumelo e ficava de boa. Depois vim para Salvador morar uns tempos na rua”, lembrou o colombiano, que chegou na Bahia com 19 anos e, antes da Piedade, viveu em uma cabana que ele mesmo construiu na Ilha de Itaparica.

Osmar Martins entrevista Sérgio Siqueira; assista

Fato real ou pura vertigem? Não se sabe. Na verdade, para boa parte daquela geração, tudo o que diz respeito àqueles tempos é pura vertigem. Prova disso são as histórias, entorpecidas com boas doses de erva, amor, cogumelo, sexo, ácido, rock n´roll e liberdade. Agora, muitas dessas memórias alucinantes e alucinadas estão disponíveis para quem quiser ler. Está tudo em Anos 70 Bahia (Corrupio).Concebido pelo produtor cultural Sérgio Siqueira e pelo escritor Luiz Afonso, a publicação é um documento escrito por quem experimentou na pele - e no cérebro - os anos 70 em Salvador e outros picos de loucura e lisergia, como Arembepe e Itaparica. Coletânea de depoimentos publicados no Facebook, o livro reúne histórias de 200 colaboradores da página homônima à publicação. Rita Lee em Arembepe (Foto: Wagner Berber/Acervo de Mira Rodrigues)Famosos Gente que contraria a máxima: “Se você se lembra dos anos 70 é porque não estava lá”. Dada à riqueza de detalhes de algumas histórias, eles se lembram, sim. Os autores discorrem, por exemplo, sobre o dia em que o ator Robert de Niro passou o seu aniversário, como anônimo, no Restaurante Berro d´Água, no Porto da Barra. Charles Mocó, dono do Berro, levou um susto quando soube que sua foto estava estampada em uma revista de circulação nacional. Na verdade, a figura mais importante da foto era De Niro, clicado por um fotógrafo que estava na área. Mas se o ator fosse descoberto por Mocó, pouco mudaria. “No Berro, era proibido pedir autógrafo a artista. Artista esperava mesa como um simples mortal!” narra comentário de Charles Pereira no livro. Na página seguinte, Luiz Jasmin lembra da noite em que ali jantou com Michael Douglas.É que, “no esplendor dos anos 70”, muitas estrelas passaram pela Bahia. De Niro e Douglas preferiram o Porto da Barra, território de Caetano Veloso nos verões. “O Porto era o start, onde tudo começava”, descreveu Eva Cristina. “Na época do lindo sonho delirante, o Porto era a casa de todos”, destacou Diógenes Moura. “Era um sonho”, resumiu Ivonete Moniz Pacheco.Janis Joplin faz topless em Arembepe, em março de 1970 (Foto: Reprodução)Mas tantos outros astros visitaram tantos outros lugares por aqui. Anos 70 Bahia não podia deixar de tratar de episódios clássicos, como a passagem de Janis Joplin, em março de 1970, quando ficou hospedada na casa de Martins, no Rio Vermelho. “Janis visitou o Mercado Modelo, tomou banho de mar de topless, entornou muita pinga e tequila, e, como era comum na época, LSD e marijuana”. E o sem número de artistas que visitaram Arembepe? Em uma só foto, Jack Nicholson, Roman Polanski, Jessel Buss e Denis Hopper passeiam no paraíso. Em outro momento, Mick Jagger e Keith Richards compraram um imóvel chamado Casa do Sol no local. Diferente de Roman Polanski e seus amigos, não se misturaram com os nativos. “Fizeram um Réveillon fantástico por lá”, narra o livro.  Arembepe é um capítulo à parte. Muitos relatos das viagens e loucuras regadas a ácido. Por lá passaram também os Novos Baianos e Tim Maia, que “ajudou um dos biriteiros da região a consumir algumas das 156 garrafas de cachaça Saborosa, pelas quais trocou sua Kombi velha”. Mas era o tempo do LSD: “Você encontrava pessoas na rua de Arembepe viajando com aqueles olhos arregalados”, contou Missival. Tudo isso com a ditadura militar correndo solta.NudezEram também tempos de nudez. Fotos como a de Ney Matogrosso nu, por entre a vegetação, resumem bem a liberdade em que se podia circular na Aldeia Hippie. “Arembepe: toda nudez será exaltada”, resume o título de um dos capítulos. Arembepe tornara-se, então, um dos paraísos hippies do mundo. Era o nosso santuário mor. Mas, mesmo em Salvador, outros lugares fizeram a cabeça da malucada. Muitos hippies e outros entusiastas da contracultura migraram para bairros como Boca do Rio, Alto da Sereia e Pituaçu, por exemplo. E os points culturais? Eram muitos. Do Icba, “território livre das artes” à Concha Acústica. Os memoráveis shows dos Novos Baianos eram grandes baratos coletivos. Foi em um deles que o artista argentino Fernando Noy, um dos representantes do desbunde em Salvador na época, fez uma performance tão louca que o show parou. “As pessoas viraram de costas para o palco para assistir Noy. Baby se retou e falou no microfone: ‘Vocês preferem a gente ou a bicha’. A plateia inteira: ‘A bicha, a bicha’”, conta Sérgio Siqueira. Casamento cigano: no centro, Vinicius de Moraes e Gessy Gesse, ao lado de Calasan Neto e Auta Rosa (à esquerda) e Jorge Amado e Zélia Gattai (direita) (Foto:Divulgação) Vinicius de MoraesOs carnavais eram catarses coletivas. “Há Jacu no pau!”, anunciou, logo na estreia, o bloco do Jacu em uma faixa. Todo mundo em cana. Repressão! Mas Salvador respirava arte, cultura e música. Essa imagem ficou ainda mais forte quando Vinícius de Moraes veio morar na Bahia. “Para desagrado e ciumeira no circuito boêmio-cultural do Rio e São Paulo, Vinicius chegou  no início dos anos 70, importado pela atriz Gessy Gesse”. A casa do casal,  em Itapuã, tornou-se ponto de romaria de turistas. Sobre isso, a própria Gessy fez comentário impagável no Facebook: “A coisa chegou, assim, àquele ponto em que Vinicius se bandeava para a casa de Elsimar Coutinho, em frente, e lá ficava sentado na varanda degustando seu uisquinho. Gritavam, chamavam, batiam(...) Vinícius chegava a crises de risos(...)”. Aqui, conta o livro, Vinicius se enturmou com Jorge Amado, Dorival Caymmi, Carybé, João Ubaldo e Mãe Menininha do Gantois. Além, é claro, dos tropicalistas. “Caetano e Gil voltavam do exílio”, lembrou Sérgio Siqueira. Com essa trupe por aqui, “desequilibrou de vez a balança da artistagem no país. Esse deslocamento de eixo consolida a Bahia como ‘o lugar’ no país, nos anos 70”, contextualiza Luiz Afonso. Ou seria pura vertigem? Livro nasceu a partir de postagem no FacebookAnos 70 Bahia teve uma criação tão espontânea quanto aqueles anos dourados. “Começou em uma brincadeira. Postei fotos dos anos 70 no Facebook em dezembro de 2014. Veio uma enxurrada de fotos de outras pessoas. Coloquei textos e surgiram muitos outros textos. Uma receptividade incrível. Aí criei uma página específica. Pronto”, explica o produtor cultural Sérgio Siqueira, que assina a autoria do livro com o escritor Luiz Afonso. Mas, para Anos 70 Bahia virar realidade, foi preciso pedir ajuda aos amigos. Sem verba, até uma vaquinha on line foi feita. Foram arrecadados R$ 5 mil.

Com o projeto consolidado, a Fundação Pedro Calmon se tornou um dos apoiadores. Os depoimentos estão na íntegra, como foram postados no Facebook. “Um livro que trata dos anos 70 não pode ser censurado”, afirma. Algumas imagens que deveriam estar no livro é que não foram publicadas, como a imagem de Mick Jagger com sua família tocando violão em Arembepe - no livro está apenas uma  reprodução em desenho. “Ficamos com receio de algumas imagens por conta dos direitos autorais”, explica Sérgio Siqueira.      ServiçoLivro: Anos 70 BahiaOrganizadores: Sérgio Siqueira e pelo escritor Luiz AfonsoEditora: CorrupioPreço: R$ 40 (232 páginas)Lançamento: nesta terça (04/04), 17h30, no Póstudo, Rio Vermelho.