Receba por email.
Cadastre-se e receba grátis as principais notícias do Correio.
Victor Lahiri
Publicado em 29 de novembro de 2014 às 08:30
- Atualizado há 2 anos
Quando os tambores tocaram sob o sol de 10h de ontem, o olhar decidido e sério de Mãe Gilda, símbolo da luta contra a intolerância religiosa, ressurgiu em um busto em sua homenagem colocado às margens da Lagoa do Abaeté. A escultura, que até o momento da cerimônia estava coberta por um tecido branco, foi celebrada com grãos de milho branco, cânticos e mensagens que valorizavam o que a ialorixá buscou: paz e respeito.Foto: Marina Silva/ CORREIOAlém da presença de membros de religiões de matriz africana, representantes de outras doutrinas religiosas compareceram ao local reafirmando a intenção de fazer da obra um ponto de referência ecumênica.Gildásia dos Santos, a Mãe Gilda, fundou o Terreiro Ilê Abassá de Ogum em 1988, em Itapuã. Ao longo da vida, se destacou pelo ativismo social e busca de melhorias na área de Nova Brasília de Itapuã. Ela sofreu um grande golpe em setembro de 1999, quando sua imagem foi publicada na capa de um jornal evangélico que trazia a manchete: ‘Macumbeiros charlatões lesam o bolso e a vida de clientes’. Dois meses antes da publicação do jornal, o Ilê Abassá de Ogum havia sido invadido por membros de outra igreja evangélica.Em 21 de janeiro de 2000, um dia após assinar uma procuração para que advogados movessem uma causa judicial contra a agremiação religiosa que publicou a reportagem, Mãe Gilda sofreu um infarto e morreu. Foto: Marina Silva/ CORREIOA história de luta da ialorixá foi lembrada pelos presentes. “Mesmo vindo 14 anos depois que ela nos deixou, aos nossos olhos essa homenagem é uma forma de reforçar a mensagem de respeito entre as religiões”, afirmou Mãe Jaciara, filha de Mãe Gilda e atual ialorixá do Ilê Abassá de Ogum. Quem também expressou preocupação com o crescimento dos casos de intolerância religiosa foi o presidente da Fundação Gregório de Matos, Fernando Guerreiro. “Nos últimos anos, os casos de violência contra santuários voltaram a crescer, como aconteceu com a Pedra de Xangô que foi pichada e encontrada coberta de sal grosso”, disse Guerreiro. A celebração à memória de Mãe Gilda está dentro da programação do Novembro Negro. Mãe Jacira herdou o legado da ialorixá e, além de coordenar o terreiro fundado por Mãe Gilda, entrou com um processo judicial contra a igreja evangélica que promoveu a publicação e recebeu uma indenização de R$ 1,3 milhão em 2003. No evento, Mãe Jacira relembrou a história e deixou um relato emocionado. “Nos últimos dias de vida, quando ela decidiu processar a igreja, me disse: filha, eu não quero ser lembrada por aquela imagem”, relembrou.
Agora com o semblante tranquilo esculpido às margens do Abaeté, Mãe Gilda está imortalizada pelo busto de uma mulher forte que tem em seu semblante a determinação de lutar pelo seu povo.