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Mario Bitencourt
Publicado em 9 de novembro de 2017 às 00:01
- Atualizado há 2 anos
O grupo responsável por causar prejuízo de ao menos R$ 10 milhões em duas fazendas da empresa Igarashi, que teve diversos equipamentos destruídos no dia 2 deste mês, em Correntina, Extremo Oeste do estado, articula por meio das redes sociais uma grande manifestação para o próximo sábado (11).
A informação é do coordenador da Comissão Pastoral da Terra (CPT) na Bahia, Gilmar Santos, segundo o qual o ato ocorrerá na própria cidade de Correntina, em local e horário ainda não definidos. “A ideia é fazer um ato político para debater sobre o modelo de desenvolvimento imposto pelos governos à região Oeste”, afirmou.
De acordo com o coordenador da CPT-BA, braço da Igreja Católica, o problema na região não é específico contra grandes projetos de irrigação, como o que foi destruído nas fazendas da Igarashi, mas contra o avanço do agronegócio no campo no Oeste, atualmente uma das principais fronteiras agrícolas do Brasil.
Santos disse que o ato será pacífico e que está sendo articulado por diversos movimentos sociais que participaram da ação nas fazendas da Igarashi. A CPT-BA diz que a destruição da fazenda ocorreu em reação à falta de resposta a problemas graves de disputas territoriais e de água na região.
“Esses problemas vêm ocorrendo há décadas e sempre se discute isso com os governos, seja estadual ou federal, mas parece que para eles a única coisa que importa é o agronegócio, como se esse fosse o único modelo de desenvolvimento que serve para essa região; enquanto outras famílias tradicionais vivem sem apoio algum”, comentou.
O coordenador da CPT-BA disse que boa parte das terras hoje usadas por grandes empreendimentos agrícolas antes eram terras públicas usadas por comunidades de fechos de pasto – terras de uso coletivo. “Muitas dessas terras foram doadas de forma indiscriminada pelo estado e acabou gerando conflitos na região”, disse Santos.
Policiamento reforçado Devido à destruição de equipamentos nas fazendas da Igarashi, o policiamento na região de Correntina foi intensificado desde o final de semana passado pela Secretaria de Segurança Pública (SSP), a qual determinou que o caso na fazenda fosse investigado pela Polícia Civil e os responsáveis identificados e punidos.
Até esta terça-feira, 14 pessoas já tinham prestado depoimento sobre o ataque à fazenda Rio Claro. Nesta quarta, o delegado titular do município, Marcelo Calçado, informou que mais pessoas foram ouvidas, mas não soube precisar a quantidade.
Reunião sobre rio Nesta sexta (10), seis secretários estaduais devem participar de uma reunião com o prefeito de Correntina, Nilson José Rodrigues.
Segundo a Secretaria de Comunicação do Estado (Secom), o encontro tem como objetivo traçar um conjunto de ações visando à revitalização das nascentes do Rio Arrojado, de forma a encontrar soluções para o conflito envolvendo os ribeirinhos que utilizam o rio para as atividades de subsistência e as empresas agrícolas que captam a água para a irrigação das lavouras.
Fronteira agrícola A região Oeste vem se desenvolvendo na agropecuária brasileira, sobretudo na produção de grãos, desde os anos de 1970, tendo maior crescimento nas décadas de 1990 e 2000, com a chegada de grandes empresas agrícolas multinacionais. A soja é principal cultura da região, ocupando 58,8% dos 2,25 milhões de hectares plantados.
A área está inserida na região do Matopiba, projeto governamental de incentivo à produção agrícola nos estados do Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia, e onde estão localizados os últimos remanescentes de Cerrado no Brasil. A região do Matopiba é a principal fronteira agrícola brasileira.
Na região também estão os rios Carinhanha, Corrente e Grande, bem como suas nascentes, subafluentes e afluentes, principais contribuintes com as águas do rio São Francisco na Bahia, responsáveis por até 90% de suas águas no período seco.
A água desses rios abastece não só grandes projetos agrícolas como também pequenos produtores, como os que protestaram contra o projeto de irrigação da Igarashi, que possui a outorga da Secretaria Estadual do Meio Ambiente desde 2015 para irrigar 2.530 hectares com 180 mil metros cúbicos de água por dia.
Em novembro do ano passado, o Ministério Público da Bahia (MP-BA) recomendou que o Instituto de Meio Ambiente e Recursos Hídricos (Inema) não concedesse outorgas para grandes empreendimentos na bacia.
Ainda segundo o MP, como a recomendação não foi acatada, uma ação vinha sendo elaborada pelo órgão antes das invasões. “Já constatamos que tem empreendimentos que, com 12 bombas de captação de água ligadas por 12 minutos, reduzem o nível de água do rio em 15 centímetros”, afirma a promotora ambiental Luciana Jhoury. Segundo ela, não há informações e estudos suficientes que garantam a disponibilidade hídrica da região, bem como sua demanda para os múltiplos usos. “Não é possível continuar com a quantidade de captação de água na bacia do Corrente hoje”, complementou.
O Inema diz que regularizou a captação superficial no Rio Arrojado em janeiro de 2015 e que uma vistoria foi realizada na fazenda Rio Claro, pertencente à Igarashi, no dia 28 de maio deste ano, para averiguar a implantação do projeto de irrigação. Na época, a captação da água do Rio Arrojado para irrigação ainda não estava sendo feita.
De acordo com o último relatório sobre conflitos no campo da CPT, relativo a 2016 e divulgado em março deste ano, na região oeste da Bahia há conflitos por água na região ocorrem em Correntina, Campo Formoso, Barreiras e São Desidério, com quase 1.500 famílias afetadas diretamente pelo problema.
Na Bahia, 3.851 famílias estão em conflitos por água em 24 localidades e outras 16.934 passam por disputas de terra em 152 áreas, segundo o relatório da CPT.