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Força dos caminhões: 12% do faturamento das empresas são gastos com transporte

Estudo mostra que país dependerá das rodovias pelo menos até 2035

  • Foto do(a) author(a) Jorge Gauthier
  • Jorge Gauthier

Publicado em 22 de junho de 2018 às 09:46

 - Atualizado há 2 anos

. Crédito: Foto: Divulgação

Do mercadinho de dona Vera Lúcia Santos, em Cajazeiras, às grandes empresas do Polo Industrial de Camaçari passando pelos exportadores de soja do Oeste da Bahia, o custo de transportar cargas e mercadorias pesa no bolso nas empresas e reflete no do consumidor. Pelo menos 12,7% do faturamento das empresas brasileiras, em 2017, foram gastos com logística. O dado faz parte do Estudo Projeções para a Infraestrutura de Logística de Transportes do Brasil divulgado nesta quinta-feira (21) pela Fundação Dom Cabral (FDC), em São Paulo, durante o lançamento da Plataforma de Infraestrutura em Logística de Transportes da fundação.

Na prática isso significa que a cada R$100 que Vera Lúcia fatura R$12,70 vai para os custos de transporte, principalmente para os caminhoneiros que trazem seus produtos da região de Adustina e Irecê, ambas na Bahia. “Se for colocar na ponta do lápis nós trabalhamos para pagar contas e sobra muito pouco no final. Quando teve a greve dos caminhoneiros sentimos isso mais forte. Ficamos reféns dos produtos virem pela estrada e tive o maior prejuízo”, explica Vera que trabalha no ramo desde os anos 90.

A dependência do transporte rodoviário sentida por Vera tem reflexos ainda maiores para o Brasil. O pior: não há perspectivas que essa dependência seja reduzida. “Somos um país sobre rodas e, se não houver um plano nacional de investimento em infraestrutura isso vai continuar. Os 195,2 mil km de rodovias brasileiras respondem hoje pela maior parte do transporte de cargas no país (54% segundo o governo federal), seguidos por 26,4% de participação de rodovias, 16,5% de aquaviário e 3,1% de dutoviário. Isso faz com que haja uma grande dependência dos caminhões para o escoamento de cargas e gerar problemas no abastecimento como aconteceu na greve”, argumenta Paulo Resende , diretor da plataforma de infraestrutura em logística de transportes da fundação.

A expectativa, contudo, é que isso não melhore pelo menos até o ano de 2035. Segundo estudo da FDC mesmo se todas as obras previstas pelo governo federal (nessa primeira fase da plataforma não foram contemplados investimentos em outras esferas de governo) a dependência do  Brasil das estradas e consequentemente dos fretes de caminhoneiros ainda irá ser postergada.  Dentro desse panorama, segundo a FDC, o ideal seria que houvesse um percentual de 8% nos custos com o transporte de cargas. É como se dona Vera dos R$ 100 de faturamento apenas reservasse R$8 para o transporte. Contudo, esse percentual só deve crescer. Em 2015 o percentual era de 11, 73%. Em 2017 já passou para 12,37% e a tendência é só de alta. Somente entre 2015 e 2017 o Brasil gastou R$ 15 bilhões em logística por conta da dependência e das situação de conservação das rodovias. 

O estudo tomou como base a infraestrutura presente do Brasil em 2015 e fez projeções de como ela ficaria em 2025 e em 2035.  Mesmo com a inserção de novos projetos a partir de 2025, a exemplo de 4 ferrovias, a divisão modal vigente pouco se altera: a rodovia ainda concentrará cerca de 50% da produção de transporte, enquanto o uso da ferrovia chega a 30% em 2035.

“Obras como a Fiol (Ferrovia Oeste-Leste, que passa pela Bahia), do Porto de Ilhéus e tantas outras que estão previstas não darão conta de mudar a matriz de transportes do país. Nossa geografia favorece em muito a maior utilização de ferrovias e do aquaviário, devido às longas distâncias de transporte das cargas típicas destes modais. Por outro lado, os extensos percursos, majoritariamente por caminhão, exigem maior eficiência das rodovias”, explica Resende. 

Ou seja, mesmo que todas as atuais obras prometidas - ou que já estejam em execução- o país não tem uma alternativa a longo prazo para se tornar menos dependente dos caminhões. “Significa dizer que o Brasil ainda será um “país sobre rodas”, altamente dependente do caminhão caso não seja feito um grande investimento em infraestrutura”, defende Resende.

Caso sejam mantidas as perspectivas atuais o custo total de transporte (todos os modais) irá aumentar cerca de 40% até 2035, acredita a FDC.  Em 2015, o Brasil gastou R$ 166,36 milhões em transporte. A estimativa é que em 2025 esse valor passe para R$ 202,71 milhões e em 2035 para R$ 233,31. 

“Um caminhão no Brasil roda cerca de 1 mil quilômetros para levar uma carga. Nos Estados Unidos, que tem limitações geográficas que nós não temos essa distância é de um terço. A dependência das rodovias favorecem a esse cenário. O ideal será um modelo que intercalasse vários modais de transporte.  Estima-se que para cada 10% de carga rodoviária transferida para a ferrovia haveria uma economia de custo de 2,4% e paras as hidrovias de 4,5%”, esclarece Resende. 

Dependência O grupo Fragnani é o segundo maior produtor de pisos e revestimentos cerâmicos do Brasil, o terceiro maior da América Latina e o oitavo maior produtor mundial. Com mais de 47 anos de experiência, o grupo é  formado por três indústrias cerâmicas, a Tecnogres e a Incenor, instaladas em Dias d’Ávila (BA), e a empresa sede Incefra, localizada em Cordeirópolis (SP), e detém ainda a mineradora Água Branca. Nem essa capilaridade empresarial deixa o grupo menos vulnerável à dependência logística das rodovias.

“O principal problema que enfrentamos em relação à logística é em função de termos praticamente apenas a opção rodoviária no Brasil. Isso por si só já faz com que tenhamos um custo alto, pois não existe alternativas para o transporte dos produtos, deixando a logística restrita. Além disso, as condições das rodovias são um problema antigo. Em muitos trechos importantes no Nordeste, por exemplo, ainda temos faixa simples. Isso também afeta o custo e tempo de transporte. As mudanças recentes nos preços do frete também tiveram um impacto considerável no custo da logística.” Eduardo Cardoso, gestor comercial das marcas Incenor e Tecnogres do Grupo Fragnani.   A empresa Acqua Aroma, sediada em Lauro de Freitas, na Bahia,  distribui seus produtos para todo Brasil e também abastece sua distribuidora situada na Flórida nos Estados Unidos. “O peso do frete em nosso negócio é tão significativo que em 2018 elegemos como um dos nossos objetivos estratégicos a redução do custo de frete sobre vendas e sobre compras. Esse passou a ser um grande desafio para a equipe de logística da Acqua Aroma, pois com a dependência do modal rodoviário (92%), a precariedade das rodovias brasileiras pontuado pelos nossos parceiros logísticos e o aumento do preço dos combustíveis, refletiram em reajustes das tabelas de frete que chegaram até 21%. Nossos maiores percentuais de frete estão concentrados nas regiões Sul e Centro-Oeste onde no final o custo logístico varia entre 8% e 15% do custo do produto”, esclarece Enny Carvalho, gerente Industrial da Acqua Aroma.    Empresa de Lauro de Freitas, Acqua Aroma tem problemas com o preço dos fretes  Foto: Divulgação O tabelamento do frete - que está em discussão desde a greve dos caminhoneiros - é outro ponto que pode potencializar os custos logísticos. “Em nenhum país que nós pesquisamos há um tabelamento do preço do frete. Isso vai contra a todas as regras de mercado e da lei da oferta e da procura. Certamente isso terá impacto para o consumidor final”, defende Resende. 

O estudo da FDC ainda não consegue dimensionar quanto do peso da logística vai para o consumidor final especialmente pela dependência do sistema rodoviário para o transporte de produtos. “

Algumas empresas com a atuação da Bahia, a exemplo da Assaí Atacadista, tentam driblar as questões do frete com a venda direta para o fornecedor. “No Assaí recebemos praticamente toda a mercadoria que vendemos direto do fornecedor, o que nos traz um impacto pequeno de custo logístico e consequentemente podemos praticar preços competitivos e adequados aos nossos clientes". Sandro Oliveira, Diretor Regional de Operações do Assaí Atacadista. 

Investimentos  Investimentos da iniciativa privada atrelados a aportes dos governos estaduais é a saída para a questão de infraestrutura, segundo Raul Velloso, consultor econômico e ex-secretário de Assuntos Econômicos do Ministério do Planejamento. “A única saída para o Brasil voltar a crescer é investir em infraestrutura. Isso precisa ser encarado como investimento e não como despesa. Os governos estaduais precisam investir nesse aspecto para que o país possa crescer. 

Para Resende, o Brasil requer um planejamento de longo prazo com projetos robustos. "Os planos devem combinar a melhoria da eficiência rodoviária com a reestruturação planejada da atual matriz multimodal de transporte. É preciso ter uma parceria favorável para investimentos públicos e privados nos transportes", pontua. 

Além de novos investimentos e projetos de infraestrutura, a FDC acredita que é preciso ter uma manutenção ampla e de revitalização das atuais rodovias. “Mesmo que as novas obras e projetos sejam feitos pelo menos metade das rodovias atuais terão condições péssimas até 2035”, afirma Resende. 

Saída é atrair o setor privado para investir, diz César Borges  “O poder público executivo não tem margem fiscal para fazer investimentos tanto no governo federal quanto nos estados que passam por situação difícil. A saída é você atrair o setor privado para investir nos grandes eixos e nos grandes projetos” . Isso é o que defende César Borges, ex-governador da Bahia, ministro dos Transportes e secretário Nacional dos Portos que atualmente preside a Associação Brasileira de Concessionárias de Rodovias (ABCR).

Para Borges é preciso tornar as estradas brasileiras atrativas para que o setor privado possa investir. “Não é qualquer estrada que pode ser feita uma concessão de sucesso. É preciso ter demanda de tráfego. Mas, se você tem eixos de escoamento é preciso ter projetos que atraiam o interesse do setor privado em investir. Aqui no Brasil tem muita gente que é contra o setor privado, que só pensa no pagamento do pedágio. Até as entidades como Tribunal de Contas da União acham que tudo tem que ser estatal. Eu espero que a gente deixe de pensar em legalismos e se pense na nação e nos seus desenvolvimentos. Os capitais - tanto estrangeiros quanto nacionais - estão disponíveis, mas é preciso ter segurança para investir”, afirma. 

Plataforma gratuita para consultar sobre a infraestrutura de transportes A Fundação Dom Cabral (FDC) disponibiliza nesta sexta-feira (22), de forma gratuita, através do seu site o acesso à  Plataforma de Infraestrutura em Logística de Transportes (PILT). A plataforma, que está sendo desenvolvida há um ano tem o objetivo de unir diferentes bancos de dados sobre infraestrutura e logística.

A ação é uma iniciativa do Núcleo de Logística Supply Chain e Infraestrutura da FDC e contém dados de empresas como Agência Nacional de Transportes Terrestres (Antt) e Ministério dos Transportes e contou com apoio financeiro de empresas como a CCR, EcoRodovias e Queiroz Galvão Infraestrutura. “Precisamos discutir com o poder público as demandas do país. Temos que pensar a longo prazo a infraestrutura do país”, afirmou Paulo Emílio, vice-presidente da FDC. 

*o jornalista viajou à convite da Fundação Dom Cabral