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Rede Nordeste, JC
Publicado em 4 de junho de 2020 às 07:15
- Atualizado há 2 anos
(Foto: Day Santos/TV Jornal) O garoto Miguel Otávio Santana da Silva, 5 anos, morreu após cair do 9º andar do Condomínio Píer Maurício de Nassau, um dos imóveis do conjunto conhecido como "Torres Gêmeas", no bairro de São José, área central do Recife. A proprietária do apartamento onde estava o menino foi parcialmente responsabilizada pela morte da criança. A moradora, que era empregadora da mãe do garoto e teve a identificação preservada pela Polícia Civil de Pernambuco, foi autuada em flagrante nesta quarta-feira (3/6) pelo crime de homicídio culposo (sem intenção). Como previsto em lei, pagou fiança - determinada pelo delegado em R$ 20 mil - e foi liberada para aguardar a conclusão do inquérito em liberdade. As primeiras investigações apontaram que a mulher teria permitido que o garoto subisse sozinho no elevador antes de cair do 9º andar - uma altura de 35 metros.>
Os detalhes das etapas iniciais da investigação foram detalhados em videocoletiva de imprensa com o delegado que está à frente do caso, Ramón Teixeira, titular da Delegacia Seccional de Santo Amaro. Imagens das câmeras do circuito interno de TV do condomínio foram a principal prova da “negligência” - como a polícia definiu - da mulher no episódio. Já está totalmente descartado, entretanto, qualquer relação da moradora com a queda da criança - o que provocou a sua morte antes mesmo de chegar ao Hospital da Restauração (HR), para onde foi socorrida. As imagens mostram que Miguel tentou entrar no elevador em busca da mãe - a empregada doméstica Mirtes Renata Santana da Silva, que passeava com o cachorro dos patrões na rua - uma primeira vez, sendo detido pela mulher. Numa segunda tentativa, após a criança apertar no interruptor de vários andares, a moradora - provavelmente irritada com a insistência do garoto em sair do apartamento à procura da mãe - o deixa seguir no elevador, apenas observando a porta do equipamento se fechar. Há imagens, inclusive, que mostram o momento em que a proprietária aperta o interruptor de um andar superior ao 5°, onde ela residia, e deixa o menino seguir. O delegado confirmou o ato, mas disse que a Polícia Civil também não iria disponibilizar a imagem para a imprensa.>
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Mesmo assim, o delegado não identificou sequer o dolo eventual - quando a pessoa, mesmo sem querer aquele resultado, colabora de alguma forma para que ele aconteça. "Não houve sequer o dolo eventual. Em nenhum momento identificamos essa intenção. Houve apenas a negligência de, na segunda tentativa da criança em fugir pelo elevador, deixar que ela seguisse. Ela apenas permitiu que a criança ficasse só no elevador, sem querer, de forma alguma, contribuir para a morte. Por isso a definição por homicídio culposo, com a exigência de fiança”, explicou o delegado.>
Essa percepção do crime pela Polícia Civil foi reforçada pelo fato de que a queda da criança foi acidental - fato comprovado pelas perícias criminais realizadas e pelos depoimentos de testemunhas obtidos até agora. Segundo o delegado Ramón Teixeira, foi um acidente, uma tragédia, sem a participação de uma segunda pessoa além do garoto. “Isso ficou comprovado pelo excelente trabalho do perito criminal André Amaral. Do momento em que o garoto entra no elevador até a queda está tudo muito claro. Toda a dinâmica do que aconteceu foi esclarecida pelas perícias. A dúvida que estava no ar era como a criança tinha chegado ao elevador sozinha, o que foi esclarecido com as imagens das câmeras no corredor dos apartamentos”, explicou.>
Reação da família Apesar da certeza da polícia, no velório de Miguel Otávio Santana da Silva, realizado em Santo Amaro, área central do Recife, familiares questionaram a negligência das pessoas que ficaram responsáveis pelo garoto enquanto a mãe trabalhava. A tia da criança Lourdes Cristina, irmã da mãe de Miguel, questionou o fato de dois adultos, a moradora e a manicure, não conseguirem cuidar de uma criança. Segundo ela, o menino começou a chorar e a patroa não chamou a mãe dele de volta. “Miguel não costumava ir para o trabalho da mãe, mas como estava sem a creche devido à pandemia, insistiu para ir com ela. Ficou brincando a manhã inteira, mas quando a patroa pediu para Mirtes descer com o cachorro, ele ficou chorando. Só que, no lugar de chamar minha irmã de volta, ela deixou ele descer e, infelizmente, aconteceu o que aconteceu. A gente fica sem entender como é que, tem dois seres humanos adultos numa casa e não olhar uma criança?”, indagou em entrevista à TV Globo.>
Entenda como aconteceu o acidente: 1) O garoto de 5 anos é deixado pela mãe no apartamento, no 5º andar, com a patroa e uma manicure. Ela desce para passear com o cachorro da patroa 2) O garoto quer ir em busca da mãe e tenta entrar no elevador, mas é contido pela proprietária do apartamento 3) O garoto tenta escapar novamente e, após ele apertar o interruptor de vários andares, a moradora o deixa seguir no elevador. Há imagens que mostram a proprietária apertando o interruptor de um andar superior ao 5° 4) O garoto, já dentro do elevador, segue sozinho até o sétimo andar. A porta abre, mas ele não desce 5) No nono andar, decide sair e caminha pelo corredor até uma janela. Escala a janela e cai na área onde ficam os exaustores dos ar-condicionados dos apartamentos 6) Em busca da mãe, a criança sobe no parapeito de alumínio, que não suporta o peso e quebra, fazendo com ela seja lançada a uma altura de 35 metros>
O delegado Ramón Teixeira não nega que a responsabilidade legal pela criança naquele momento era da proprietária do apartamento, mas entende que isso não é suficiente para classificar como um homicídio com dolo eventual. E admite que o envolvimento da moradora só começou a ser investigado porque parentes afirmaram que a mãe da criança tinha deixado o filho aos cuidados da patroa e de uma manicure antes de descer para passear com o cachorro. "Foi por isso que resolvemos investigar os passos do garoto até o momento em que ele entra no elevador, chegando à responsabilidade da moradora", disse. >
O acidente Na videocoletiva para a imprensa a Polícia Civil explicou que o garoto, já dentro do elevador, seguiu sozinho até o sétimo andar. A porta abriu, mas ele não desceu. No nono andar, decidiu sair. Tudo comprovado por imagens do circuito de TV do condomínio. “A perícia detalha que a criança sai do elevador de serviço e caminha pelo corredor até uma janela. Consegue passar pela janela, escalando uma altura de 1,2 metro, e cai na área onde ficam os exaustores dos equipamentos de ar-condicionado dos apartamentos daquele andar. Acredita-se que, lá de cima, ele possa ter visto a mãe passeando com o cachorro na rua. Então sobe no parapeito de alumínio, que não suporta o peso e quebra, fazendo com o garoto seja lançado a uma altura de 35 metros”, detalhou o delegado na videocoletiva.>
A proprietária vai responder em liberdade pelo Artigo 13 do Código Penal, parágrafo 2º, alíneas b e c. O corpo de Miguel foi enterrado nesta quarta (3) em Bonança, distrito do município de Moreno, na Região Metropolitana do Recife.>
Veja o que diz o artigo 13 do Código Penal:>
Art. 13. O resultado, de que depende a existência do crime, somente é imputável a quem lhe deu causa. Considera-se causa a ação ou omissão sem a qual o resultado não teria ocorrido. § 2º - A omissão é penalmente relevante quando o omitente devia e podia agir para evitar o resultado. b) de outra forma, assumiu a responsabilidade de impedir o resultado. c) com seu comportamento anterior, criou o risco da ocorrência do resultado.>
* O nome da suspeita não foi divulgado pela Polícia Civil em cumprimento da Lei de Abuso de Autoridade nº 13.869/2019, que, entre outros pontos, proíbe a divulgação de imagens e nomes por parte dos policiais e servidores públicos membros dos Poderes Legislativo, Executivo, Judiciário e do Ministério Público. A pena é de até quatro anos de prisão, caso a autoridade descumpra a legislação.>
As informações são do Jornal do Commercio>