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Da Redação
Publicado em 24 de março de 2022 às 09:44
Pelo menos três testemunhas deixaram de prestar depoimento nos desdobramentos da apuração dos fatos quanto à operação policial que vitimou três jovens na madrugada do dia 1 de março no bairro da Gamboa, A informação foi coletada pela Defensoria Pública do Estado da Bahia (DPE/BA) com representantes da comunidade e Ongs. Na quarta-feira (16), foram encerradas as oitivas do processo do inquérito policial militar. Todos os depoimentos foram acompanhados pela DPE/BA.>
Uma das depoentes foi Silvana Santos, mãe de Alexandre Santos, 20 anos, um dos mortos na operação. Ela relata que chegou a ver Alexandre vivo antes dos policiais envolvidos a expulsarem da cena do crime. Em seguida, houve disparos de tiros e depois os corpos dos jovens foram removidos para outro local.>
“Me sinto um pouco mais segura com o acompanhamento que a Defensoria e algumas entidades estão mostrando comigo e com o caso, mas sigo com receio e assustada, até porque estou denunciando tudo isso. Minha filha de 18 anos não consegue sair de casa com medo e está recebendo acompanhamento psicológico. A gente se sente com medo, porque eles são polícia e nós não somos nada para eles” disse Silvana, que manifestou pouca expectativa quanto à responsabilização penal dos policiais.>
A defensora pública e coordenadora da Especializada de Direitos Humanos, Eva Rodrigues, explica que desde que tomou conhecimento do ocorrido, a Defensoria tem se esforçado para amparar os familiares dos jovens, atendendo demandas socioassistenciais e psicossociais das famílias, a exemplo da matrícula escolar de um dos outros filhos de Silvana dos Santos, mãe de Alexandre Santos dos Reis, 20 anos, um dos mortos na operação.>
“O ajuizamento da ação penal é exclusivo do Ministério Público, a quem compete também a realização do controle externo da Polícia. Neste momento, nos cabe, como estamos fazendo, amparar os familiares, acompanhar os depoimentos, encaminhando as eventuais necessidades. Além disso, já solicitamos acesso ao inquérito e formalizaremos pedido de disponibilização dos laudos de exames cadavéricos. Uma vez reunidos os elementos necessários, vamos ajuizar as demandas indenizatórias das famílias”, explicou Eva Rodrigues.>
As testemunhas foram escutadas na sede da Secretaria Estadual de Segurança Pública, por determinação do secretário Ricardo Mandarino, que designou também um delegado para estar a cargo exclusivo do processo. Foram cinco pessoas escutadas, entre familiares das vítimas e observadores oculares da ocorrência. >
De acordo com Wagner Moreira, representante da ONG IDEAS – Assessoria Popular, que tem articulado iniciativas junto à comunidade da Gamboa para promover agendas que garantam a elucidação do caso e a punição dos responsáveis, foram ao menos dois episódios de ameaças evidentes.>
“O primeiro incidente foi no próprio dia do ocorrido quando os policiais voltaram com o departamento técnico para perícia no local e intimidaram os moradores que presenciaram o ocorrido com gestos simulados de degola. O segundo veio dias depois com um carro à paisana que disparou tiros para cima e falas que provocaram a comunidade como ‘quero ver agora se vocês vão chamar a mídia’, entre outros”, explicou Wagner Moreira.>
Segundo Ana Caminha, presidente da Associação de Moradores da Gamboa, o clima na área segue de grande consternação. “A comunidade passou por um período de luto que fez com que mesmo bares não estivessem em atividade. Há ainda muito pesar e um grande sentimento de injustiça com tudo que ocorreu. Além disso, há muita tensão também. Foi uma intervenção muito incomum aqui”, disse.>
Acordos de reunião com a SSP Em reunião no dia 8 de março, que também contou com a presença e acompanhamento da Defensoria, o secretário de Segurança Pública, Ricardo Mandarino, e a secretaria Estadual de Promoção da Igualdade Racial (Sepromi), Fabya Reis, receberam moradores da comunidade da Gamboa.>
No encontro, que também contou com a presença da IDEAS, do Coletivo de Entidades Negras, do Conselho de Desenvolvimento da Comunidade Negra, entre outras entidades, a Secretaria de Segurança Pública assumiu alguns compromissos com a comunidade da Gamboa e com o combate ao racismo e à defesa dos direitos humanos.>
Além da designação de delegado para acompanhar as investigações, ficou acertado com a SSP: a retirada da base móvel da Polícia Militar da comunidade da Gamboa, conforme solicitaram os moradores e já foi implementado; a divulgação de dados sobre letalidade policial nos boletins diários da SSP; a realização de reuniões trimestrais com diversas entidades do movimento negro para discussões sobre propostas de política de segurança pública antirracista no estado; e a divulgação de balanço sobre a Instrução Normativa 01/2019 que dispõe que dispõe sobre a investigação de crimes dolosos contra a vida cometidos por policiais militares contra civis.>
Fluxo de atendimento Em uma outra frente de atuação, a coordenação da Especialização de Direitos Humanos da DPE/BA também tem dialogado com a Secretaria Municipal de Promoção Social e Combate à Pobreza – Sempre com o objetivo de construir um fluxo especial de atendimento a familiares de vítimas de violência estatal, tendo em vista ao que ocorreu na Gamboa. A iniciativa criará um fluxo diferenciado no atendimento para acesso, cadastro e recebimento de benefícios socioassistenciais no âmbito municipal.>