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Com cocar e beca, primeira defensora pública indígena da Bahia toma posse

‘Estou aqui para abrir portas para os que virão’, destacou Aléssia Santos, da etnia Tuxá

  • D
  • Da Redação

Publicado em 21 de junho de 2022 às 05:00

. Crédito: Ana Lucia Albuquerque/ CORREIO

A Defensoria Pública escreve um novo capítulo na história, e o título carrega o nome de Aléssia Pamela Bertuleza Santos, a primeira mulher indígena a se tornar defensora pública no estado da Bahia.

“Adentrar essas portas como um membro e não ser mais uma vítima da violação dos direitos é algo que alimenta as chamas da esperança de que chegou o tempo anunciado por Bethânia: ‘de reparar na balança de nobre cobre que o rei equilibra’”, anunciou ela, nessa segunda-feira (20), ao tomar posse do cargo, durante uma cerimônia realizada no auditório do Tribunal Regional Eleitoral da Bahia (TRE). 

Ela foi uma das três oradoras da turma de empossados deste ano. Durante o seu discurso, lembrou à plateia que, antes de ser Brasil, o país era aldeia e, por isso, agradecia a todos os indígenas que lutaram, para que ela pudesse se tornar defensora e ser parte do grupo que abre portas para outros povos.“A nossa história não começou em 1988. Esse chão, tão fértil, manchado de sangue indígena, antes de ser Brasil, era aldeia. A minha parte é para que a honra de ocupar este microfone possa ser ampliada para mais indígenas, porque eu sou a primeira, mas logo não serei a única”, projetou Aléssia.Outros 20 defensores estaduais tomaram posse (veja lista abaixo). A ouvidora-geral da Defensoria Pública da Bahia (DPE), Sirlene Assis, parabenizou a todos e desejou boas vindas à primeira integrante indígena da instituição.

A decisão que possibilita que mais mulheres e homens como Aléssia e outras minorias sejam defensores públicos foi estabelecida em 2018, pela Defensoria, a partir da operação da Lei Orgânica da Carreira e da inclusão da reserva de vagas para indígenas no concurso da instituição. Esse foi o primeiro processo após o fato.

Perfil Aléssia é natural da cidade de Glória, na região norte da Bahia, e faz parte da comunidade Tuxá, situada no município de Rodelas. Antes de passar no concurso de defensora pública, ela foi a primeira da família a ter nível superior e a primeira cotista indígena a se formar no curso de Direito da Universidade Estadual de Feira de Santana (Uefs). 

Depois da faculdade, ela cursou mestrado em Direito Público, na Universidade Federal da Bahia (Ufba), e foi professora de direito internacional e direito tributário no Centro Universitário do Rio São Francisco.

“Tenho meu histórico de vida todo em escola pública, também sou fruto das políticas afirmativas de reparações históricas das universidades públicas e me orgulho muito disso. Foi o que me fez mestra e professora”, contou.   

O desejo de seguir carreira no Direito nasceu a partir das histórias que ouvia de parentes sobre as situações que sua comunidade passou durante a construção da barragem de Itaparica, administrada pela Companhia Hidrelétrica do São Francisco (Chesf), na década de 1990.

“Eles viviam falando sobre o processo contra a empresa, mas eu não entendia o que acontecia. Quando eu cresci, percebi que eles também não entendiam e isso prejudicou meu povo. Por isso, eu quis entender como aquilo funcionava para saber lidar com os próximos casos”, lembrou. 

Já a Defensoria Pública surgiu no seu plano de carreira quando ela estagiou no local. “Quando me formei, retornei à Defensoria e a cada contato se intensificava, eu achava que aqui era mais o meu lugar”, disse, justificando que “é a instituição responsável pelos vulneráveis. Era onde os meus seriam atendidos caso precisassem de acesso à justiça”.

O papel da Defensoria Pública é prestar assistência jurídica gratuita àqueles que não podem pagar por ela, como é o caso dos indígenas. Nesse quesito, de acordo com Sirlene, ainda há um agravante: o desmonte da Fundação Nacional Indígena (Funai).“Quem vai defender esses povos indígenas? Ainda mais nesta conjuntura política em que a Funai está sendo desmontada e, por consequência, o mesmo acontece com a sua atribuição de defesa dos povos indígenas”, apontou a ouvidora-geral. Ao todo, 21 novos profissionais fazem parte da Defensoria Pública da Bahia (Foto: Divulgação Ascom/ DPE) As demandas indígenas são muitas e antigas: defesa do direito ao território, valorização do professor indígena, direito à educação, proteção contra as ameaças recebidas pelos membros das comunidades, acesso à água e à saúde pública.

“Ter Aléssia dentro da estrutura da Defensoria é garantir um modelo de transformação institucional que a gente precisa, porque a estrutura da DPE não é diferente do estado, também é segregadora, por isso, tem buscado ser cada dia menos antirracista e participativa”, explica Sirlene. 

“Eu fico muito honrada, mas, acima de tudo, eu sei da responsabilidade, porque além do aspecto representativo, eu sei que estou aqui para abrir portas para os que virão”, destacou a nova defensora.

Confira abaixo o nome dos outros 20 defensores e defensoras estaduais que tomaram posse:

Barbara Maria Martins Ribeiro Beatriz Correa Soares Bibiana Gava Toscano De Oliveira Danilo Mattos Fernandes Ethiene Vanila De Souza Wenceslau Gabriel Lucas Moura De Souza Gabriel Salgado Lacerda Medeiros Gabriela Lima Andrade Gisela Baer De Albuquerque Henrique Frasca Grillo Inez Dutra Viegas Isabela Labre Moniz De Aragao Faria Janaina Dos Santos Araujo Jessika Perondi De Santis Jose Carlos Teixeira Costa Junior Lorena Lima De Patricio Ribeiro Luiz Carlos Azevedo Dos Santos Maria Magalhaes Rocha Rebeca Maria Borges Abrunhosa William Oliveira Taveira  

*Com orientação da subchefe de reportagem Monique Lôbo