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Bruno Wendel
Publicado em 13 de agosto de 2015 às 06:10
- Atualizado há 2 anos
Fazia sol ontem de manhã e o comerciante Jurandy Silva de Santana, 41 anos, aproveitou para lavar o carro no bairro de Santa Mônica. Foi quando recebeu uma ligação da nora, Jamille Santos, contando que o companheiro dela, Geovane Mascarenhas de Santana, 22, filho mais velho do comerciante, havia sido abordado por policiais na Calçada.
A cena real aconteceu há um ano. Ontem, Jurandy reviveu tudo, mas dirigido por um cineasta. A rua parou para ver a cena, que vai fazer parte de um documentário sobre o Caso Geovane, revelado pelo CORREIO, com exclusividade, há exatamente um ano.
A história do rapaz que depois de uma abordagem da Rondesp, na Calçada, foi colocado na viatura, executado, esquartejado e queimado chamou a atenção do cineasta francês Bernard Attal, já premiado em festivais internacionais com o longa A Coleção Invisível. O documentário, ainda sem nome, deve ser lançado no ano que vem.
No ano passado, já acompanhando o caso pelas páginas do CORREIO, o cineasta francês foi ao sepultamento de Geovane, no município de Serra Preta, no Centro-Norte da Bahia. “Eu fiquei triste de observar que só acompanharam o enterro amigos e membros da família de Jurandy, além dos representantes da imprensa, e que quase nenhum formador de opinião, nenhuma personalidade política, nenhum intelectual ou artista achou pertinente estar presente”, avaliou o diretor.
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Ontem, 353 dias depois de o corpo de Geovane ter sido enterrado, Jurandy, que investigou por conta própria o sumiço do filho, encenou o dia que soube do sumiço de Geovane.
Durante as filmagens, Jurandy teve momentos de descontração. Mas, na maior parte do tempo, manteve um semblante compenetrado e até sofrido. Ele ainda não sabe se vai querer ver o filme pronto. “Está sendo muito difícil pra mim, porém estou tendo muito apoio da equipe da produção para estar aqui. Estou firme e forte. Não imaginava que fosse ter essa proporção toda”, confessou.Jurandy, pai de Geovane, é personagem central. Ele apurou sozinho o sumiço do filho(Foto: Evandro Veiga)História As filmagens começaram na semana passada, com entrevistas gravadas em estúdio com familiares e ativistas de direitos humanos. No último domingo, a equipe de Attal foi à localidade de Descanso, em Serra Preta, onde Geovane foi enterrado.Ontem, depois de reconstituir a ligação da nora, as filmagens encenaram a ida de Jurandy até o local da abordagem, na Rua Leão III, na Calçada. A filmagem aconteceu às 16h, mesmo horário em que Jurandy chegou ao local, há um ano.
Foi lá que ele obteve as imagens que mostram que Geovane foi abordado pelos PMs e levado na viatura, no dia 2 de agosto. O filme vai mostrar Jurandy observando as casas, até ver a câmera que registrou tudo.Jurandy lembrou que o dono do imóvel prometeu mostrar as imagens, mas não o fez imediatamente. “Na época, fiquei com medo de ele desistir. Dormia e acordava pensando se ele ia voltar atrás”, disse.
A equipe também foi a uma lan house na Rua Elísio, Santa Mônica. Foi lá que, já com as imagens gravadas no celular, Jurandy as colocou em um pen-drive e começou a busca pelas delegacias da cidade.
Para as filmagens feitas ontem, Jurandy procurou usar as mesmas roupas que vestia quando procurava pelo filho. As roupas usadas na busca só foram substituídas, em alguns momentos, por camisas e bermudas que pertenciam a Geovane.
Segundo o diretor, a primeira fase de gravações já está na reta final e há horas de gravação suficientes para um longa-metragem. Mas Bernard ainda quer falar com governo do estado, Judiciário e Ministério Público. Até agora, eles se recusaram a dar entrevistas ao cineasta.Como diretor Bernard Attal na frente, equipe de filmagens percorre a Santa Mônica(Foto: Evandro Veiga)Denunciados por sequestro, roubo e homicídio, PMs seguem na ativaUm ano após o sumiço de Geovane ter sido noticiado pelo CORREIO, os 11 PMs denunciados por sequestro, roubo (a moto e o celular de Geovane não foram encontrados) e homicídio qualificado continuam trabalhando. Segundo a PM, eles desempenham funções administrativas e respondem a Processo Administrativo Disciplinar. São eles: o subtenente Cláudio Bonfim Borges, os sargentos Gilson Santos Dias e Daniel Pereira de Souza Santos e os soldados Jesimiel da Silva Resende, Jailson Gomes Oliveira, Cláudio César Souza Nobre, Fábio Nobre Lima Masavit Cardozo, Jocenilton Santos Ferreira, Roberto Santos de Oliveira, Alan Moraes Galiza dos Santos e Alex Santos Caetano.
Seis deles também responderão por ocultação de cadáver. O inquérito da Polícia Civil os denunciava ainda por tortura e formação de quadrilha, o que foi excluído da denúncia pela promotora Isabel Adelaide. A juíza do caso, Gelzi Maria Almeida Souza, disse que não pode falar, pois o caso corre em segredo de Justiça. O processo, que já havia sido consultado pelo CORREIO, não foi mais localizado no site do Tribunal de Justiça da Bahia. A juíza disse, por meio da assessoria, que ele segue regularmente e que ainda não foi digitalizado.