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Mario Bitencourt
Publicado em 22 de janeiro de 2020 às 20:07
- Atualizado há 2 anos
(Foto: Acervo pessoal) João Pedro Silva Bonfim é um baiano único – literalmente. No estado, somente ele conseguiu obter nota 1000 na prova de redação do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) de 2019 – no resto do país, apenas outros 52 estudantes obtiveram essa nota.
Redação nota 1000 do Enem na Bahia cita Globo, Chaplin e nazismo; LEIA NA ÍNTEGRA
O exame, realizado pelo Ministério da Educação, é utilizado para ingresso em diversas universidades públicas e particulares do Brasil. Na Bahia, no ano passado, foram 395.437 inscritos, e no Brasil – incluindo números do estado – mais de 5 milhões fizeram a prova.
Morador de Vitória da Conquista, sudoeste do estado, o jovem de 19 anos é um amante das letras, sobretudo da gramática, e sonha em ser médico. Por isso, sua vida tem sido dedicada aos estudos, com maior foco na Redação e nas Ciências Naturais.
No Enem, a nota da média geral de João Pedro foi de 755, que pode subir ou diminuir na busca por uma vaga em curso de Medicina em instituições de todo o país, já que o peso das notas varia de acordo com os critérios utilizados por cada instituição de ensino.
“Estou esperançoso de conseguir uma vaga, mas vai depender desses critérios”, comentou João Pedro, que no momento está focado nas provas do vestibular da Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia (Uesb), nos próximos dias 2 e 3 de fevereiro.
João Pedro possui um ritmo de estudos intenso e dedica a maior parte do tempo aos assuntos de Redação, Biologia, Química e Física – as outras disciplinas, sobretudo de Ciências Humanas, consegue absorver com mais facilidade, mesmo sem tanto empenho.
A dedicação às disciplinas que gosta é tanta, que ele resolveu fazer cursos específicos. Por isso, conseguir a nota máxima na Redação foi consequência de muita pesquisa sobre atualidades e assuntos variados.
João Pedro também teve boa formação dos ensinos Fundamental e Médio, ambos cursados no Colégio Sacramentinas - um dos mais conceituados da rede privada de Vitória da Conquista.“Com o curso de redação, onde fiquei de fevereiro a dezembro, fiz textos uma vez por semana e, antes disso, fazia pesquisas variadas sobre o tema, com opiniões às vezes até contrárias, de modo que me favorecia a uma compreensão melhor”, contou.Mas nada de exagero: “Faço no máximo uma redação por semana. Tem gente que faz de três a quatro, não acho que dá certo. Prefiro focar na qualidade que na quantidade de redações. Melhor pesquisar mais sobre o tema e, depois, escrever”.
No Enem de 2019, o tema da Redação foi “Democratização do acesso ao cinema no Brasil”, com trechos de textos de apoio, como do artigo “O que é cinema”, de Jean-Claude Bernardet; do texto “O filme e a representação do real”, de C.F.Gutfreind; e ainda do infográfico do periódico “Meio e a Mensagem” sobre o percentual de brasileiros que frequentam salas de cinema, e trecho do texto “Cinema perto de você”, da Agência Nacional de Cinema (Ancine).
Na Redação, cujo rascunho foi cedido com exclusividade ao CORREIO, João Pedro fez uma abordagem histórica do surgimento do cinema como entretenimento e arte, e destacou que, com o passar dos anos, virou também uma importante plataforma para disseminar informações e formar opinião. (Clique na imagem para ampliar) Rascunho da prova de João Pedro (Foto: Acervo pessoal) “Portanto, em vista da grande relevância que essa arte possui, o governo brasileiro e os shoppings, locais onde os filmes, em sua maioria, são exibidos, em parceria, devem fornecer, universal e democraticamente, cinema aos brasileiros”, escreveu João Pedro.
Para o estudante, as salas de cinema precisam ter seus ingressos parcialmente custeados pelo governo, “de modo a baratear o acesso dos mais pobres às obras cinematográficas” e, assim, democratizar o contato com os filmes.
Essa foi a quarta vez que João Pedro realizou a prova do Enem – nas duas primeiras, ele não se inscrever em nenhum curso de graduação. E foi a segunda vez que se destacou em Redação, já que no ano passado ele teve nota 980.
Pelas regras do Enem, quando isso ocorre, é porque um dos dois corretores da Redação deu nota 1000 e outro 960; na média acaba ficando com nota final 980.
Amor pelas letras O gosto de João Pedro pelas letras começou quando ele estava no 8º ano e participou de uma competição escolar em equipe. À época, ele ficou responsável por estudar a disciplina Língua Portuguesa, daí em diante sua dedicação aumentou.
Até então, João Pedro pensava em seguir a carreira de astronauta, um sonho de infância, mas com o amadurecimento decidiu que quer ser Médico, para alegria da sua mãe, Elíude Bonfim, uma assistente social de 52 anos.
“Não foi nada forçado, conversamos sobre as oportunidades de cursos, mercado de trabalho, universidade, e decidimos em consenso que eu iria estudar Medicina, de preferência no campus da Uesb de Vitória da Conquista”, disse o jovem.
Em casa, João Pedro é motivo de alegria para a família. “Desde cedo ele sempre teve muita maturidade com os estudos, sobretudo depois que passou para o 6º ano. A gente nunca teve de ficar em cima para ele estudar”, disse o pai, Antônio Neto Lima Bonfim, 54, professor de Geografia de escolas da rede pública e privada em Vitória da Conquista.
“Ele sempre está ligado nas atualidades, assiste a vídeos sobre realidade virtual, vê noticiários em inglês. Isso faz com que ele tenha um conhecimento de mundo. E ainda tem as pesquisas que ele faz em casa. Meu filho está sempre buscando inovações, e faz Redações com muito esmero”, comentou Lima.
Professor de Redação e dono do curso “Ao Pé da Letra”, Vanderli Marques da Silva, 45, conhecido como Bitty, disse que o apreço de João Pedro pelas letras – bem como pela norma culta da Língua Portuguesa – é um ponto forte.
“Depois que o Enem deixou de cobrar de forma mais incisiva a prova de Língua Portuguesa e a norma culta, muitas pessoas deixaram de se preparar mais para o assunto. Ao contrário de João, que busca fazer a redação com a gramática impecável, e isso é muito importante não só para o Enem, como para toda a vida”, observou.