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Carolina Cerqueira
Publicado em 13 de maio de 2021 às 20:55
- Atualizado há 2 anos
Na tarde desta quinta-feira (13), organizações do movimento negro, centrais sindicais e partidos de esquerda realizaram um ato para pedir justiça para Bruno Barros da Silva, 29 anos, e o sobrinho dele Yan, 19, vítimas do caso Atakarejo no dia 26 de abril, e para os 28 mortos na operação policial na comunidade do Jacarezinho, no Rio de Janeiro, que aconteceu no último dia 6. O ato, que teve início às 15h e foi encerrado por volta das 17h, reuniu muitas pessoas em frente à unidade da rede de supermercados Atakarejo que fica em Pernambués. Os manifestantes entraram no estabelecimento e também bloquearam o trânsito na Avenida Paralela sentido Brotas. >
A ação acontece no dia 13 de maio, data que marca a abolição da escravidão no Brasil pela Lei Áurea, assinada pela Princesa Isabel em 1888. No protesto, os manifestantes se referiram à data como “falsa abolição”, alegando que muitas marcas, como o racismo, foram deixadas pela escravidão e ainda não foram abolidas. >
O grupo ainda ressaltou dados que mostram que a população negra é a que mais sofre com a violência provocada pelo racismo institucional. De acordo com um levantamento feito pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP) em 2019, 74% dos homicídios no Brasil são de pessoas negras e 79% dos mortos pela polícia também são negros.>
Presente ao protesto e representando a família, a mãe de Yan Barros da Silva, Elaine Silva, afirmou que não vai descansar enquanto os responsáveis pelas mortes de Yan e Bruno não forem devidamente punidos. “O que eu estou aqui hoje pedindo mais uma vez é justiça. Eu não vou poder ter o meu filho de volta, mas o que eu puder fazer eu vou fazer para que os responsáveis sejam punidos e não façam outras mães sofrerem como eu estou sofrendo”, disse ela. No centro da imagem, Elaine, mãe de Yan, segura cartaz com a foto do filho (Foto: Arisson Marinho/CORREIO) A tia de Yan, Edna Amaral, também se pronunciou. “Independente do que tenha feito, ele era um menino maravilhoso e nada justifica eles tirarem a vida de Yan. A gente fica sem palavras, a minha ficha ainda não caiu que ele morreu. Saber que eles imploraram para não morrer dói muito. São seres humanos, eles não mereciam isso”. Bruno e Yan foram entregues a traficantes por seguranças do Atakarejo de Amaralina após terem sido flagrados furtando pacotes de carne. Os corpos dos dois foram encontrados com sinais de tortura em um porta-malas de um carro abandonado. >
Lideranças, com o apoio de um carro de som, entoaram palavras de ordem como “Justiça!” e “Vidas negras importam!” e discursaram pedindo, principalmente, a culpabilização da rede de supermercados Atakarejo e não somente dos seguranças do estabelecimento. >
O ato reuniu diversas instituições, entra elas: Movimento Negro Unificado (MNU), Coordenação Nacional de Entidades Negras (Conen), Central Única dos Trabalhadores (CUT), Central dos Trabalhadores e trabalhadoras Brasileiros (CTB), Partido Comunista do Brasil (PcdoB), Partido dos Trabalhadores (PT), Partido Socialismo e Liberdade (Psol), Movimento de Luta nos Bairros, Vilas e Favelas (MLB), União Baiana de Estudantes (UEB) e Fórum Nacional de Mulheres Negras.>
O presidente União de Negros pela Igualdade Seção Bahia (Unegro-BA), Eldon Neves, explicou que manifestações vão acontecer durante toda a semana voltadas para o combate ao racismo. “Essa semana, de 11 a 18 de maio, é voltada para o combate ao racismo. As principais bandeiras são justiça para Bruno e Yan e justiça para a comunidade do Jacarezinho”, disse.>
“Esses dois casos estão ligados a uma questão: o racismo estrutural. O caso do Atakarejo precisa ser tratado como um caso ligado ao racismo, não é um caso isolado. Os seguranças não são os únicos culpados. Eles levaram Bruno e Yan para serem executados, mas alguém mandou eles fazerem isso”, completou o presidente da Unegro-BA. Manifestantes entoaram e picharam frases defendendo que a rede de supermercados também deve ser responsabilizada pelas mortes de Bruno e Yan (Foto: Arisson Marinho/CORREIO) Ao longo do ato, manifestantes exibiram cartazes e camisas com dizeres como “Vida, pão, vacina e educação”, “O genocídio do povo negro não é uma fatalidade e sim um projeto” e “Não compre em estabelecimento que nos mata”. Pichações foram feitas na rampa de acesso e na calçada do estabelecimento. Elas traziam frases como "Teobaldo assasino", "Atakarejo racista" e "Luto".>
Os presentes também adentraram o supermercado, mesmo após seguranças tentarem fechar as portas. Eles caminharam pelo estabelecimento e entoaram gritos como “Teobaldo assassino”, em referência a Teobaldo Costa, empresário dono da rede de supermercados Atakadão Atakarejo. Não houve registro de violência. >
Ao saírem do estabelecimento, os manifestantes ocuparam as três faixas da Avenida Luís Viana Filho, mais conhecida como Paralela, em frente à estação de metrô de Pernambués, provocando um engarrafamento. Com isso, os policiais militares que monitoravam o ato se aproximaram do grupo, numa tentativa de liberar o trânsito. Após negociações da PM com as lideranças, as faixas foram, uma a uma, sendo liberadas. Agentes de trânsito estiveram no local para orientar os motoristas. >
Os manifestantes também traziam cartazes que diziam “Fora, Bolsonaro”. O coordenador local do Movimento de Luta nos Bairros, Vilas e Favelas (MBL), Vitor Aical Moraes, fez críticas ao presidente da República. “É um completo absurdo a gente ter dois jovens que foram assassinados e entregues por uma rede de supermercados para o tráfico de drogas por furtar carne para se alimentar enquanto o presidente da república está comendo picanha de 1.200 reais. A comida está faltando na mesa de muita gente, o país voltou para o mapa da fome e uma atitude dessas é absurda”, opinou. A fala é em referência à foto publicada no último dia 9 nas redes sociais em que o presidente Jair Bolsonaro (sem partido), aparece num churrasco oferecido por ele no Palácio da Alvorada, segurando uma picanha Wagyu numa embalagem com seu rosto que custaria, no mínimo, R$1.200. Manifestantes no interior do supermercado (Foto: Arisson Marinho/CORREIO) Lideranças políticas também estiveram presentes no ato. Entre elas, a deputada estadual Olívia Santana (PCdoB). Ela falou sobre a necessidade da manifestação acontecer, mesmo em uma época de pandemia de covid-19. “Vivemos entre o tiro e o vírus. Eu fiz questão de vir até aqui, apesar da pandemia, porque a luta negra contra o racismo não dá trégua, ela é sempre necessária. O assassinato de Bruno e Yan e o que aconteceu no Jacarezinho exige de nós correr o risco de se contaminar, mas é porque nós precisamos lutar por justiça. Não podemos deixar esses crimes passarem e outros do tipo acontecerem. A gente vive uma situação de miséria, de fome, e não se resolve isso matando, se resolve distribuindo renda e criando uma sociedade de bem estar. Não podemos deixar a barbárie nos vencer”, apontou a deputada. >
O diretor de cultura da União Baiana dos Estudantes (UEB), Gabriel Santos, também falou sobre o assunto. “A gente entende que, nesse período de pandemia, é importante ficar em casa. Mas também é extremamente importante ir às ruas e lutar porque, infelizmente, as pessoas não estão morrendo só de covid, elas estão sendo assassinadas e quem está morrendo são as pessoas negras, principalmente os jovens. Não tem como a gente se calar e é importante ressaltar que essa luta é de todos, é momento de união”, enfatizou. >
A Defensoria Pública do Estado da Bahia (DPE/BA), que presta assistência jurídica e judiciária gratuitas para a população, está à frente do caso que envolve o supermercado Atakarejo. Em nota, o órgão afirmou que o primeiro acolhimento à Elaine Costa Silva, mãe de Yan Barros da Silva, ocorreu na última segunda-feira (10). A DPE/BA também informou que acionou as Especializadas Cível e de Proteção aos Direitos Humanos e que, através do Projeto Amparo, Elaine e seus familiares terão suporte do núcleo psicossocial. >
“A Defensoria ainda analisa as melhores estratégias de condução do caso e a possibilidade de ser iniciada a tentativa de conciliação com o estabelecimento, no âmbito individual e coletivo”, finaliza o comunicado. >
*Com orientação da chefe de reportagem Perla Ribeiro>