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Laura Fernades
Publicado em 4 de dezembro de 2020 às 06:00
- Atualizado há 2 anos
A feijoada batida no liquidificador, o bolinho que parece acarajé, mas é frito com outro óleo que não o de dendê, e a festa do Bonfim que mais parece um Carnaval. Essas foram algumas das curiosidades encontradas pelo repórter Mauro Anchieta durante viagem ao Benin, país da África Ocidental que é tema do programa Uma História Chamada Salvador, com exibição neste sábado (5), depois do Jornal Hoje, na TV Bahia.
Serão dois programas de 30 minutos – o segundo vai ao ar no dia 12 – dedicados a contar um pouco da experiência do repórter da TV Bahia e do cinegrafista German Maldonado na viagem feita em janeiro, antes da pandemia. Ancestralidade, gastronomia, religião, cultura e arte compõem o programa que busca os laços que unem o Benin e a Bahia, assim como os aspectos históricos e culturais desconhecidos por muitos baianos.
Foram 12 dias percorrendo cidades, praias e áreas rurais do litoral do país de 11 milhões de habitantes. “Foi do antigo Reino de Daomé, atual Benin, que veio a maioria dos escravizados para a Bahia”, explica Mauro Anchieta, 52 anos. Na cidade de Uidá, que será mostrada no sábado (5), a dupla visitou a Praça dos Leilões, como ficou conhecido o local onde homens e mulheres eram negociados por comerciantes das Américas.
A partir do local, Mauro e German refizeram a antiga Rota dos Escravos, um trecho de 3,5 km que “continua de chão batido e poeirento”. Hoje, explica o repórter, o percurso dá acesso a sítios com plantações de coco. Não há mais referência à escravidão, a não ser um único monumento chamado Árvore do Esquecimento.
“Quando cheguei na praia onde os escravizados embarcavam, fiquei por alguns minutos imaginando o que acontecia 300 anos atrás. A sensação que me deu, como brasileiro de um país escravagista, foi um misto de vergonha e constrangimento. Ainda que não tenha envolvimento direto com isso, o simples fato de ser filho de um país escravagista... Inevitável não bater um pouco de tristeza”, confessa Mauro.
O programa mostra que na praia, onde ficava o porto de Uidá, maior ponto de embarque de escravos daquela região da África, fica o Portal do Não Retorno, erguido pela Unesco na década de 1990. “Ele simboliza o martírio de milhares de homens, mulheres e crianças que, a partir daquele ponto, não tinham mais qualquer chance de voltar”, conta.
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Acarajé Apesar de todo o sofrimento envolvido na história de Benin, Mauro e German puderam experimentar momentos alegres durante a viagem que faz parte da segunda temporada de Uma História Chamada Salvador. A primeira foi em Portugal. Agora, no país africano, repórter e cinegrafista se depararam com uma vida “cheia de mistérios”. “Do ponto de vista místico se parece muito com a gente”, compara Mauro.
No primeiro dia de programa, o telespectador irá conhecer, ainda, Cotonou: maior cidade do Benin, com 700 mil habitantes, onde Mauro provou o atta (a pronúncia é “atá”). Quitute que pode ser considerado antepassado do acarajé, explica o repórter, o atta é um bolinho de feijão fradinho muito popular na região. “É muito barato e não vem com recheio, apenas massa. O acarajé é muito mais saboroso”, sorri.
Já no programa do dia 12, Mauro mostra como foi o contato com os Agudás, descendentes de ex-escravos da Bahia que voltaram para o antigo Daomé (atual Benin) a partir de 1835, após a Revolta dos Malês. Além de levarem a arquitetura colonial brasileira, os Agudás também levaram para o país africano a devoção ao Senhor do Bonfim.
O domingo coincide com a data religiosa celebrada em Salvador, mas a “lavagem” deles é feita no sábado. “É o que eles chamam de Carnaval. Funciona como a festa profana do Bonfim, mas com bonecos inspirados nos de Olinda. É um mix”, conta Mauro. “Foi uma emoção muito grande. Foi muito bom testemunhar isso, sentir que a cultura da Bahia está viva lá”, comemora o repórter. Mauro Anchieta e German Maldonado passaram 12 dias explorando cidades do Benin (Foto: TV Bahia/Divulgação) Esse foi, para ele, um dos pontos mais positivos da viagem que também trouxe à tona dores do passado. O convívio com os Agudás mostrou pessoas receptivas, alegres, “que lembram o povo baiano”. Uma delas até chamou a dupla para almoçar e fez uma feijoada, mas batida no liquidificador e apimentada. Serviram banana frita, peixe frito e uma espécie de pirão de mandioca. “Foi uma experiência fantástica”, diz.
“Sou um apaixonado por História e gosto muito de conteúdos especiais, gosto de oferecer aos telespectadores um conteúdo que possa dar às pessoas uma noção maior de onde elas vieram”, diz Mauro, sobre o programa. “Acho que a existência da gente é muito rápida, conhecer um pouco do passado é importante. É uma contribuição que eu particularmente gosto de dar pra coletividade. A televisão também tem esse papel”, finaliza.