Receba por email.
Cadastre-se e receba grátis as principais notícias do Correio.
Victor Lahiri
Publicado em 15 de novembro de 2018 às 06:00
- Atualizado há 2 anos
Final de ano é época de presentes de Natal e, muitas vezes, de cobrança de taxa extra pelo condomínio. A cota extra no fim do ano costuma ser justificada pela necessidade de pagar o 13º dos funcionários, o adicional de férias e o salário de um porteiro ou zelador substituto. Acontece que, para esse uso, a cobrança da taxa extra é irregular. E também revela uma falha no planejamento financeiro do condomínio, já que 13º, férias e substituição não são exatamente eventos que ocorram de surpresa.
Taxa extra, de acordo com o Código Civil, é tudo aquilo que excede as despesas básicas relacionadas na previsão orçamentária do condomínio. O valor só pode ser cobrado mediante autorização de assembleia geral de condôminos e as principais justificativas para a sua aplicação, segundo o mesmo código, são: reformas na estrutura integral do imóvel, troca de piso, pintura externa, intervenções para garantir as condições de habitabilidade - a exemplo do reparo de vazamentos, impermeabilizações, reformas de pisos, instalação de equipamentos de telefonia, segurança, incêndio, com exceção dos casos de urgência comprovada.
Muro Foi em meio a uma situação de urgência, por exemplo, que o síndico profissional, Valdir Barbosa convocou uma assembleia no condomínio que administrava para propor a votação de uma taxa extra para realizar a manutenção de um muro próximo à garagem descoberta do prédio.
“A administração foi alertada que o muro estava condenado. Nós chamamos um profissional que examinou a estrutura e deu o veredito que o muro precisaria ser reconstruído, pois já apresentava risco ao moradores”, lembra Valdir. Segundo ele, um dos moradores discordou da urgência do serviço e mobilizou os demais condôminos contra a legitimidade da taxa extra antes mesmo da assembleia na qual a votação estava programada para ocorrer. Durante a reunião de moradores, não deu outra, a cota foi indeferida pela maioria e o serviço não foi feito.
“Algum tempo após a assembleia, o muro não resistiu e entrou em colapso, atingindo carros que estavam estacionados. Tivemos um grande desgaste, além de todo o prejuízo financeiro que poderia ter sido evitado. Se a taxa tivesse sido aplicada, a situação teria sido tratada de maneira preventiva”, comenta.
Caso legítimo
De acordo com a advogada especializada em Direito Condominial, Stéphanie Nery, a situação vivida por Valdir configura um caso legítimo da necessidade da taxa extra. Mas que o cenário comum é ver administrações que propõem a aplicação da cota para corrigir falhas de planejamento na previsão orçamentária. “Agora com a chegada do final de ano, por exemplo, é comum nos depararmos com casos de síndicos que convocam a taxa extra para pagar o 13º salário dos funcionários, gasto que deveria ser enquadrado como despesa ordinária”, diz.
Stéphanie, porém, ressalta que mesmo com a presença de equívocos que colocam em questão a competência administrativa do síndico, os proprietários não estão isentos do pagamento. “A taxa extra é tão obrigatória quanto a conta condominial, e pela finalidade - de benfeitoria - é uma responsabilidade do proprietário, por isso vemos inquilinos se recusarem a pagar, gerando atritos”, fala. “Ela (taxa estra) precisa ser paga, independente de qual das partes se responsabilize. Do contrário, o proprietário será acionado judicialmente”, completa.
Prevenção Para evitar o desconforto causado pela necessida da taxa extra, a solução pode estar em uma importante ferramenta, que deve ser relacionada na convenção condominial: o fundo de reserva. Como o próprio nome indica, o fundo de reserva é um instrumento diferenciado do caixa condominial, que tem por finalidade a garantia de quitação, em meio a uma situação eventual e emergencial, das despesas imprevistas, sejam elas ordinárias ou extraordinárias.
A síndica profissional e gerente de atendimento da ACS Condomínios, Linda Carvalho, explica que nos condomínios onde não há o fundo de reserva, as taxas extras serão sempre recorrentes. “A cota condominial é apenas o rateio das despesas mensais, por isso se o condomínio não instituir o fundo de reserva, e seguir fechando as contas no limite, eventualmente a taxa extra vai ter que ser cobrada”, afirma.
Linda explica que o recomendável é que o condomínio tenha no seu fundo de reserva ao menos o valor de uma arrecadação mensal da taxa condominial. “Para compor esse valor, geralmente a convenção do condominio determina a cobrança de um Fundo de Reserva de 5% ou 10% da taxa condominial”, diz, para completar: “Essa arrecadação deverá ser direcionada mensalmente para uma conta aplicação do condomínio com a finalidade de atender situações emergenciais e realização de obras. Para fazer uso dessa receita, se faz necessária a aprovação da assembleia”.
Planejamento evita cobrança desnecessária Hadan Palasthy, diretor da CreditCon, dá dicas para que o síndico possa fazer um bom planejamento financeiro (foto: acervo pessoal)
Planejamento é a atitude a ser tomada para evitar a cobrança de taxas extras ou o uso do fundo de reserva em situações que não sejam extremamente necessárias. Esse planejamento deve levar em conta uma análise minuciosa de todas as peculiaridades do condomínio, segundo Hadan Palasthy, diretor da CreditCon, empresa especializada em gestão condominial e incorporação imobiliária. “É necessário cobrir todas as bases possíveis, e isso inclui prever todas as necessidades para que a estrutura funcione mesmo com as possíveis necessidades eventuais de recisões contratuais, serviços emergenciais, laudos técnicos e mesmo a situação de inadimplência, que sabemos ser uma realidade na maior parte dos condomínios”, explica.
Hadan aponta que é possível que síndicos e administradoras profissionais realizem cálculos apertados a respeito do reajuste da cota condominial mensal para evitar conflitos com condôminos. Porém, esse tipo de atitude acaba gerando o efeito contrário, já que o atrito acaba ocorrendo quando uma taxa extra precisa ser aplicada para equilibrar as contas. “O síndico não tem como fazer mágica para fechar as contas, ele apenas tem três opções: cortar comodidades para reduzir as despesas, aplicar o aumento e fazer o caixa para as melhorias e possíveis emergências, ou não fazer o aumento e seguir no limite, sabendo que eventualmente haverá supresa”, diz. “Eu recomendo que ele busque se munir de informação, e com uma boa base realize a assembleia, dividindo a responsabilidade com os condôminos, assim a administração se protege”, afirma.
Aos síndicos e administradores que tiveram problemas ao longo de 2018, Hadan recomenda um empenho maior na previsão orçamentária do próximo ano. “Evite chutar a média de reajuste, faça um estudo personalizado da situação do condomínio, busque cobrar os inadimplentes de forma efetiva, preveja obrigações legais como encargos sociais, laudos, etc. Tendo tudo isso sob controle, a administração terá uma gestão tranquila em 2019”, finaliza.
Dicas para síndicos
Comunicação e gestão de conflitos O ideal é que todos tenham a condição de participar e contribuir na melhora do local onde residem ou trabalham. O síndico deve se empenhar na comunicação, bem como entender as peculiaridades individuais e sociais de onde atuará ou como foi o ano nesse quesito. Fazer um balanço pode ajudar a entender o período para fazer diferente em 2019.
Planejamento administrativo Analisar metodologias de trabalho que podem facilitar a gestão do prédio, como o uso de aplicativos, softwares, contratação de empresas especializadas, entre outras ferramentas. Com a tecnologia e o smartphone, é possível evoluir de maneira prática em muitos quesitos que auxiliam na gestão do condomínio.
Gestão de pessoas O síndico não deixa de ser uma liderança, e deve exercê-la, seja na orientação, no suporte e na qualificação dos funcionários.
Gestão financeira O síndico deve criar uma previsão orçamentária detalhada, destacando os pontos que podem ser melhorados e onde deve economizar.
Controle da inadimplência O síndico deve estar de olho permanente no controle financeiro do condomínio. “Ele deve estar atento na evolução da inadimplência, aplicando métodos de composição amigá- veis. Dessa forma, é melhor para encontrar uma solução e evitar que os valores se acumulem e se tornem impagáveis”, explica Dr. Palasthy.
Compartilhar ideias Hadan afirma que outro ponto importante para a elaboração de um bom planejamento é contar com profissionais especializados. “Por mais que haja experiência do síndico, sempre é bom o auxílio de profissionais do ramo, sejam eles administradoras, contadores, o próprio Corpo Diretivo, dentre outros que julgarem capazes. Assim muito mais abrangente será a previsão, não deixando espaço para muitos eventos não previstos”, afirma. Ele reforça ainda que um bom planejamento pode evitar que as cotas condominiais se tornem muito elevadas, o que normalmente é ocasionado por má gestão, como gastar mais do que arrecada. “O síndico deve estar atento à inadimplência, para que ela não atinja patamares elevados nem onere os condôminos que pagam em dia”, finaliza.