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Venda de tadalafila aumentou 60% na Bahia em um ano; saiba o que elevou a procura pelo medicamento

Em quatro anos, vendas do medicamento cresceu em 220% no estado

  • Foto do(a) author(a) Millena Marques
  • Millena Marques

Publicado em 18 de março de 2025 às 05:00

Tadalafila
Tadalafila Crédito: Shutterstock

Ela foi criada para tratar a disfunção erétil no início dos anos 2000, mas tem sido utilizada para fins que não envolvem impotência sexual. Nas academias, uma turma jovem, que sequer sofre com a doença, faz o uso para obter uma alta performance. Virou moda até mesmo no Carnaval, sendo vendida por ambulantes como se fosse doce – embora necessite de prescrição médica. Trata-se da tadalafila, mais conhecida como tadala.

O fármaco é eficaz 30 minutos após sua administração, por até 36 horas, mas exige uso racional e deve, obrigatoriamente, ser estipulado por um médico. Entre 2023 e 2024, a venda do medicamento cresceu em 60% na Bahia, segundo Cleiton Vieira, diretor comercial da Associação de Farmácias do Nordeste (Assofarne). Nos últimos quatro anos, o aumento foi de 220%.

A tadalafila foi o terceiro medicamento mais vendido no Brasil em 2024, atrás apenas da losartana, que é utilizada para controle da pressão arterial, e da metformina, para diabetes, de acordo com a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). Em quatro anos, foi registrado um aumento de 10 milhões nas vendas do fármaco: saiu de 21, 4 milhões para 31,4 milhões. Os dados de Bahia foram solicitados à agência, mas não houve resposta até a publicação desta matéria. O aumento foi puxado pelo consumo indiscriminado da população.

No caso do uso como pré-treino, as pessoas idealizaram equivocadamente que a tadalafila pode ter uma ação no endotélio muscular, fazendo com os vasos dos músculos dilatem e que haja uma maior nutrição dos músculos antes ou durante a atividade física. Com isso, a pessoa teria um ganho de massa muscular maior.

“Não existe evidência científica em relação a esse tipo de posologia e de resultado com a utilização do medicamento. Portanto, é estritamente contraindicado o uso desse remédio para esse tipo de objetivo”, diz o médico urologista Lucas Batista, sócio do Instituto de Urologia da Bahia e chefe dos serviços de Urologia do Hospital das Clínicas da Universidade Federal da Bahia (Ufba). Também não há nenhuma relação do medicamento com o ganho de energia ou resistência para ‘aguentar’ rotina de festas, tais quais o Carnaval.

Muitos jovens recorrem ao medicamento de forma recreativa por uma questão de insegurança pessoal, como se a tadalafila fosse um apoio psicológico para um desempenho sexual mais duradouro. “Tenho amigo que bota (tadala) na carteira, mas ninguém vai querer admitir, mesmo sob condição de anonimato”, disse uma jornalista, que preferiu não identificar. A amiga contou que o assunto surgiu durante uma conversa em que todos estavam alcoolizados. "Tem alguns que usam desse grupinho. Um deles toma sem a namorada saber para fazer ‘surpresa’”, relatou.

O uso desenfreado do fármaco também foi puxado pela divulgação, muitas vezes sem responsabilidade, de influenciadores digitais e comediantes. “Eu realmente achava que não era perigoso porque o pessoal faz piada e fala sobre isso abertamente nas redes sociais”, disse um jovem, de 29 anos, que usou o medicamento três vezes, sem prescrição. Ele contou, sob anonimato, que era amigo de um farmacêutico, o que explicou a obtenção do fármaco sem receita.

O influenciador carioca Jon Vlogs lançou, na última semana, uma gummy (bala de goma) de tadafila, a primeira do Brasil, segundo ele. “Qual dos teus amigos estão precisando de uma caixa?”, escreveu ele no post de anúncio, acompanhado de um “*Venda sob prescrição médica”. O produto esgotou em três dias. Em Salvador, o comediante Claudio Saback, que foi candidato a vereador da cidade em 2024, é conhecido como ‘Embaixador do Tadala’ no Instagram, onde acumula 384 mil seguidores. Ele, aliás, desfilava nas ruas do IAPI com um carro anunciando o medicamento.

O apelo cultural também acontece por meio das canções que ganham força nas plataformas digitais. Ao pesquisar ‘Tadala’ no Youtube, por exemplo, o primeiro vídeo que aparece é o clipe da música que leva o nome do medicamento. Lançada há um mês, a canção é interpretada por Tierry, J. Eskine, Seresta do Rasta e Erick Woods. Até esta segunda-feira (17), o vídeo tinha 7,9 milhões de visualizações. “É o que a gente pode chamar de modismo midiático porque existem canções de funk, arrocha..., que promovem esse tipo de medicação com trocadilhos, brincadeiras, estímulos sexuais e etc”, disse o farmacêutico Gibran Sousa, diretor do Sindicato de Farmacêuticos da Bahia (Sindifarma).

Divulgação online reforça expectativas de masculinidade

Em novembro de 2023, o CORREIO produziu uma reportagem especial sobre o uso de tadalafila e como o medicamento virou tendência nas redes sociais. Observar o sucesso desse medicamento pode fazer refletir sobre a masculinidade. Segundo o professor Djalma Thürler, do Programa de Pós-Graduação em Cultura e Sociedade da Universidade Federal da Bahia (Ufba), a masculinidade é histórica e produto de uma construção social e deve ser analisada de forma relacional.

"Portanto, do ponto de vista da construção da subjetividade masculina, o dispositivo online de venda desse tipo de medicamento, apenas reforça uma das maneiras de como os homens se tornam homens, de como cumprem as expectativas de seu papel social", disse ele, que é pesquisador do Núcleo de Pesquisa e Extensão em Culturas, Gêneros e Sexualidades (NuCus).

Nos últimos anos, segundo o professor, cresceram os debates sobre a crise da masculinidade. No entanto, um dos delírios da chamada ultramasculinidade, que forma o arquétipo de masculinidade épica, ainda é a ideia de um homem poderoso, sempre disposto a dar prazer.

O ideal é que este homem vá a muitos encontros, de preferência com parceiras diferentes. "O medo da rejeição, caso não esteja à altura de uma mulher (em espanhol, ‘no dar la talla’) somado a outros fantasmas da masculinidade, como ‘quanto o pênis deve medir?’ ‘quanto tempo precisa durar a transa?’ ‘o que acontece se ele brochar?’ ‘quando eu envelhecer, ele não vai mais endurecer?’, não são, em absoluto, perguntas de quem procura medicamentos para disfunção erétil para uso recreativo, mas, de quem tem verdadeira obsessão para a manutenção da masculinidade, para quem homens não choram, eles ejaculam", refletiu.