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Veja as facções que cercam os circuitos oficiais do Carnaval de Salvador

Organizações criminosas usam "biqueiras"

  • Foto do(a) author(a) Bruno Wendel
  • Bruno Wendel

Publicado em 24 de fevereiro de 2025 às 05:00

Foram apreendidos cinco quilos de cocaína, dezenas de comprimidos de ecstasy, porções de droga sintética MDMA, porções de maconha e haxixe
Cinco quilos de cocaína, dezenas de comprimidos de ecstasy, porções de droga sintética MDMA, porções de maconha e haxixe que seriam distribuídos no Carnaval do ano passado foram apreendidos pela polícia Crédito: Divulgação/PC

Daqui a três dias, a magia vai acontecer. Na “corda”, na “pipoca” ou nos camarotes, foliões se esbaldarão na passagem dos trios. Mas o que muita gente não sabe ou não percebe é que, no entorno do Carnaval de Salvador, outra festa acontece, a do narcotráfico. Mesmo com a instalação de barreiras pela polícia, para controlar o acesso, o consumo de drogas acontece nos circuitos porque a venda de entorpecentes rola solta nas extremidades, sob os olhares ávidos do Comando Vermelho (CV) e do Bonde do Maluco (BDM). 

“A droga é um negócio lucrativo. Muita gente no mesmo espaço. Assim como a cerveja, o abadá, ela tem alta demanda neste período. As barreiras de acesso impedem que haja um comércio dentro da festa, mas não o consumo. As organizações lucram milhões nas ‘biqueiras’ (pontos de venda), que funcionam às margens do circuito”, declara um major da Polícia Militar que há mais de 10 anos trabalha nos circuitos do Carnaval de Salvador.  

O circuito mais tradicional da festa é o Osmar (Campo Grande), que vai do Campo Grande, segue pela Avenida Sete, retorna na Praça Castro Alves e segue a Avenida Carlos Gomes até o Largo dos Aflitos. Estes dois últimos trechos, parte do fundo deles, dão para a comunidade da Gamboa, uma das regiões de tráfico mais lucrativa para o CV, tendo em vista o fato de estar muito próximo a bairros nobres, seus principais consumidores. Supostamente na tentativa de manter a hegemonia na região, três integrantes da facção carioca mataram uma pessoa e deixaram outras duas feridas na Rua Carlos Gomes, durante o Carnaval de 2023. Era por volta das 4h, quando tudo aconteceu.  

No momento do crime, passava o Bloco Amor e Paixão – tudo aconteceu fora das cordas do trio. Segundo a polícia, os traficantes chegaram dizendo que eram da Gamboa e que estavam ali para matar rivais do Centro Histórico, onde o domínio é do BDM. Foi quando avistaram Marcos Souza Menezes e começaram a atirar. Outros dois homens foram atingidos, um na perna e outro de raspão na barriga. “Com as câmeras, foi possível constatar que a arma saiu de um dos casarões na Castro Alves. Depois, alguns envolvidos foram presos, mas não tem como a polícia ir em todos aqueles prédios antigos no Centro, são inúmeros”, declara o major.    

Ainda nos fundos da Carlos Gomes está o bairro Dois de Julho, cujo tráfico é dominado pelo BDM. Em outubro do ano passado, três pessoas morreram, entre elas uma mulher, em frente ao Museu de Arte Sacra da Bahia, em um ataque do CV. Uma quarta vítima sobreviveu.  

Vitrine

No ano passado, a festa movimentou mais de R$ 2 bilhões e contou com 11 milhões de foliões. Um dos circuitos mais desejados é o Dodô (Barra/ Ondina). É nele que vai desfilar a maioria das estrelas da Axé Music e onde estarão os maiores camarotes e patrocinadores da folia. E não muito distante dele está o Calabar. A Base Comunitária da Polícia Militar não impede o tráfico, que se mantém firme, assim como os confrontos entre organizações criminosas, como em setembro de 2023, quando o território, controlado pelo BDM, foi invadido pelo CV. Houve intensa troca de tiros, toque de recolher e foi necessária a ocupação da polícia.  

Praticamente na “boca” da folia está a “Roça da Sabina”, uma comunidade que compreende o Morro do Ypiranga e a Avenida Centenário. Lá, está a Rua Silvio Marques, um ponto de venda forte do BDM. “Ela dá acesso às avenidas Centenário, próximo ao circuito, e Oceânica, onde a festa ocorre”, diz o major. O Alto de Ondina margeia a Avenida Oceânica, trecho entre Ondina e o Rio Vermelho, um dos acessos ao circuito Dodô. E nesta comunidade a presença é do CV.   

Assim como o Complexo do Nordeste está para o CV, o Centro Histórico (Circuito Batatinha) está para o BDM. Isso porque a facção das “três letras” fez do Pelourinho o seu reduto, de olho na aproximação com o Porto de Salvador, por onde parte das drogas e armas chega à organização. Como nos dias da festa o policiamento no local é reforçado, a “atividade comercial” é feita em regiões anexas, como o bairro da Saúde. “É também território do BDM. Tem também a Rua do Gravatá, a própria Baixa dos Sapateiros, que é vizinha ao Pelourinho. Tudo ali é mesmo do grupo e serve de apoio nesta época”, diz um policial do 18° Batalhão (Centro Histórico).    

O cofundador e coordenador executivo da Iniciativa Negra por uma Nova Política sobre Drogas, Dudu Ribeiro, lembra que "nós estamos falando de regiões de maioria negra, que podem até ter pontos de venda de substâncias ilícitas, mas elas não podem ser resumidas a isso".

"Acredito que esse é um dos elementos fundamentais para analisar a circulação das substâncias que, nos bairros de maioria branca, estarão os moradores que são os verdadeiros beneficiários da lógica, inclusive econômica da guerra (às drogas), e nos bairros periféricos negros, estará a face sangrenta da guerra", pontua Ribeiro, que é também integrante da rede de Observatórios de Segurança.

O folião está seguro?  

No entendimento de Dudu Ribeiro, “a cidade vai estar mais ou menos segura durante o evento, mas certamente episódios podem ocorrer devido ao momento do Carnaval”. “Nós temos que partir do lugar de que estamos vivendo um momento de crise na segurança pública. Temos altos índices de letalidade e nós temos observado uma intensificação nas disputas entre as facções, no entanto, há violências particulares do processo de encontro no Carnaval nas características de Salvador e elas devem tomar o destaque dos próximos dias”, declara o especialista em segurança pública.

Para o coordenador de Operações da Polícia Civil, delegado Arthur Guimarães, não há com o que se preocupar. “A gente atua o ano todo, não se restringe ao Carnaval. Na quarta (19) tivemos operações importantes aqui e fora do estado, onde em uma alcançamos 22 alvos e na outra 47, descapitalizando o tráfico. Além disso, teremos ações também fora do circuito, com interceptação telefônica, investigações e o ciber monitoramento”, diz o delegado. Segundo ele, os portais de abordagens funcionarão 24 horas. “Caso alguma coisa passe pelas barreiras, teremos patrulhas com cães farejadores a todo momento”, garantiu.  

Na semana passada, a Secretaria de Segurança Pública (SSP) informou que, para o Carnaval, serão 1,5 mil câmeras com reconhecimento facial e contagem de público na capital e no interior. O sistema de reconhecimento facial ultrapassou a marca de 300 foragidos da Justiça localizados em 2025. Em todo o estado, haverá 99 portais de abordagem, sendo 47 deles em Salvador. Além disso, serão 597 postos e também postos elevados, sendo 415 só na capital. 

Quanto ao efetivo de agentes de segurança, o maior deles é da Polícia Militar da Bahia (PM-BA), que terá 29 mil agentes nas ruas. A Polícia Civil e o Corpo de Bombeiros, por sua vez, terão, respectivamente, 3 mil agentes espalhados pela festa. O Departamento de Polícia Técnica (DPT) terá 555 peritos à disposição, e a SSP mobilizará cerca de 1,5 mil servidores.