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Um ano sem resposta: sobrevivente de ataque em Itajuípe e familiares de agente morto cobram justiça

Processo Administrativo Disciplinar que deveria ser julgado em 60 dias, ainda não ouviu ninguém

  • E
  • Emilly Oliveira

Publicado em 28 de setembro de 2023 às 18:23

Subtentente Alberto Alves foi morto em setembro de 2022
Subtentente Alberto Alves foi morto em setembro de 2022 Crédito: Reprodução

As marcas da ação de policiais militares que resultou na morte do subtenente Alberto Alves dos Santos, 51 anos, que fazia a segurança de ACM Neto durante as eleições de 2022, ainda são profundas no sargento Adeilton Rodrigues D'Almeida, 54 anos - sobrevivente da fatalidade que completou um ano na última quarta-feira (27) - e na família do subtenente morto. Além da dor do luto, ambos amargam a angústia de que nada tenha sido feito para punir os envolvidos até hoje.

No dia 27 de setembro do ano passado, os dois policiais estavam em um hotel no município de Itajuípe com a equipe de segurança do ex-prefeito de Salvador, quando outros policiais militares invadiram a hospedaria em busca de um assaltante e atiraram contra os seguranças. Adeilton foi atingido por cinco tiros e conta que viu o subtenente Alves ser morto e ter o corpo arrastado para dentro do camburão de uma viatura.

Nesta quinta-feira (28), Adeilton vai passar pela quarta cirurgia para tentar reverter os problemas causados pelos dois tiros que atingiram seu braço esquerdo. O procedimento é para enxertar um pedaço do osso da bacia no membro, que também perdeu parte do músculo do tríceps. Os últimos meses têm sido de enfrentamento à dor física com o uso constante de remédios.

O abalo psicológico é ainda pior. O sargento revela que ainda tem dificuldades para dormir e não consegue esquecer as sensações de medo e impotência vividas em Itajuípe. “Até hoje eu não consigo dormir direito, sou acompanhado por psicólogos e tomo remédios para aliviar a cabeça, mas ainda assim não consigo deglutir isso, assimilar a vida como era antes”, afirma.

Ainda segundo Adeilton, a decepção diante da falta de resposta da Polícia Militar da Bahia (PM-BA) é tão grande que ele deixou a corporação em julho deste ano e rasgou a farda que pretendia guardar de recordação pelos 33 anos de carreira na polícia. “Cortei toda com a faca e joguei no lixo. Ser policial é um sacerdócio, quem é policial sabe que não fazemos por dinheiro, mas porque somos apaixonados, como eu fui [até esse episódio]”, destacou.

Justiça

Segundo uma das filhas do subtenente Alberto, a omissão da PM em relação à morte do pai menospreza os quase 30 anos que ele dedicou ao estado. Além da jovem, que pediu para não ser identificada, ele deixou mais três filhos e a esposa Rita de Cássia Alves. 

“Eu tenho três perguntas para o governador Jerônimo Rodrigues: o que tem sido feito para esclarecer a morte do meu pai? Como os culpados serão punidos? Quanto tempo vamos ter que esperar para ver justiça? Porque parece que o meu pai não significou nada, que só foi usado e agora estão tentando abafar a história”, questiona. A reportagem entrou em contato com a assessoria do governador pedindo um posicionamento, mas não teve retorno até o momento. 

A perda também impactou a relação da família. A viúva do subtenente, que é mãe de duas filhas do policial, conta que para evitar o sofrimento delas, tem evitado falar da morte do marido e jovens têm feito o mesmo. As três não assistem mais TV juntas como faziam antes, por medo de se depararem com notícias sobre assassinatos.

“Não conversamos mais como antes por medo de trazer magoa, mas só Deus sabe a dor que carregamos em nossos corações. O que queremos é justiça, porque está sendo difícil continuar vivendo desse jeito. Meu marido era um homem honrado, bom filho e tem feito muita falta para nós”, desabafa Rita de Cássia.

Morosidade

A Polícia Militar só começou a apurar o caso internamente no mês passado, no dia 3 de agosto, quando foi aberto um Processo Administrativo Disciplinar (PAD), marcado, no entanto, pela morosidade. Segundo fontes ouvidas pelo CORREIO, a PM indiciou apenas sete policiais militares, enquanto a Justiça acusa 13 agentes. Além disso, o processo que deveria ser julgado em 60 dias - prazo que se encerra em cinco dias -, com possibilidade de ser prorrogado por mais 60 dias, ainda não ouviu ninguém.

A reportagem procurou a Corregedoria da Polícia Militar da Bahia para saber o status do processo administrativo e o motivo de ter sido aberto somente contra sete policiais militares, enquanto a Justiça acusa 13 PMs, mas ainda não teve resposta.

Sobre o processo externo, o Ministério Público Estadual (MP-BA) informou que ofereceu denúncia no dia 23 de maio de 2023 contra 13 policiais militares que participaram da ação que resultou na morte do subtenente Alberto Alves dos Santos. A denúncia foi recebida pela Justiça no dia 5 de junho e, a pedido do MP, o juiz decretou o afastamento das funções de cinco dos 13 acusados.

No dia 18 de julho, foi realizada a primeira audiência de instrução do processo, na Vara de Auditoria Militar em Salvador, quando foram ouvidas todas as sete testemunhas de acusação. “O Código de Processo Penal Militar estabelece que o prazo para arrolar as testemunhas de defesa somente se inicia após a oitiva de todas as pessoas indicadas pela acusação, o que ocorreu no dia 18 de julho”, informou o MP em nota.

Ainda segundo o MP, o órgão aguarda a designação de audiências pela Justiça para as oitivas das 12 testemunhas de defesa e realização dos 13 interrogatórios dos policiais denunciados. Ainda serão ouvidas 25 pessoas, em data ainda não determinada pela Justiça. A reportagem entrou em contato com o Tribunal de Justiça da Bahia (TJ-BA) para saber para quando o órgão pretende marcar a audiência e ainda não teve retorno. 

Relembre o caso

O subtenente Alberto Alves dos Santos e o sargento Adeilton Rodrigues D'Almeida estavam em Itajuípe, no dia 27 de setembro do ano passado, para acompanhar o ex-prefeito ACM Neto em um evento de campanha que aconteceria no dia seguinte em Coaraci.

A Secretaria de Segurança Pública da Bahia (SSP-BA)  informou que a situação se originou com a busca por um assaltante de banco. Identificado como André Marcio Jesus, conhecido como Buiu, ele tem ligação com uma facção criminosa paulista e deixou o Complexo Penitenciário de Lauro de Freitas no mesmo dia, com o benefício de saída temporária, usando tornozeleira eletrônica.

Buiu rompeu a tornozeleira quando estava na BR-324, perto de Candeias, por volta das 14h30. Durante as buscas pelo criminoso, os policiais foram informados sobre a presença de homens armados em um hotel em Itajuípe e foram até o local. No hotel, dois homens foram abordados e não reagiram. A SSP informou na época que outros dois homens armados teriam reagido quando os PMs se aproximaram. Segundo o órgão, dois soldados que estavam em serviço foram baleados na ação. No tiroteio, o sargento D'Almeida foi ferido e o subtenente Alves foi morto. 

Em janeiro deste ano, André Márcio de Jesus foi preso na cidade de Bonito, destino turístico do Mato Grosso do Sul, enquanto comemorava o Réveillon em uma chácara de luxo com mais 12 pessoas. 

*Com orientação da subeditora Fernanda Varela