Receba por email.
Cadastre-se e receba grátis as principais notícias do Correio.
Maysa Polcri
Publicado em 30 de outubro de 2024 às 09:32
Mais um capítulo do imbróglio envolvendo o ingresso de alunos na Faculdade de Medicina da Bahia (FMB) foi aberto neste mês. No dia 22 de outubro, a Reitoria da Universidade Federal da Bahia (Ufba) apresentou proposta de redução da oferta de vagas através do Sistema de Seleção Unificada (Sisu) a partir de 2025. A proposta precisa ser analisada pelas congregações universitárias e pelo Conselho Acadêmico de Ensino (CAE).
No dia 9 deste mês, o conselho aprovou a suspensão pelos próximos três anos da entrada de egressos do Bacharelado Interdisciplinar da Ufba (BI/Ufba) em Medicina. O Instituto de Humanidades, Artes e Ciências Professor Milton Santos (Ihac), unidade responsável pelo BI, recorreu da decisão. O diretor da Faculdade de Medicina alega que a medida, se aprovada, deve mitigar a superlotação do curso, resultado da judicialização que aumenta o número de novos alunos.
A nota enviada pela Pró-Reitoria de Ensino e Graduação da Ufba, que apresenta a proposta da Reitoria, indica que a suspensão de três anos de egressos do BI não resolve o problema da superlotação. “Mesmo em 2028, não há garantia de que o estudante ingressante no curso de BI Saúde de 2025 esteja impedido de questionar judicialmente o direito ao curso de Medicina. Ao contrário, tudo indica que as liminares continuarão a existir”, diz o documento, o qual o CORREIO teve acesso.
A proposta da Reitoria de reduzir o números de vagas para Medicina aparece, então, como alternativa para garantir a “qualidade da formação médica”. Atualmente, a Ufba oferta 80 vagas semestrais para o curso de Medicina em Salvador, além de 60 vagas anuais para o campus de Vitória da Conquista.
“A redução de oferta de vagas no SISU do curso de Medicina já em 2025 tende a reduzir a entrada de estudantes e garantir número de alunos nos componentes curriculares em concordância com os projetos pedagógicos dos cursos”, detalha a pró-reitora Nancy Rita Ferreira Vieira, que assina o documento. Ainda segundo a nota, essa seria uma solução temporária.
Questionada pela reportagem, a pró-reitora Nancy Rita Ferreira Vieira informou que o tema está sendo discutido internamente junto às unidades universitárias e os conselhos da universidade. Ela disse ainda que, assim que houver decisão, ela será divulgada amplamente.
A Ufba, através da assessoria de imprensa, reforçou que "a questão está em discussão nos diversos fóruns". "Esse é o processo normal, que resulta em decisões colegiadas", pontua. A Faculdade de Medicina também foi questionada, mas não se manifestou até esta publicação.
O Instituto de Humanidades, Artes & Ciências (Ihac) da Ufba, que repudiou a retirada de Medicina do programa de BI, apoiou a nova proposta da Reitoria. Segundo a organização, a medida “tem por objetivo assegurar a tranquilidade necessária para que a discussão iniciada tenha continuidade, com o respeito e a profundidade que o tema requer.”
Em dezembro do ano passado, uma Comissão Especial foi criada dentro do CAE para analisar o impacto de decisões judiciais na entrada de novos estudantes no curso de Medicina. Segundo um relatório feito pelo grupo em setembro, 21 alunos ingressaram, em 2023, através de decisões da Justiça. O número representa um salto em relação a 2022, quando haviam sido 11 matriculados.
“O Poder Judiciário, ao longo dos anos, tem entendido que o egresso do BI, ingresso via Lei de Cotas, estaria, ao final do curso de graduação, nas mesmas condições que os demais estudantes de ampla concorrência [...] Com essa compreensão firmada, a de que haveria uma cota sob cota, a UFBA tem sido obrigada, por força de liminar, a matricular um número maior de alunos no curso de Medicina a cada semestre”, aponta o relatório do Conselho Acadêmico de Ensino.
A decisão ainda precisa ser ratificada pelo Conselho Universitário (Consuni). Mesmo assim, a definição pelo CAE já foi suficiente para provocar reações e debates acalorados dos dois lados - a favor e contra a medida. Os primeiros defendem que o cenário atual é insustentável; os contrários, por sua vez, acreditam que é reflexo de uma oposição ao BI que se arrasta desde a sua fundação.
Uma reportagem especial do CORREIO, publicada na edição de final de semana dos dias 19 e 20 de outubro, detalhou o que está por trás das tentativas de restringir o acesso de estudantes ao curso de Medicina. O caso da Ufba ilustra um contexto maior que envolve problemas como: a distorção da finalidade do BI, o conhecido esgotamento mental dos estudantes que entram nessa graduação já com o foco em Medicina e precisam manter notas altíssimas, o aumento do número de matrículas devido a decisões judiciais, a não ampliação de vagas na graduação para o curso profissionalizante ao longo dos anos e até a aplicação da Lei de Cotas.