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Priscila Natividade
Publicado em 22 de dezembro de 2024 às 07:24
Uma semente verde e brilhante guardada a sete chaves em uma casquinha que esconde um sabor muito característico e diferente. Com certeza, alguém logo pensa no pistache. E sim, ultimamente, ele está em tudo: tem barra de proteína, panetone, torta. Naquele chocolate, na vitrine da sorveteria e no biscoito também. E se por um acaso, se você tiver coragem e pesquisar mais um pouquinho, vai encontrar manteiga de pistache, sabor de super coffee e até colônia body splash.
O império do pistache é real e a gente pode provar ainda que o Brasil não tenha nem um pé de pistacheiro plantado em todo seu território. A Bahia, então? Nem sonha com isso. A invasão, no entanto, já levou o país a aumentar, nos últimos anos, a importação em algo em torno de 300%. Saiu de 350 para mais de mil toneladas em 2024. As informações são da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), que enxerga muito potencial nessa produção, mesmo que isso exija tecnologia e pesquisa para desenvolver uma espécie que possa se adequar ao clima tropical.
“Realmente, o consumo de pistache se tornou algo estrondoso nos últimos anos e talvez isso venha chamando a atenção de todo mundo. É uma noz cara, que tem alto valor agregado. Você tem pistache não só in natura, mas em diferentes tipos de produtos. Popularizado aqui no Brasil, todo seu consumo é importado. Hoje a gente importa no ano quase 1 mil toneladas de pistache por ano, o que é bastante coisa”, destaca o chefe-geral da Embrapa Agroindústria Tropical, Gustavo Saavedra.
Se o Brasil não tem produção nenhuma atualmente, fora dos países do Oriente Médio, o grande produtor são os Estados Unidos, em especial, a Califórnia. “É uma cultura que realmente poderia ser produzida no Brasil. A gente está em fase de discussão. Se o Brasil tomasse a decisão de produzir um pistache tropical, teríamos que fazer a conta de quanto vai ser investido e qual vai ser esse retorno. As projeções são interessantes, mas desenvolver um pistache tropical envolve uma tomada de decisão de investimento”.
Pistácio, pistacho, alfóstica. Planta originária da Pérsia e prima (muito) distante do caju e da manga, a semente pertence à família dos anacardiaces. Ao contrário do cajueiro e da mangueira, o pistache se desenvolve em climas frios, como explica Saavedra. Inclusive, esse é um dos motivos que justificam o fato de o Brasil não ter produção. “O conjunto das condições de frio, solo e por ser uma cultura que não se tem experiência no Brasil, isso por si só já é desafiador”, reforça.
No entanto, nem a temperatura, muito menos as condições do solo, impediram o Nordeste de provocar a Embrapa com a proposta de desenvolver uma cultivar de pistache tropical (variedade obtida por meio de melhoramento genético). Não apenas atenta à explosão do consumo no Brasil, a ideia partiu da Federação da Agricultura e Pecuária do Estado do Ceará (Faec), que enxergou também uma alternativa para diversificar a matriz produtiva de nozes no estado. O estado quer, sem nenhuma modéstia, se transformar no primeiro produtor de pistache do Brasil.
“Existe muito trabalho de desenvolvimento, pesquisa e implementação até que a gente tenha uma produção de pistache relevante no país, algo em torno de 10 anos à frente. Estamos falando de uma árvore, existe um tempo para estabelecer um regime. Mas como é que a gente vai fazer isso aqui? Pesquisa agrícola nunca é algo rápido. É possível? É. Já fizemos isso em boa parte das culturas. O Brasil conseguiu sair da posição de um grande importador de alimentos porque ele pensou em pesquisa agrícola de longo prazo”, comenta o chefe-geral da Embrapa Agroindústria Tropical, Gustavo Saavedra.
Gustavo Saavedra
chefe-geral da Embrapa Agroindústria TropicalExiste aí uma longa jornada. A proposta feita pela Embrapa à Faec envolve um acordo cooperativo com a Agricultural Research Service do United States Department of Agriculture (ARS-USDA) para trazer o germoplasma do pistache, ou seja, seu material genético. São vários desafios para conseguir essa produção. Estamos falando em pegar uma cultura temperada e produzir numa região tropical. E trazer esse material não é algo tão simples, até porque existe um conjunto de regras do Ministério da Agricultura, respeitando a quarentena para não fazer a introdução de nenhuma outra doença ou praga que possa se espalhar para outras culturas que a gente já tem”.
Depois da importação desse material genético, a próxima etapa é entender como adaptar e fazer a planta crescer. “Uma coisa é crescer, outra coisa é produzir. Possa ser que, nessa temperatura mais elevada, a planta cresça bem, mas por conta da necessidade de clima mais frio, ela não produza. E isso sem falar que, como não existe pistache no Brasil, a gente não tem ideia de quais são as práticas de manejo cultural que têm que ser feitas. Diferente daqui, os Estados Unidos já têm um nível de mecanização e processamento bastante interessante. Também não temos base industrial para o processamento do pistache no nosso país”.
O caminho agora é montar uma missão técnica até a Califórnia, conhecer quem são os atores do mercado, cientistas e agricultores que desenvolvem a cultura. “Hoje temos é uma página em branco. Por isso, é necessário fazer um intercâmbio desse material e começar um processo de tropicalização do pistache, em especial, para algumas regiões de serra do Ceará”, completa Saavedra.
Ao fazer uma pesquisa bem rápida nas lojas especializadas que vendem online, os preços do quilo do pistache in natura variam de R$ 149,80 a R$ 250. O valor não intimida o chef confeiteiro da Frio Gostoso, Bruno Forasteiro, a produzir sua própria pasta 100% pistache, com a semente importada da Jordânia. “É um produto caro, muito caro. Fazer um produto com pistache fica caro se você não colocar outros ingredientes para compor e fazer uma harmonização. Eu optei por fazer e fiz, só que ele tem um valor diferenciado, um processo. Às vezes, é até exaustivo. Tudo isso para trazer o máximo das suas características e explorar os limites do que eu posso colocar dentro de uma receita”, afirma ele, que tem no cardápio três produtos com pistache: a torta vencedora do CORREIO Experimenta, a pasta e o gelato.
Na produção artesanal da pasta, é a partir da semente que o confeiteiro faz a torra. Antes da torra, existe uma separação do grão. Da torra, a semente é processada no moinho em uma temperatura controlada. Depois disso é que vai se transformar nas criações de Bruno. “O pistache traz um requinte, uma sofisticação e versatilidade. Por si só, é o protagonista. O pistache é único, excêntrico, difícil e exigente”.
Bruno Forasteiro
chef confeiteiro da Frio GostosoConfeiteira há 10 anos, Junia Franco também reconhece a onda que a gastronomia como um todo vive em relação de amor com o pistache, que se tornou ‘majestade’ entre os produtos da confeitaria. “A gente realmente começou a colocar pistache em tudo. Eu entendo que isso foi motivado por uma globalização do paladar e por uma procura muito maior por produtos que vieram do exterior, assim como a onda de consumo por influenciadores nas redes sociais. O pistache nada mais é do que uma tendência, assim como a ‘Nutella’ foi há alguns anos. Virou esse fenômeno através da disseminação de receitas pela internet”, comenta.
O pistache está presente em inúmeras preparações da confeitaria e o carro-chefe do momento é o recheio do bolo de casamento. “Já trabalhamos há um bom tempo com ele. Lá atrás, nossos clientes não aceitavam muito, por conta do sabor. Assim que o pistache bombou nas redes sociais, veio a ‘brecha’ para colocar mais produtos com esse ingrediente. Hoje, ele está desde o recheio de pistache para os bolos de casamento até em nossas linhas mais tradicionais de brigadeiros, tortas, ovos de pascoa”.
A criação mais recente é a torta de pistache crocante, que já é uma das mais vendidas para o Natal. “Essa torta foi originada, inclusive, a partir de um outro produto que a gente tem e fez muito sucesso, que é a torta de Nutella crocante. Queria repetir esse sucesso. Na de pistache, criamos um creme a partir do chocolate branco e do pistache. E o crocante é um segredo que guardamos a sete chaves”, garante.
Já o confeiteiro Thiago Sá admite que ficou surpreso com essa ‘invasão’. “Foi muito inesperada, ainda que a presença do produto fosse algo tradicional nas confeitarias da Europa e dos Estados Unidos. A proporção aqui no Brasil foi muito grande, extraordinária. E a confeitaria vai seguindo essas tendências. Com a ajuda das redes sociais, o pistache se tornou viral”.
Querida e marcante, a semente não ficou de fora dos produtos da confeitaria. “Sim, o pistache veio para ficar e vai ficar muito tempo no mercado. É um ingrediente que acaba se somando a outros, sem deixar de ocupar sua posição. Chega para agregar e não para apagar os outros ingredientes que tenham naquela receita ou produto”.
E o pistache faz bem para a saúde? A nutricionista Carolina Dias destaca os benefícios da semente: “Como ele é rico em antioxidante, fibras e gorduras boas, é bom para a saúde cardiovascular, em geral. Ajuda no intestino, a aumentar o nosso colesterol bom e a regular os níveis de glicose no sangue. Além de ser muito saboroso, é uma excelente opção para ser colocada na dieta low carb ou para quem quer se beneficiar de um antioxidante que vai ajudar todo o seu organismo a minimizar o envelhecimento precoce”.
Carolina Dias
nutricionistaFoi justamente a ‘gourmetização’ que aumentou o acesso à oleaginosa, como complementa a nutricionista. “Além da presença em inúmeros produtos atualmente, o pistache veio com tudo para ser consumido na nossa dieta, na culinária e em diversas receitas porque ele é especial mesmo. Esse valor que conquistou só tende a aumentar cada vez mais”.
Ingredientes:
2 bananas congeladas e descascadas
1/2 xícara de pistache descascado
1 lata de creme de leite
1/2 xícara de leite desnatado
1/2 colher de sopa de xilitol
Modo de preparo:
Bata o pistache e a banana no liquidificador junto com o creme de leite (que pode ser sem lactose, caso tenha alguma intolerância), leite desnatado e o xilitol. Coloque a mistura em um recipiente e deixe no congelador por seis horas. Depois é só saborear.