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Sem solução: morte de casal de rifeiros completa 583 dias sem polícia achar os culpados

Rifeiros seguem na mira de bandidos sendo vítimas de ataques

  • Foto do(a) author(a) Bruno Wendel
  • Bruno Wendel

Publicado em 15 de julho de 2024 às 05:00

Morte de casal de rifeiros completa 583 dias sem solução
Morte de casal de rifeiros completa 583 dias sem solução Crédito: Bruno Wendel/CORREIO e Reprodução

Um lugar onde o canto dos pássaros e o vento são soberanos sobre o Rio Jacuípe e um mangue. Mas um acontecimento atípico pôs em questão um dos locais mais procurados pela paisagem bucólica em Camaçari, Região Metropolitana de Salvador (RMS). O cenário virou cena de um crime, seguido de um mistério, que completa nesta segunda-feira, 15, 583 dias sem solução. Em 11 de dezembro de 2022, Rodrigo da Silva Santos, de 33 anos, o DG Rifas, e a mulher, Hynara Santa Rosa da Silva, 39, a Naroka, foram assassinados com vários tiros dentro de um condomínio em Barra de Jacuípe. O casal era dono de uma empresa de rifas – eles eram também influenciadores digitais e juntos somavam mais de 190 mil seguidores.

A execução do casal de rifeiros é investigada pela 33ª Delegacia (Monte Gordo), mas, até agora, há pouco mais de um ano e setes meses, não há indicativo de autoria e motivação. No entanto, o CORREIO esteve no local e conversou com uma testemunha que descreveu os dois homens que tiveram participação direta no crime – inclusive, um deles, segundo a fonte, foi morto dias depois ainda em Barra do Jacuípe. “Todo mundo reconheceu como um dos caras que matou o casal. O corpo estava na praça, cheio de tiros”, diz a fonte, que, segundo ela, o homem baleado tinha um pouco mais de 1,50 de altura e pele clara. No dia 11 de dezembro de 2022, o assassino usava uma calça, camisa de manga e boné, assim como o comparsa, um homem moreno e de estatura inferior a 1,72.

O crime aconteceu na região do Canto do Rio Jacuípe, numa espécie de marina, ao lado do Condomínio Ponta do Jacuípe, onde no local funciona um empresa de aluguel de jet-skis e um restaurante, ambos do mesmo dono. No dia, os bandidos chegaram em uma moto vermelha a pouco depois do meio-dia e se sentaram numa mesa mais afastada do caixa, próxima ao mangue, e, como se fossem clientes, começaram a consumir. “Inclusive, passei por eles, dei ‘boa tarde’ e responderam. Mas o pessoal disse que eles já estavam na região mais cedo. Foram vistos na praia e circulando pela igreja”, conta fonte. No meio da tarde, houve o primeiro encontro de uma das vítimas com os seus algozes. “Rodrigo pelo rio, chegou sozinho no jet-ski, quanto ela (Hynara) ficou na praia. Ele desceu e foi pegar cerveja dentro do carro, no estacionamento. Ele passou na ida e na volta pelos caras, que não fizeram nada”, relembra.

Já no final da tarde, quando algumas mesas eram recolhidas, Rodrigo e Hynara chegam no mesmo jet-ski. “Eles desceram e foram pagar a conta, a do aluguel do equipamento e do que tinham consumido antes. Só deu o tempo de eles encostarem no balcão do caixa, quando os dois homens levantaram e começaram atirar, cada um em um alvo, e depois correram para o fundo, onde a moto estava estacionada e fugiram”, detalha a fonte. As vítimas receberam tiros na cabeça e no peito, morrendo ainda no local sem chances de socorro.

Após o crime, o restaurante e o serviço de aluguel de jet-skis ficaram fechados por quase um mês. “O dono entrou em depressão, porque isso nunca tinha acontecido. Aqui sempre foi muito bem frequentado, famílias passavam o dia inteiro aqui e nunca houve qualquer problema. Para se ter uma ideia, aqui não é permitido ‘paredões’, somente o som da barraca”, conta um funcionário do restaurante.

Casal foi morto quando ia pagar conta em restaurante em Barra de Jacuípe
Casal foi morto quando ia pagar conta em restaurante em Barra de Jacuípe Crédito: Bruno Wendel/CORREIO

Segundo ele, mesmo reabrindo o negócio, o dono teve que enfrentar outro problema: o receio das pessoas de voltar a frequentar o local. “Foram uns dois meses com isso aqui tudo vazio, sem um pé de gente. Mas aos poucos, os clientes foram retornando, perceberam que o que aconteceu foi algo pontual”, relata. Mas a situação foi tão séria, que até quem trabalhava não queria retornar. “Alguns funcionários ficaram apavorados, com medo daquela cena se repetir”, conta.

Naroka

A morte dos rifeiros cerca de mistérios e um deles é o fato de o porquê os assassinos só atiraram quando o casal estava junto. “Tem gente aqui achando aqui o alvo era ela (Hynara), porque Rodrigo passou rente aos caras duas vezes e não foi baleado. Parece que ele só morreu porque estava com ela”, pontua a fonte. “Eles esbanjavam muito nas redes sociais, mas quem começou com esse negócio de rifa foi ela. Quando se conheceram, ela já era rifeira”, complementa a fonte.

De acordo com um policial civil, tudo indica foi “uma ‘quebrança’ entre rifeiros”. “Um acerto de contas. No dia do crime, ele (Rodrigo) inaugurava um jet-ski que tinha comprado à vista naquele dia. Ele tinha derrubado uma casa em Barra de Jacuípe e estava construindo uma mansão do zero. Eles ostentavam muito e isso cresceu o olho de outros que também mexiam com rifas. Mas mulher dele era quem mandava no jogo, era quem articulava tudo”, diz o agente.

Ainda segundo policial, Naroka teria sido mulher de um traficante. Mas o que há de fato é que ela foi condenada por estelionato em dezembro de 2019. Segundo o Tribunal de Justiça da Bahia (TJ-BA), a pena determinada para Naroka foi de oito meses de reclusão, além de pagamento de sete dias-multa. A rifeira foi condenada por usar um documento falso para fazer um saque de R$ 4,5 mil de uma agência bancária na Pituba, em janeiro de 2016. A vítima era cliente do banco e a rifeira conseguiu desbloquear um cartão dela.

Naroka seria o alvo do ataque, que matou também o marido dela
Naroka seria o alvo do ataque, que matou também o marido dela Crédito: Reprodução

Jogo do Bicho

Assim como o jogo do bicho, as rifas são loterias não autorizadas, ou seja, são consideradas “jogos de azar” e equivalem a contravenções penais. Elas sempre existiram, mas não eram tão comuns como hoje, a ponto de concorrerem acirradamente com a máfia das bancas de apostas, ofertando carros de luxo e até quantias em dinheiro, como R$ 20 mil, com investimentos de ínfimos, que variam entre R$ 0,50 e R$ 1 – a hipótese da suposta ligação do jogo do bicho com a morte do casal já foi relatada à reportagem no início das investigações.  

A “profissionalização” da venda de rifas veio com a pandemia, quando muitas pessoas perderam sua fonte de renda. Então, vendê-las virou o “ganha-pão” de muita gente e logo alguns “rifeiros” se destacaram, vendo nas redes sociais a possibilidade de lucrar mais e, assim, ganhando o status também de influenciadores digitais. Eles transmitem os sorteios semanais em seus perfis, ao mesmo tempo que expõem uma vida luxuosa, incluindo viagens internacionais e fotos com artistas.

Casal

Os rifeiros Rodrigo e Hynara acumulavam quase 190 mil seguidores no Instagram. Além do sucesso nas redes, eles eram, desde de 2020, donos de uma empresa de rifas. Ainda que com pouco tempo de funcionamento, o negócio mobilizava milhares de pessoas nas compras de bilhetes das rifas. Nos perfis dos dois, é possível ver diversas publicações de sorteios com prêmios que variavam de R$ 6 mil a R$ 50 mil para quem tivesse comprado o número sorteado. Rodrigo também atuava como empresário de artistas de pagode na Bahia.

Moradores de Lauro de Freitas, na região de Portão, DG Rifas e Naroka ostentavam uma vida de luxo. Pelas redes, faziam registros em festas, carros caros e viagens. Barra do Jacuípe, inclusive, era um destino comum para os dois, que tinham no local um ponto de descanso nos fins de semana.  O casal deixou dois filhos, um de três e outro de onze anos. O mais velho era filho biológico apenas de Naroka.

Casal morto vivia vida de luxo e esbanjava nas redes sociais
Casal morto vivia vida de luxo e esbanjava nas redes sociais Crédito: Reprodução

A reportagem tentou localizar os parentes do casal, mas sem sucesso. O espaço segue aberto para eles. Muitos moradores e veranistas de Barra de Jacuípe continuam perplexos com o crime. Quem matou o casal? Qual o motivo? Naroka era o alvo principal e o marido foi assassinado numa “queima-de-arquivo"? “Como é possível? Se um caso de tamanha repercussão como foi este, ninguém foi preso, imagina os outros, que às vezes não saem na mídia?”, pontuou uma morada.

Em nota, a Polícia Civil respondeu: “Foram realizadas diligências em campo e de inteligência policial para elucidação do crime. Também foram ouvidas sete pessoas e as investigações estão em curso para esclarecer e responsabilizar os envolvidos da morte do casal”.

Lista

Após a morte do casal, a situação ficou ainda mais tensa no meio rifeiros com a existência de uma suposta lista com nomes de pessoas que trabalham na mesma atividade marcadas para morrer. Na ocasião, alguns influenciadores que ficaram conhecidos por vender rifas cancelaram sorteios de valores altos, com foi o caso do JR Premiações. Ele suspendeu o sorteio de meio milhão de reais, através de uma postagem em seu perfil.

Em um vídeo, ele comentou a morte de DG Rifas e Naroka e mencionou também a tal lista. “Na minha caminhada nunca cancelei uma rifa e essa irei cancelar por motivo de estresse. De antemão, obrigado a vocês que estão me mandando mensagens preocupados comigo. Infelizmente estamos vivendo em um mundo cão. O que aconteceu lá com os colegas só Deus sabe .... Passando aqui só para dar uma satisfação a vocês, porque o meu direct está travando. Meu nome está girando numa lista que tem aí. Lista qualquer um pode fazer e mandar circular e foto qualquer pode tirar e escrever o que quer. E sobre a rifa de R$ 500 mil vou cancelar, vou tirar um tempinho pra mim (sic)”, disse ele.

Quem também anunciou a suspensão dos sorteios foi Jhonatha Soares. “Venho aqui avisar, que aquelas rifas baratinhas que a gente faz de centavos, um real, tô acabando com essas rifas, porque a demanda é muita gente, é isso e aquilo, entendeu? (sic)”, disse ele, na ocasião, em seu perfil do Instagram. À época, ambos foram procurados, mas não responderam a reportagem.

Baleados

Desde 2022, os casos de rifeiros vítimas de ataques tem sido destaque nos noticiários. O episódio mais recente aconteceu com  Ramhon Dias, de 33 anos, baleado no último dia 06, na Estrada da Muriçoca, em São Marcos. Ele saía da barbearia quando foi surpreendido por um homem armado. Ele tem 443 mil seguidores no Instagram, onde publica conteúdos sobre rifas, premiações e vida pessoal. No site Ramhon Dias Realiza, o influenciador promete o sorteio de prêmios de R$ 400 mil com cotas de R$ 1,99.

Ramhon Dias, rifeiro e influencer
Ramhon foi baleado no braço, logo após sair de uma barbearia em Vale dos Lagos Crédito: Reprodução/ Redes Sociais

Ramhon foi atingindo no braço. Vídeos registrados por câmeras de segurança que estão circulando nas redes sociais, mostram o momento em que ele é perseguido. Nas imagens, o rifeiro corre do atirador após ser surpreendido. Em outro vídeo, o Land Rover dele aparece com marcas de tiros. Em julho do ano passado, a Justiça da Bahia decretou a prisão temporária de Ramhon por suspeitas de lavagem ou ocultação de bens, jogos de azar e organização criminosa. O mandato foi expedido no dia 2 de julho pela 1ª Vara Criminal Especializada de Salvador. Na época, o influencer também foi apontado como suspeito de criar empresas de fachada e mais outras práticas ilícitas como o uso de ‘testas de ferro’.

Outros rifeiros não tiveram a mesma sorte de Ramhon. Em 22 de junho de 2022, Itamar, do Guiga Rifas, foi assassinado na região do subúrbio. Em seguida, o corpo de Jaiane Costa dos Santos, 22, foi encontrado no bairro de Águas Claras no dia 6 de junho. No dia 15 de julho, a polícia encontrou o corpo da também da “rifeira” Isabela do Espírito Santo, 23, no bairro de Pirajá. Os gêmeos Ruan e Rubens Santos, de 23 anos, foram assassinados no bairro do Lobato, no dia 25 de julho. Joilson Pires Damasceno Falcão, 23, foi morto no bairro de Campinas de Pirajá, no dia 26. No mesmo dia, uma mulher trans, que também vendia rifas, foi brutalmente assassinada com golpes de faca em São Caetano. O nome de registro da vítima é Willian Santos, 32.

Já em 2023, O empresário, influencer e rifeiro Alan dos Santos Oliveira foi morto a tiros, no dia 01 de junho, dentro do centro comercial Iguatemi Business Flat, no Caminho das Árvores. Willy Cleiton Silva Lopes, o “WL Rifas”, foi encontrado morto no bairro CIA Sul, em Simões Filho, no dia 18 de julho. No dia 13 de fevereiro deste ano, George David Alves dos Santos foi executado com vários disparos no bairro da Federação.

Em relação aos crimes contra os demais rifeiros, a Polícia Civil informou que, o inquérito que apura a morte de Itamar “oitivas foram realizadas e outras diligências estão em andamento”. O assassinato de Jaiane “já com indicativo de autoria. Mais informações não podem ser divulgadas no momento”. Sobre a morte dos gêmeos, “Inquérito em fase de conclusão. A motivação tem relação com o tráfico de drogas e os autores já estão identificados”. As investigações que a apuram as execuções de Joilson e Willian estão em curso pela 3ª DH/BTS. No caso da morte de Alan, “o inquérito está em andamento na 1ª DH/Atlântico, com autoria definida”. O suspeito de matar Isabela está preso. Não houve respostas sobre os inquéritos de Willy, George e Ramhon.

Alan dentro do centro comercial Iguatemi Business Flat, no Caminho das Árvores
Alan dentro do centro comercial Iguatemi Business Flat, no Caminho das Árvores Crédito: Reprodução

Rifeiros vítimas

22 de junho de 2022 – Itamar “Guiga Rifas” morto no Subúrbio

06 de julho de 2022 – Jaiane Costa dos Santos, de 22 anos, morta em Águas Claras

15 de julho de 2022 – Isabela do Espírito Santo, de 23 anos, morta em Pirajá

25 de julho de 2022 – os gêmeos Ruan e Rubens Santos, de 23 anos, mortos no Lobato

26 de julho de 2022 – Joilson Pires Damasceno Falcão, de 23 anos, morto em Campinas de Pirajá

26 de julho de 2022 – Willian Santos, de 32 anos, morto em São Caetano

11 de dezembro de 2022 – Rodrigo da Silva Santos, de 33 anos, e Hynara Santa Rosa da Silva, de 39, mortos em Camaçari (RMS)

01 de junho de 2023 - Alan Santos de Oliveira, morto no Caminho das Árvores

18 de julho de 2023 - Willy Cleiton Silva Lopes, de 20 anos, morto em Simões Filho (RMS)

13 de fevereiro de 2024 - George David Alves dos Santos, morto na Federação

06 de julho de 2024 - Ramhon Dias, 33 anos, baleado no Vale dos Lagos