Sem dinheiro e sem pesquisa: professores denunciam cortes orçamentários na Ufba

Redução de mais de R$10 milhões no orçamento tem impactado O cotidiano de professores e estudantes

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  • Maysa Polcri

Publicado em 14 de outubro de 2024 às 06:00

Equipamentos no corredor e pisos danificados no ICS
Equipamentos no corredor e pisos danificados no ICS Crédito: Reprodução

A redução do orçamento da Universidade Federal da Bahia (Ufba) tem impactado o cotidiano de estudantes e professores. Além da restrição do uso de itens básicos, como sabonete e papel toalha, projetos de pesquisa estão paralisados pela falta de insumos. É o caso do Laboratório de Virologia, vinculado ao Instituto de Ciências da Saúde (ICS), onde um equipamento está quebrado há três meses e não há previsão para que seja consertado.

Trata-se do aparelho para obtenção de água ultra pura, que é utilizada para o estudo de células. O insumo é essencial para o trabalho realizado no laboratório, que foi o primeiro a identificar o vírus oropouche em Salvador, em 2020. “Já são meses tendo que buscar água em outros laboratórios. É um transtorno, enquanto temos outras demandas urgentes. Não estamos tendo dinheiro para tocar pesquisas sobre doenças como oropouche e mpox”, conta Gubio Soares, coordenador do Laboratório de Virologia da Ufba.

Em julho deste ano, o decreto nº 12.120, do Governo Federal, determinou a reprogramação da liberação de limites de empenhos de diversos órgãos, inclusive das universidades federais, medida que foi prorrogada até dezembro. Segundo a Ufba, 10% do orçamento para este ano, o equivalente a R$18,6 milhões, estão bloqueados.  A redução das verbas da universidade tem efeitos práticos diversos. 

No quinto andar do Instituto de Ciências da Saúde, no Vale do Canela, por exemplo, equipamentos que pertecem ao laboratório que pegou fogo em 2022 precisaram ser alocados no corredor. Desde o incêndio, o projeto de reconstrução do Laboratório de Bioquímica, Biotecnologia e Bioprodutos (LBBB) ainda não saiu do papel. A professora Luzimar Gonzaga Fernandez diz que experimentos são realizados em um pequeno laboratório improvisado em uma das salas, o que não garante a plenitude das pesquisas. 

"Para o retorno das atividades de forma plena, é necessário a reconstrução do laboratório. [...] Conseguimos um pequeno recurso para a recuperação do laboratório, com isto, o projeto arquitetônico já foi elaborado e os demais projetos para a reconstrução estão em processo", revela. Enquanto o espaço não é reconstruído, um corredor foi adaptado com suprimento de energia para manter os refrigeradores, freezer e câmaras de crescimento.

Equipamentos precisam ficar no corredor enquanto laboratório não é reconstruído
Equipamentos precisam ficar no corredor enquanto laboratório não é reconstruído Crédito: Reprodução

"O incêndio teve um impacto muito negativo, principalmente pela perda de amostras biológicas, materiais e equipamentos de pequeno e grande porte, que ainda não foram adquiridos. Os projetos de pesquisas e dos alunos inicialmente foram interrompidos e, posteriormente, modificados para realização nas condições atuais de falta de infraestrutura adequada, de reagentes específicos e vários equipamentos", lamenta a professora Luzimar Gonzaga. 

Roberto Meyer, diretor do ICS, explica que a situação orçamentária de toda a universidade piorou a partir de julho deste ano, quando o Governo Federal contingenciou R$15 bilhões nas despesas discricionárias de 2024. "O Governo Federal tirou o limite para empenho de todas as universidades e institutos federais do país. Estamos com o orçamento reduzido e, particularmente, a partir de julho, o limite para empenho foi retirado, o que levou a uma necessidade de restrição de vários itens", explica. A Ufba diz, em nota, que tem tentado a liberação de recursos emergenciais junto ao Ministério da Educação. 

"A Ufba lamenta que, mais uma vez, a educação pública superior seja atingida por contingenciamentos e bloqueios de recursos que comprometem planos, contratos, projetos, impactam a manutenção, obras e, consequentemente, o desenvolvimento de pessoas. Tais medidas trazem prejuízos ao ensino, à pesquisa, à extensão, aos programas de assistência estudantil e serviços ofertados pela Universidade à comunidade externa e interna. "

Universidade Federal da Bahia
Em nota enviada ao CORREIO 

No dia a dia da universidade, não é difícil visualizar a crise financeira. Em uma das salas do ICS, pedaços do piso de madeira estão soltos e ameaçam professores, que já caíram enquanto ministravam aulas. "Os tacos da sala onde eu dou aula estão amontoados em um canto porque vão soltando. A situação é muito complicada e difícil de trabalhar. As condições de trabalho têm adoecido os professores", lamenta o professor Marcus Welby.

"Nós, muitas vezes, precisamos tirar dinheiro do próprio bolso para custear itens que a universidade deveria disponibilizar. É comum que os professores tenham que imprimir as provas dos alunos em casa porque não há papel na universidade", exemplifica Marcus Welby.