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Larissa Almeida
Publicado em 1 de maio de 2024 às 06:30
O novo Centro Internacional de Estudo e Pesquisa da Saúde da População Negra e Indígena (CIEPNI), inaugurado na manhã desta terça-feira (30) pela Faculdade de Medicina da Universidade Federal da Bahia (FMB/Ufba), na sua fase inicial, vai integrar exclusivamente pesquisas já existentes que estejam relacionadas às condições de saúde da população negra e tradicional. Uma delas é o projeto voltado para a saúde de pescadores artesanais remanescentes de quilombolas e suas relações com o trabalho e com a alimentação. >
O projeto abarca 13 comunidades quilombolas da Baía de Todos-os-Santos que, a partir da metodologia psicodinâmica do trabalho, já revelou alguns resultados. “O estudo revelou a importância da alegria no ambiente de trabalho. Ele mostrou que a história de resistência e dos saberes ancestrais na hora de organizar o trabalho preservam atividades que reduzem o sofrimento mental e protegem a saúde mental. Um dos primeiros resultados publicados é que as comunidades quilombolas têm estratégia de proteção”, relata Paulo Pena, professor titular da FMB/Ufba. >
Algumas das estratégias de proteção desses povos contra o adoecimento no ambiente de trabalho árduo incluem o resgate de apresentação e inclusão de atividades de danças e contação de histórias do passado e da cultura. O uso tático dessas ações é encarado como saberes que devem ser explorados a fundo e reconhecidos pelo centro de estudos. >
Também nessa pesquisa foram encontradas evidências de exposições a condições de risco dessa população durante a execução das atividades laborais. “Muitas vezes, há riscos graves de adoecimento. Encontramos relatos de acidente com escalpelamento de mulheres nas correias do controle da mandioca desprotegido, acidentes com animais peçonhentos e dificuldades de assistência em relação à saúde mental. Esses resultados mostram uma ausência de políticas públicas na área da saúde e precariedade no trabalho das comunidades quilombolas”, acrescenta Paulo Pena. >
As pesquisas, ainda tão somente qualitativas e desenvolvidas no campo das Ciências Sociais, podem ganhar elementos quantitativos a partir da contribuição da diversidade de linhas de pesquisas do CIEPNI. O objetivo final é que, a partir da integração, haja visibilidade sobre os conhecimentos produzidos junto a essas comunidades. >
“O processo de construção desse material educativo-institucional com essas comunidades tem o sentido de dar visibilidade e também possibilitar que o que for produzido por essas pessoas possa servir para garantir direitos, como proteção ambiental, e para que consigam ser vendidos e consumidos no território baiano”, frisa Liliane Bittencourt, professora da Ufba. >
Outra linha de pesquisa que está em fase inicial, mas que deve ser estudada no novo centro, são as doenças mais frequentes na população negra. De acordo com a Marilda Gonçalves, pesquisadora Instituto Gonçalo Moniz (IGM) da Fiocruz Bahia e professora do curso de Farmácia da Ufba, os estudos sobre anemia falciforme, tema de seu interesse há pelo menos 20 anos, devem ser enriquecidos com a integração promovida pelo CIEPNI. >
“O objetivo primordial será associar as pesquisas com a mudança de comportamento da população, ou seja, transformar em ações afirmativas. É importante que tenhamos os órgãos institucionais para introduzir os resultados da pesquisa e transformar em política pública. Um exemplo é a abertura de maternidades especiais para o acolhimento de mulheres que têm a anemia falciforme e podem ter complicações no parto. Outro exemplo é mobilizar, no pré-natal, que as mulheres que tenham traço [gene da anemia falciforme que não ativado] sejam acompanhadas de maneira especial, para que não se tenha perda de mães e crianças”, finaliza Marilda Gonçalves.>
*Com orientação da subeditora Amanda Palma>