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Bruno Wendel
Publicado em 13 de janeiro de 2025 às 06:00
Além dos casos de tortura na Penitenciária Lemos Brito, o relatório de inspeção do Mecanismo Nacional de Combate à Tortura (MNPCT), órgão ligado ao Ministério dos Direitos Humanos, divulgado em outubro do ano passado, apontou outras irregularidades na unidade, que funciona no Complexo Penitenciário da Mata Escura.
O documento diz que o Ministério Público da Bahia requereu a interdição da cozinha da PLB, “pelo risco sanitário gerado pela precariedade estrutural e sanitária”. Os alimentos são preparados na Unidade de Alimentação e Nutrição (UAN).
“As condições estruturais e sanitárias da cozinha são péssimas e insalubres, com infiltrações, partes alagadas e mofo em diversos ambientes; exaustão e renovação de ar insuficiente; temperaturas elevadas e utensílios expostos a possíveis contaminações. Foi relatado que o forno estava quebrado e que o local possui áreas abertas, que propiciam a entrada de grande quantidade de insetos e animais, principalmente baratas e ratos. Foi informado que a Vigilância Sanitária já notificou a PLB sobre irregularidades no armazenamento, preparo e condições de higiene da cozinha e que não existe alvará para funcionamento”, diz trecho.
A alimentação da unidade é terceirizada e fornecida pela empresa Aroma e Sabor, antiga “Lemos Passos” (LPATSA Alimentação e Terceirização de Serviços Administrativos). Durante as entrevistas, as pessoas privadas de liberdade informaram que consideram a alimentação péssima.
“Foram descritos alimentos de má qualidade, carnes malcozidas, monotonia dos ingredientes e principalmente a insuficiência da quantidade e as muitas horas de fome e jejuns forçados. Em unanimidade, informaram que, geralmente, os alimentos são servidos da seguinte forma: 8h - café da manhã: geralmente um copo de café com broa de milho; 12h - almoço: arroz, feijão e carne de porco; entre as 14h30m e 15h - jantar/lanche: a mesma alimentação fornecida no almoço. Após as 16h, nenhuma refeição é fornecida”, diz trecho.
“Nas refeições, algumas vezes, são distribuídas carne crua, fígado e carne de porco ‘verdes’ (estragados) e que nessa unidade não há distribuição suficiente de talheres no momento da entrega dos alimentos”, aponta outra parte do documento.
A inspeção constatou ratos, baratas nas celas de isolamento da unidade que os presos dormem diretamente no concreto (“na pedra”). As instalações sanitárias das celas de castigo/isolamento encontravam-se em um estado absolutamente deplorável. Ainda, pessoas chegam a passar seis meses sem banho de sol quando estão nas celas do seguro (celas destinadas à acomodação de pessoas que têm problemas de convívio na unidade). A SEAP foi procurada, mas não respondeu até agora.
Posicionamentos
Procurado, o Ministério Público do Estado da Bahia informou que “não há fatos relacionados à Penitenciária Lemos Brito no relatório de 2023 enviado à instituição pelo Mecanismo Nacional de Combate à Tortura. Além disto, até o momento, o MPBA não recebeu o relatório de 2024”.
“Importante ressaltar que, por meio da 4ª Promotoria de Justiça de Execuções Criminais da Capital, o MPBA inspeciona regularmente as unidades prisionais de Salvador e apura, com afinco, todas as denúncias de violações de direitos que lhe são encaminhadas, atuando sempre pela preservação dos direitos humanos e respeito às leis que regem o sistema prisional brasileiro”, diz nota.
Em relação ao refeitório da PLB, o Ministério Público disse que ajuizou uma ação em 2022 e “está no aguardo da decisão da Justiça”. A reportagem pediu um posicionamento à Secretaria de Administração Penitenciária e Ressocialização (Seap) e à Secretaria de Segurança Pública (SSP). Esta não retornou.
Já a Seap informou, em nota, que diversos itens apontados no relatório, incluindo a superlotação, não condizem com a realidade atual das estruturas e serviços da administração penal presentes na Penitenciária Lemos Brito (PLB). A pasta disse ainda que as sanções disciplinares obedecem a parâmetros da legalidade contidos no Estatuto Penitenciário do Estado da Bahia. A Seap ressaltou ainda que realiza investimentos em iniciativas voltadas ao respeito da dignidade da pessoa humana e à integridade dos internos.
Confira a nota da Seap na íntegra:
A Secretaria de Administração Penitenciária e Ressocialização (Seap) esclarece que diversos itens apontados no relatório não condizem com a realidade atual das estruturas e serviços da administração penal presentes na Penitenciária Lemos Brito (PLB). As melhorias operacionais e estruturais da unidade são atestadas regularmente pelo Ministério Público do Estado da Bahia (MP-BA) e pela 1ª e 2ª Varas de Execuções Penais, além de um anexo da Defensoria Pública presente na unidade. Além dos órgãos fiscalizadores, a PLB promove constantemente operações de revista, conforme os relatórios operacionais.
Também não são condizentes os números atuais de ocupação da PLB com a superlotação apontada no relatório, considerando que unidade conta com um excesso de 22% a mais da sua capacidade, não caracterizando superlotação em sua distribuição geral de internos.
As aludidas inconsistências não existem mais desde novembro de 2023, estando a PLB com suas instalações em plenas condições estruturais, tendo sua rede hidráulica, elétrica sido renovadas, deixando as celas em plena higidez. Importa ressaltar que o Mecanismo Nacional de Combate à Tortura (MNPCT) esteve na PLB no mês de abril de 2023, quando as obras do Módulo II estavam em andamento e as intervenções do Módulo V e Módulo III também não estavam concluídas.
A Seap ainda informa que a PLB conta com uma equipe qualificada de nutricionistas, que fiscalizam a elaboração, confecção do cardápio e distribuição das refeições fornecidas aos internos. Os custodiados recebem quatro refeições por dia, sendo desjejum, almoço, jantar e ceia, nos horários regulares, inexistindo intervalos de 16 horas entre refeições.
A Seap também esclarece que todas as revistas da PLB são realizadas com o uso de equipamentos eletrônicos de detecção. O tratamento dado aos visitantes ocorre dentro da urbanidade e respeito, sob a supervisão e acompanhamento da direção. Os visitantes ainda contam com um anexo da Defensoria Pública.
As sanções disciplinares obedecem aos parâmetros da legalidade, com base no Estatuto Penitenciário do Estado da Bahia, o qual prevê 10 dias para isolamento cautelar na fase inicial da apuração de faltas disciplinares e máximo de 30 dias para cumprimento de falta grave comprovada, como pode atestar os procedimentos disciplinares do nosso Conselho Disciplinar.
Por fim, a Seap ressalta que investe diariamente em iniciativas voltadas ao respeito da dignidade da pessoa humana e a integridade dos internos, a partir de ações de ressocialização, por meio de cursos profissionalizantes, incentivo à leitura, atividades culturais, educação escolar, além de oportunidades de trabalho, para a expansão da possibilidade de melhores perspectivas de reinserção social.