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Gil Santos
Publicado em 21 de abril de 2024 às 18:51
A Prefeitura determinou a desapropriação do terreno que fica ao lado do terreiro Casa Branca, no Engenho Velho da Federação, em Salvador. O terreno tem sido alvo de disputa judicial depois que um prédio foi construído no local de maneira irregular, ameaçando a segurança do templo religioso. O decreto foi publicado no Diário Oficial do Município (DOM), na sexta-feira (19), e determina que, após a desapropriação, o espaço de 260,88m² tenha finalidade cultural.
“A área de terreno objeto deste Decreto destina-se a execução de obras para implantação de projeto cultural com objetivo de agregar o espaço do Terreiro Casa Branca, tombado pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), conforme projeto aprovado para o local”, diz o texto.
Segundo a determinação, se a desapropriação for feita de maneira amigável, o processo deverá ser conduzido pela Secretaria Municipal da Fazenda (Sefaz). Caso o proprietário recorra a judicialização, caberá a Procuradoria Geral do Município assumir o comando e solicitar, se for necessário, regime de urgência para obtenção da emissão de posse do bem declarado de utilidade pública.
Integrantes do Terreiro Casa Branca disseram que a desapropriação é importante para que seja feita a demolição do prédio, contaram que não tiveram contato com o proprietário e que uma nova audiência será realizada, em maio, entre os representantes do templo e os donos do imóvel no Ministério Público da Bahia (MP-BA).
O prédio tem cinco pavimentos e foi construído sem alvará e sem vistoria da Prefeitura, mesmo depois da obra ter sido interditada. O MP-BA, que está acompanhando o caso, realizou audiências entre as partes e já afirmou que a construção não tem protejo arquitetônico e nem estrutural, e que a obra avançou para dentro do terreno do terreiro Casa Branca.
Além de ameaçar o templo tombado pelo Iphan, a construção descumpre a legislação municipal que impõe a restrição de imóveis com até dois pavimentos na região. A obra tem cinco andares e ainda não foi concluída.
Em setembro de 2023, a Justiça Federal da 1ª Região expediu uma liminar, a pedido do MP-BA, determinando a demolição do prédio e deu 30 dias para o proprietário apresentar o projeto para a execução da obra, mas como o local estava habitado havia ainda a necessidade de um trâmite burocrático na Prefeitura.
O secretário municipal de Cultura e Turismo (Secult), Pedro Tourinho, que assina o decreto junto com o prefeito e outros secretários, explica que a desapropriação é o primeiro passo. Depois que as famílias deixarem o local, o prédio será demolido e um centro cultural será erguido no terreno, com anuência da Casa Branca.
“Aquele é um espaço que precisa ser preservado pelo valor social e cultural que ele tem para a cidade, por isso, vamos agregar ao terreiro e resolver o problema da construção irregular. Essa ação é uma resposta aos anseios da comunidade de axé da cidade e do Brasil e que está sendo resolvida de forma amigável, envolvendo diversas secretarias, para potencializar o axé da Casa Branca”, conta.
Relembre o caso
O prédio irregular está sendo construído há cerca de cinco anos. Desde 2021, os membros do terreiro de candomblé denunciam a construção irregular e invasões no território. Em setembro de 2022, a Secretaria Municipal de Desenvolvimento e Urbanismo (Sedur) embargou a obra por falta de alvará de construção, mas a ordem foi descumprida.
Em março de 2023, a Sedur identificou materiais de construção no terreno da obra e a interditou. O caso veio à tona depois que integrantes do Casa Branca denunciaram a situação nas redes sociais, com medo de que a construção de cinco andares desabasse em cima do terreiro de candomblé.
“Já está com cinco andares, desafiando autoridades. A construção segue sem qualquer acompanhamento técnico, e isso só aumenta os riscos. Ao desabar, e os riscos de isso acontecer são óbvios, destruirá a Casa Sagrada do Orixá Omolu e matará filhas e filhos de santo da Casa Branca", diz o texto publicado no Instagram, na época.
O Terreiro Casa Branca (Ilê Axé Iyá Nassô Oká) foi fundado quando o Brasil ainda era um império, em 1830, e foi o primeiro terreiro tombado pelo Iphan. Ele é reconhecido como Patrimônio Cultural Brasileiro, além de ser inscrito nos livros do Tombo Histórico e Arqueológico, Etnográfico e Paisagístico, em 1984.
Segundo o Iphan, o Casa Branca é um exemplar típico do modelo básico jeje-nagô, sendo o centro de culto religioso negro mais antigo de que se tem notícia da Bahia e do Brasil, considerado como a matriz da nação Nagô.
O CORREIO não conseguiu contato com o proprietário do terreno que será desapropriado.