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Millena Marques
Publicado em 13 de dezembro de 2023 às 08:00
Já se perguntou por que você encontra um número significativo de ambulantes nas praias de Jaguaribe, Piatã e Itapuã, diferente de outras áreas da orla de Salvador? Apesar de não detalhar a quantidade de permissionários que trabalha nessa região, o presidente da Associação dos Trabalhadores da Orla Pé na Areia (Astop), Elismar Mota, pontua alguns fatores que explica tal concentração.
A explicação disso não é tão óbvia, visto que engloba um conjunto de diversos fatores, como a distância entre as praias e as residências dos permissionários, potencialidade de venda de cada área e a presença de público fora do período de alta estação.
A primeira delas é a logística, que influencia diretamente a presença do ambulante ou do barraqueiro. "O fator logística é responsável por gerar melhores números de permissionários nessas praias citadas, além da potencialidade de vendas", diz Elismar.
Logística é o que fez o ambulante Paulo Martins de Souza, 52, escolher as praias de Piatã e Itapuã como áreas de trabalho para a venda de amendoim torrado. Em seis dias da semana, ele sai do Parque São Cristóvão, próximo ao Aeroporto Internacional de Salvador, em direção às praias da orla soteropolitana. "Vendo basicamente nas praias de Itapuã e Piatã. Entendo que são ótimas praias para trabalhar porque facilitam meu itinerário", pontua.
Outro ponto determinante para uma maior concentração no trecho entre as praias de Jaguaribe e Itapuã é a fuga da sazonalidade. De acordo com Elismar Mota, a capital baiana ainda possui problemas em movimentar o setor de turismo, incluindo as cadeias do segmento que sobrevivem pelo movimento nas praias, por causa do próprio teor sazonal.
"Salvador ainda é uma cidade sazonal e sofre com isso. Então, um trecho de praia que tem frequentadores assíduos e que pode ter um elemento geracional de receita ao longo do ano, nos meses de maior fragilidade do turismo, faz com que o permissionário tenha maior interesse em trabalhar em determinado local", afirma Mota, que conversou com a reportagem durante uma audiência pública que debateu a regulamentação para o comércio de praia em Salvador, realizada na última terça-feira (12).
Isso é perceptível no número de turistas recebidos no verão e em outras estações. Nos dois últimos verões, Salvador recebeu mais de 5 milhões de turistas: 2,8 milhões na temporada 2021/2022 e 3 milhões na temporada 2022/2023 de pessoas, de acordo com dados da Secretaria Municipal de Cultura e Turismo (Secult). A partir de abril, quando já estamos no outono, o fluxo turístico cai em 4,8%, conforme o Observatório do Turismo, vinculado à Secult.
A Secretaria Municipal de Cultura e Turismo estima a passagem de 3,5 milhões de turistas na capital no verão 2023/2024, maior número dos últimos cinco anos. Segundo o órgão, as duas últimas temporadas registraram 2,8 milhões (2021/2022) e 3 milhões (2022/2023) de pessoas.
Dos 3,5 milhões estimados para a próxima alta estação, 300 mil devem desembarcar em Salvador por meio de navios: 71 cruzeiros deverão aportar na capital baiana, vindo de diversos lugares do Brasil, como das cidades de Belém (PA), Maceió (AL), Recife (PE), Búzios (RJ), Santos (SP), Cabo Frio (RJ) e Porto Seguro (BA).
De acordo com o diretor de Turismo da Secult, Gegê Magalhães, a cidade está preparada para receber os turistas. “Fizemos várias reuniões com diversos agentes da Prefeitura, trade turístico, terminal marítimo de Salvador e representantes das forças de segurança pública. O tema foi a preparação para a maior temporada de navios de todos os tempos. Salvador está prevista para receber milhares de visitantes, que vão chegar pelo porto de nossa cidade. Com tantos agentes públicos e privados comprometidos, tenho certeza que teremos êxito nessa missão com louvor”, disse.
Para exercer atividades econômicas na faixa de areia das praias de Salvador é necessário seguir algumas regras previstas no decreto 24.422/2013, estabelecido há 10 anos. Considerado ultrapassado pela categoria, o documento foi alvo de debate em uma audiência pública nesta terça-feira (12), realizada no Centro da Cultura da Câmara.
A audiência debateu temas relacionados a condições de infraestrutura do trabalhadores de praia, padronização de serviços, comercialização de alimentos, segurança, questão sanitária, entre outros temas. Elismar Mota destacou a importância do diálogo entre associações e instituições públicas, sejam elas municipais, estaduais e federais, para a busca de soluções que aprimorem o ofício.
"O decreto sobre a atividade de trabalhadores da faixa de areia não contempla a categoria, os turistas e os próprios moradores da cidade. Com base nisso, estamos tentando mudar essa realidade", afirma.
Barraqueiro em Patamares há 19 anos, Mota teve seu empreendimento demolido por completo em 2013 após o juiz Carlos D'Ávila ordenar a demolição das 353 barracas que restavam na orla de Salvador e nas ilhas que pertencem à cidade: Ilha de Maré, Ilha de Bom Jesus dos Passos e Ilha dos Frades, três anos antes. O prejuízo financeiro foi de R$ 240 mil, o que não é nada comparado ao prejuízo emocional.
"Eu tive meu primeiro filho nesta época. A minha única fonte de renda era a barraca. Eu estava nesta situação e tive que ver um trator passando em cima dos meus sonhos. O valor do prejuízo é infindável quando pensamos na destruição psicológica", relata o presidente da Astop, que ainda trabalha em Patamares como barraqueiro, mas utilizando apenas sombreiros e mesas, sem a estrutura fixa.
O vereador Claudio Tinoco (União Brasil), responsável por solicitar a audiência pública desta terça-feira (12), afirma que um Projeto de Lei deverá ser apresentado à Câmara no início de 2024, com o objetivo de revisar as condições impostas pelo decreto de 13 anos atrás. "A ideia é atualizar essas regras, criando uma legislação específica para Salvador, para que a cidade ganhe autonomia no sentido da gestão de suas praias", afirma.
*Com orientação da chefe de reportagem Perla Ribeiro