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Bruno Wendel
Publicado em 4 de setembro de 2023 às 05:00
A Polícia Civil da Bahia apura a denúncia de extorsão do ex-pastor Silvio Roberto dos Santos Galiza contra a Igreja Universal do Reino de Deus (Iurd). O inquérito foi instaurado com base em um vídeo apresentado pela direção da Iurd, no qual Galiza teria exigido dinheiro e emprego para mudar a versão e inocentar os pastores Fernando Aparecido e Joel Miranda, condenados em abril deste ano, durante júri popular, pela morte Lucas Terras, 14 anos. Atualmente, eles respondem em liberdade porque ainda cabe recurso. >
Galiza, que já cumpriu 11 anos pelo envolvimento na morte do adolescente e hoje está em liberdade, foi quem apontou Fernando e Joel como autores do crime . A denúncia contra o ex-pastor é apurada pelo coordenador de Operações da PC/BA, delegado Artur Guimarães. “ A polícia investiga a notícia de um crime de extorsão. Foi juntado alguns documentos e arquivos de mídia (vídeo), mas são esses arquivos de mídia que estão sendo analisados”, explicou Guimarães.>
Questionado se Galiza havia sido interrogado, o delegado respondeu que ainda não havia data definida para a oitiva do ex-pastor. Já sobre a realização de periciais e depoimentos, Guimarães argumentou que o inquérito é sigiloso. “ O conteúdo da investigação tem que ser restrito nesse momento. Na conclusão, podemos até dar um acesso maior, mas é complexo revelar agora quais diligências estão sendo cumpridas, pois estaria antecipando para os envolvidos quais os próximos passos e assim dificultaria a coleta de provas”, explicou o delegado. >
Vídeo >
Apesar de Artur Guimarães não entrar em detalhes sobre a investigação contra Galiza, o advogado dos pastores Nestor Távora disse que, um mês após o julgamento, Galiza, que já foi condenado duas vezes pelo crime, procurou a Iurd e “se propôs formular um novo depoimento, para contar a verdade”. “Para tanto, exigiu não só um pedido de valor, mas também um emprego e, naturalmente, a instituição não cedeu. Isso só mostrou que duas pessoas inocentes estão sendo acusadas por um crime que não cometeram”, disse o advogado, fazendo referência a Fernando e Joel, que foram sentenciados a 21 anos de reclusão. “Eles não estão presos porque a prisão no Brasil acontece com o cumprimento da pena, só que a pena é cumprida depois que não cabe mais recurso da decisão. Eles foram julgados em primeira instância e estão recorrendo ao tribunal”, explicou o advogado. >
Távora disse que a gravação foi realizada dentro da sede da Iurd, na Catedral da Fé, região do Iguatemi, depois de Galiza manter contato em um outro momento, informando que “poderia ajudar na causa, já que os pastores tinham sido condenados”. “Quando Galiza procurou a instituição, dizendo que gostaria de ajudar na causa diante da condenação, claro que todos ficamos receosos, até porque foi este homem que acusou os pastores. Então, sob a nossa orientação, a instituição se acautelou, para ter o cuidado de formular essa documentação (gravação)”, contou o advogado. Segundo ele, em seguida, a Iurd formalizou a denúncia contra o ex-pastor, sobre os indícios de extorsão. >
Ainda sobre vídeo, Távora disse que Galiza não chegou a dizer quanto queria receber em dinheiro, “não falou em valor especificamente”, mas acredita que a gravação poderá anular a sentença contra os pastores. “Esse vídeo é mais um elemento de todas as provas que já existem no processo, que serão apreciadas pelo Tribunal de Justiça do Estado da Bahia, para que esse julgamento dos pastores Fernando e Joel seja revisto”, disse Távora. >
O recurso da defesa contra o resultado do júri popular foi encaminhado ao TJ/BA no dia 25 de agosto. Agora, a defesa aguarda o tribunal intimidar para a manifestação o Ministério Público estadual (MP/BA). >
Posicionamentos>
Na visão da acusação, o vídeo não mudará o resultado do julgamento. “A decisão já foi tomada. A sentença foi baseada em provas, todas que foram inseridas nos autos durante esses mais de 20 anos. É um processo que precisava de resposta”, disse a advogada da família de Lucas Terra, Tauny Sande. O irmão de Lucas Terra também comentou o caso. “A gente quer que eles sejam presos. Eles foram condenados e tiveram todos os recursos”, declarou Júnior Terra. Já Marion, mãe de Lucas, preferiu não falar sobre o assunto. >
O MP/BA foi procurado pela reportagem e enviou a seguinte nota: “A suposta extorsão deverá ser investigada pela Polícia Civil, que, como é de prazo, encaminhará o inquérito policial para o Ministério Público analisar as informações para tomar as medidas cabíveis”. >
O CORREIO falou com o ex-pastor Silvio Roberto dos Santos Galiza, através do perfil dele em uma rede social. Questionado se gostaria de apresentar a sua versão, ele respondeu: “Já estou fechando com uma emissora e irei expor toda verdade sobre tudo”. Ele nada mais disse. >
Relembre o caso >
Os pastores Fernando Aparecido da Silva e Joel Miranda foram condenados a 21 anos de prisão pelo assassinato do adolescente Lucas Terra. A sentença foi proferida pela juíza Andréia Sarmento, após três dias de julgamento no Fórum Ruy Barbosa. De acordo com a acusação, eles assassinaram Lucas porque o jovem flagrou os dois em pleno ato sexual. A versão é negada pela defesa, que diz que foi provado nos autos que os pastores na época do fato estavam com outras pessoas, desempenhado suas funções, em locais públicos. >
Em 21 de março de 2001, Lucas Vargas Terra, de 14 anos. Segundo o MP/BA, ele foi estuprado e queimado vivo. Os pastores foram julgados por homicídio triplamente qualificado por motivo torpe, impossibilidade de defesa da vítima e meio cruel com o uso de fogo. O crime de ocultação de cadáver prescreveu, ou seja, encerrou o prazo legal para punir pelo crime.>
Em 2012, o ex-pastor Silvio Roberto dos Santos Galiza, também acusado, chegou a ser preso e condenado a 18 anos. Entretanto, teve progressão de regime, cumpriu a pena e hoje está em liberdade condicional. Foi através do depoimento de Galiza que Fernando e Joel foram denunciados pelo Ministério Público.>