PM é denunciado por intolerância religiosa e furto contra monumento do candomblé na Bahia

Outro homem, que não teve a identidade divulgada, também foi acusado

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Publicado em 11 de junho de 2024 às 14:45

Centro Cultural do Candomblé Castelo Alto do Xangô
Centro Cultural do Candomblé Castelo Alto do Xangô Crédito: Reprodução / Redes sociais

O Ministério Público Federal (MPF) denunciou dois homens, um deles um policial militar, por ataques ao Centro Cultural do Candomblé Castelo Alto do Xangô e à Sociedade Floresta Sagrada Alto do Xangô, entidades religiosas no município de Brumado, sudoeste da Bahia.

Os dois são acusados de invadir e vandalizar áreas consideras sagradas por praticantes de religiões de matrizes africanas, emitir ofensas de cunho racista e ameaçar integrantes do grupo, além de roubar objetos, depois revendidos a terceiros. Se a denúncia for aceita pela Justiça, eles vão responder pelos crimes de furto qualificado, racismo por motivo de intolerância religiosa, crime ambiental e dano qualificado.

Na denúncia, o MPF detalha que, em fevereiro de 2022, os dois homens invadiram o Centro Cultural Castelo Alto do Xangô com tratores e caçambas, destruíram áreas de mata essenciais para a prática de cultos religiosos, vandalizaram objetos, emitiram ofensas de cunho racista e ameaçaram colocar veneno na caixa d’água que abastece o templo religioso.

Também usaram o trator para derrubar a torre de internet do local (depois revendida a terceiros como sucata, como ficou comprovado em depoimentos) e destelhar a casa da Floresta Sagrada Alto de Xangô, com o objetivo de impedir a prática de culto religioso.

A reportagem solicitou posicionamento da Polícia Militar sobre o caso e aguarda retorno. 

De acordo com o MPF, embora estivesse à paisana, o policial militar envolvido no episódio é bem conhecido da população local. Ele estava armado e atuava como se fosse o segurança particular do outro acusado. Assim, segundo a denúncia, ele se valeu da sua posição para conseguir objetivos ilícitos, “abusou das prerrogativas, das facilidades e do respeito do cargo para blindar o outro agressor de qualquer reação das vítimas e atemorizá-las”.

No documento, o MPF narra que a Fazenda Santa Inês - onde aconteceu o crime - foi comprada pela União em 1927 e, ao longo de décadas, vem sendo alvo de invasões. 

A partir de 2014, a entidade religiosa passou a ser alvo de ataques praticados por particulares que disputavam regiões no entorno e que começaram a invadir áreas de culto alegando serem os verdadeiros donos do lugar. Alguns deles chegaram a instalar um loteamento clandestino na região, falsificando escrituras públicas para reivindicar lotes situados dentro do imóvel federal.

O cenário motivou uma série de atuações do MPF, incluindo ação civil pública para garantir a proteção da posse das entidades religiosas e denúncia oferecida em ação penal contra o grupo que fraudou os registros imobiliários da União e instalou o loteamento clandestino. Há ainda inquérito policial que apura crimes cometidos contra o Alto do Xangô.

O MPF ressaltou que a destruição das áreas de floresta consideradas sagradas pelo grupo configura não apenas crime ambiental contra patrimônio da União, mas também um ato de intolerância à religião de matriz africana. Laudos periciais produzidos pela equipe do MPF comprovam o desmatamento e reforçam a importância das áreas de mata para a prática de cultos religiosos.

“No caso concreto, a supressão de vegetação foi praticada com o objetivo de atentar contra a dignidade e o sentimento religiosos dos membros do terreiro de candomblé”, diz a nota.

Os dois são acusados de praticaram crime ambiental previsto no art. 50-A da Lei nº 9.605/98. A subtração de bens do Centro Cultural Alto de Xangô configura crime de furto qualificado (art. 155, §4º, I e IV, do Código Penal) e a destruição de instalações da entidade, crime de dano qualificado (art. 163, parágrafo único, IV, do CP).

As ameaças e ofensas emitidas contra o grupo de candomblé, a destruição de objetos e árvores sagrados do culto, a invasão de locais de liturgia e a destruição de construções para impedir o exercício do culto religioso caracterizam o crime de racismo por motivo de preconceito/intolerância religioso/a, como previsto no art. 20 da Lei nº 7.716/89.

Além da condenação pelos crimes apontados, o MPF pede ainda que os dois denunciados sejam condenados a pagar R$ 20 mil para a Sociedade Floresta Sagrada Alto do Xangô título de reparação pelos danos morais e materiais. Requer ainda que o policial militar seja condenado à pena de perda do cargo público em virtude do envolvimento no episódio.